CAPÍTULO UM

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O aroma de caré recém-feito invadiu as narinas de Faye no instante em que ela pisou na cozinha. Jane sorria sozinha enquanto filtrava o café num filtro de papel. A camisola de Faye estava velha e seus pés, descalços. O chão frio sob seus pés era retrato do inverno cruel que se aproximava nos próximos meses. Ela apertou os braços ao redor de seu corpo e somente quando arrastou uma cadeira para sentar, Jane notou sua presença.

—Olá, dorminhoca.

—Hum, o cheiro está bom... – A voz não era de Faye, era mais forte e ríspida. Stephanie era conhecida por sua voz eloqüente, assim como sempre fazia questão de frisar. Sendo aluna de graduação em Antropologia, suas habilidades comunicativas tiveram diversas oportunidades de desenvolvimento. Sem contar nisso, também é a melhor escritora. Faye se arriscava a escrever alguns poemas em guardanapos velhos, mas Joanne era uma escritora nata.

—Fiz pão caseiro hoje. – Diz Jane, orgulhosa, colocando um prato com pães quentes sobre a mesa. Os pães são tortos como se tivessem sido feitos às pressas, mas Faye jamais diria isso a Jane. Ela parece feliz naquela manhã.

Ouvimos passos se aproximando e o rosto inchado de Julia aparecesse na cozinha. Seus cabelos cacheados e longos caem como uma cascata de águas negras sobre seus ombros. Seu nariz está vermelho, mas é difícil para Faye dizer se é por causa de uma alergia ou se estava chorando.

—Bom dia para a gravidinha mais linda do mundo! – Jane se aproxima de Julia e se abaixa para dar um beijo em sua barriga pontuda. Júlia está grávida de cinco meses, mas é como se o bebê já estivesse pronto para sair. Jane já tivera filhos antes, então dizia com toda certeza que o bebê era um menino. Julia parecia não se importar. Talvez o sexo de seu bebê estivesse longe de ser uma complicação.

Jane dá um beijo no canto da boca de Julia e esta sorri. Seu sorriso, porém, esconde várias entrelinhas.

—O pão parece estar bom. – Diz Julia, arrastando uma cadeira para se sentar. Só então Jane dá uma volta à mesa e vai até Stephanie. Beija o canto de sua boca e vai até Faye. Ela sente o gosto de hortelã de sua boca quando Jane lhe beija.

—Fiquem à vontade! É tudo para vocês.

As meninas logo se movimentam para se servir, mas Jane fica apenas parada, sorrindo, limpando as mãos em seu avental xadrez de forma obsessiva. Ela vai até a pia e começa a esfregar a bucha numa panela. Faye logo percebe que há algo de errado.

—Está tudo bem, Jane?

Ela larga a panela e vira para as meninas, sorrindo.

—Claro, querida.

Antes que Faye possa contestar, Jane volta a esfregar suas panelas. As meninas comem e, então, vão para seus quartos. Pelo calendário feito à mão na porta da geladeira, Faye sabe que é uma quinta-feira, o que significa que é dia de Corte e Costura. Ela vai para seu quarto e decide tomar um banho antes que todas se reúnam na sala de estar.

Entre seus inúmeros vestidos feitos por ela mesmo, ela escolhe um de pequenas flores coloridas. Ele tem mangas curtas e é marcado na cintura, fazendo com que a saia seja solta e leve. Se Faye pudesse ficar ao vento, ela tinha certeza de que seu vestido voaria lindamente numa tarde fria de outubro.

Quando volta à sala de estar, Jane está montando todas as quatro máquinas de costura. Stephanie e Julia estão sentadas no sofá e Steph está fazendo uma longa trança nos cabelos de Julia.

—Oh, que bom que está pronta, Faye! – Exclama Jane, passando a linha na agulha da última máquina. – Hoje iremos continuar a trabalhar no enxoval do bebê. Pensei em fazermos casaquinhos, o que acham?

O lado obscuro do solOnde histórias criam vida. Descubra agora