Capítulo 1

527 26 5
                                    

Mesmo quando o som ensurdecedor dos ventos do chapéu parou, a garota continuou a ouvi-los ecoando em seus ouvidos, desnorteando seus sentidos. Seus pés vacilaram contra o chão irregular, seu rosto exausto descansando contra a terra úmida, que entrava por debaixo de suas unhas enquanto ela usava as mãos para tentar se levantar mesmo que ainda se sentisse um pouco tonta. Jefferson, em contrapartida, estava em seu melhor estado, até já recolhendo seu chapéu do chão, passando a mão pelo tecido escuro para tirar a terra e folhas mortas que grudaram nele.

- É daqui que você é? – perguntou a garota depois de um tempo olhando seus arredores, quando finalmente conseguiu se colocar sentada, mesmo que com dificuldades. A dupla estava em uma floresta como antes ela nunca vira. Sequer precisava ficar em silêncio para conseguir ouvir os animais que moravam ali, ou a pequena vila próxima. O sol em seu auge mal conseguia atravessar as numerosas folhas das árvores que dominavam todo o ambiente, e talvez por isso não estivesse tão quente ali embaixo, com a garota até chegando a se encolher por ainda estar em contato com a terra fria. Seu vestido azul claro se sujara bastante na queda, até com alguns galhos presos no tecido danificado, mas que talvez tivesse conserto. Na verdade, ela sequer se importava. Estava ocupada demais tentando entender o mundo em que agora estava – Aqui é estranho...

- De alguém vindo do País das Maravilhas, vou aceitar isso como um elogio – resmungou Jefferson, lhe estendendo a mão para ajudá-la a se levantar, mesmo que não fosse sua vontade. Uma vez de pé, a garota agradeceu com um sorriso, sem conseguir dar atenção ao homem a sua frente. Ela sabia que era um pouco falta de educação, mas ela não conseguia se conter. Era um mundo diferente do seu, dizer que estava curiosa não chegava nem perto do que sentia.

Seu acompanhante, ao contrário, não parecia compartilhar de sua animação: o maxilar travado, o pé batendo em um ritmo constante impaciente no chão, o descontentamento claro em seus olhos. A garota apenas se deu conta de tudo isso quando notou ele já alguns metros mais afastado.

- Ei, para onde você está indo? – questionou ela com urgência na voz, com passos apressados conseguindo diminuir a distância entre eles. A garota até chegou a erguer a mão para tocar seu ombro protegido pelo casaco comprido, mas desistiu logo em seguida. Além de suas mãos estarem sujas de terra e as vestes de Jefferson muito mais limpas do que as suas, agora que notara sua clara irritação, não conseguia ignorá-la, e temia que tocá-lo poderia apenas irritá-lo ainda mais.

- Casa.

- Fica muito longe? – continuou ela a perguntar, acompanhando o ritmo rápido de seus passos quando entendeu que ele não planejava parar para conversar. A garota juntou os braços atrás das costas, nervosamente apertando seus dedos em uma tentativa falha de aliviar sua apreensão – Porque eu estou muito cansad...

- Você não vem comigo – cortou-a Jefferson, virando minimamente o rosto para ela apenas para ver a garota parando de segui-lo, surpresa com o que ouvira. Sua expressão inocente fez com que ele se lembrasse da filha, mas a cada linha de expressão que a inconformidade tomava em seu rosto, menos a garota o lembrava sua querida Grace.

- Por que não? E onde eu devo ficar? – resmungou a garota, cruzando os braços em frente ao corpo, sua postura nada menos do que de uma criança pirracenta.

- Não sei. Não me importo – foi a resposta que ela obteve do homem, que não teve a decência de terminar aquela conversa antes de continuar a se afastar, apenas erguendo uma mão para um aceno sem vontade. A garota, por sua vez, permaneceu no mesmo lugar, apenas o assistindo aumentar a distância entre eles, sua raiva crescendo no mesmo ritmo de seus passos despreocupados.

- Você que me trouxe para cá, Jefferson!

- Sim, e agora você vai caçar o seu rumo.

- Não acredito em você...! – gritou a garota tomada pela ira, rapidamente encontrando próxima a ela uma pedra grande o suficiente para atrair sua atenção, mas não o suficiente para causar algum ferimento sério. A pedra sequer danificara o ombro de seu casaco quando o atingiu, mas fez com que ele se virasse, contrariado – Eu te fiz um favor e é assim que você retribui?!

Mad HatterOnde histórias criam vida. Descubra agora