Era de noite, o céu estrelado esbanjava beleza, inúmeros pontos luminosos que estendiam-se ao infinito. Ao longe se via uma estrela cadente viajando o mundo inteiro, agraciando a todos com seu brilho escarlate. O silêncio, sendo seu maior companheiro, ajuda a conquistar o coração dourado da serenidade que traz consigo uma sensação de mudança.
Em cima de uma sacada de pedra, uma das poucas que fora ornamentada com uma murada repleta de estátuas, encontrava-se uma mulher de beleza inigualável. Cabelos ruivos estendiam-se até sua cintura como uma cachoeira bela de se ver no pôr do sol. Feições delicadas traduziam sua beleza para todas as línguas do mundo. Mas, mesmo que oculta pela escuridão da noite, seus olhos verdes eram visíveis. Eram intensos, clamavam por poder e ansiavam pelo futuro.
Estava debruçada olhando para sua cidade. Indagava, o tempo todo, sobre suas escolhas e como elas influenciam o mundo. Uma cidade dos esplendores, uma cidade tão poderosa e tão melancólica.
Um suspiro escapou pelos seus lábios sem nem ao menos perceber.
— Cansada esta noite, minha rainha? — Uma voz suave, mas um tanto jovial, surgiu por trás da rainha.
Arregalando os olhos, virou-se rapidamente esvoaçando sua túnica de seda e uma pequena adaga em sua mão. Mirou-a exatamente no pescoço daquele que havia surgido para, só então, perceber quem se tratava.
— Acalme-se, minha rainha! Sou eu... Siddartha Bumpo! — Em sua frente encontrava-se um homem. Pele parda coberta de cicatrizes em ambos os braços e cabelos roxos. Trajava roupas extremamente simples e um sorriso assustado. — Perdoe-me pela brincadeira, mas não pude resistir. — Momentos após finalizar sua frase um pequeno corte surgiu em seu pescoço.
— Respeite-me, bufão. Ou esqueceu quem encontra-se em sua frente?. — Respondeu rispidamente enquanto voltava a guardar a adaga.
— E você não faz ideia do quão feliz fico por deixar este fato desaparecer de minha mente nesses poucos momentos. — Seu sorriso maroto parecia ter crescido ainda mais — Mas até aqui, tendo somente a lua como nossa testemunha, não me chamará pelo nome?
Sua pergunta não fora respondida.
A rainha, tomada por todo seu ímpeto, trouxe o homem para próximo de seu peito e, envolvendo-o com um abraço apaixonado, realizou um beijo selvagem. Seu coração bateu forte. Não pelo beijo, mas por sentir os batimentos acelerados do bobo real próximo ao seus.
Era impossível pensar naquele momento, sentia-se nas nuvens.Todos os seus músculos relaxaram, todo cansaço desapareceu. O tempo não exista ali, podia passar a eternidade e não perceberia. Nunca havia sentido algo assim, meio desajeitado e meio exagerado. Tinha quase certeza que isso era amor.
— Bem, pelo visto, sou a única que consegue deixá-lo sem palavras. — Seu rosto era impassível. Respondeu sem esboçar nada, mas lá no fundo a confusão mental de seu bobo a divertia.
— Minha rainha...
— Silêncio! — Exclamou colocando seu dedo sobre os lábios do homem. — Quer que lhe chame pelo nome, mas continua não falando o meu? Um pouco hipócrita de sua parte, não acha?
— Elyza... — Sua voz saiu com dificuldade, como se estivesse sofrendo pela falta de respeito. — Hoje quase fui pego pelos seus guardas. Acha sábio continuarmos arriscando dessa maneira?
— Infelizmente, os ataques daqueles bárbaros estão tornando-se cada mais constantes. Os guardas estão ficando sempre à postos, em busca de uma desculpa de atacar qualquer selvagem que apareça. — Segurou a mão de Bumpo, seus dedos eram pequenos comparando com os dele. Sentia a sua respiração pesada e admirava seus olhos cor de mel, uma escultura feita pelo maior artista.
— Pelo visto, teremos que diminuir as frequências de minhas visitas... — Suspirou enquanto olhava para a lua, que brilhava no céu e iluminava um lacrimejar que começava. — Quem mandou eu me apaixonar por uma rainha que anseia por mudanças, não é mesmo? — Riu melancolicamente, a tristeza escondia-se por trás de seus dentes.
— Bumpo, desde o começo sabíamos que seria difícil. Não foi você que, arrogantemente, afirmou ser melhor que toda a minha Guarda Real? Depende exclusivamente de você chegar aqui, sabe disso. — Limpou a única lágrima existente em seu rosto, odiava vê-lo assim. Esse seu lado emocional é realmente uma benção e uma maldição, pensou consigo mesma.
— Bem, então, isso soou como um desafio! — Abriu novamente seu largo sorriso infantil e, segurando uma de suas mãos e colocando a outra em sua cintura, obrigando-a a girar e dançar.
Elyza não tinha forças contra ele, contra suas idiotices. Sentia-se como uma criança novamente, livre de todos os problemas. Dançando com um bobo da corte à luz da lua, quem diria não é mesmo? Seus olhares conectavam-se por uma linha invisível de paixão, não queriam perder um segundo de admiração mútua. Encontravam paz em cada toque, em cada conversa.
Mas a realidade, como sempre, voltou a quebrar a ilusão amorosa do casal.
Quando a luz atingiu seu estado mais brilhante e algumas outras estrelas cadentes multi coloridas passaram no céu, a grande porta de carvalho real tremulou com uma série de batidas. Eram apressadas e, ao fundo, ouvia-se o som metálico de armaduras de batalha.
— Minha rainha, encontra-se acordada?! Minha rainha! — O som de batidas eram mais e mais frequentes. — Precisamos da senhora! Minha rainha!
Elyza, saindo em disparado até a porta, parou e olhou para seu parceiro de dança. Ele estava meio confuso, mas rapidamente teve a realidade atingindo seu olhar. Ousado como sempre, alcançou-a e então roubou-lhe um beijo inesperado diante de toda a situação. E se os guardas entrarem, seu idiota?! Por que não sai logo daqui?! Bumpo deu uma rápida piscadela e então, com um brilho roxo em seu olhar, correu até a borda da sacada de pedra do castelo.
— Até a próxima noite, minha rainha! Mantenha um sorriso em seu rosto e poder em seu olhar! — Subiu com um pulo em uma das esculturas e então, sorrindo alegremente, jogou-se para trás de braços abertos.
Ficou sem falas, não sabia até hoje como ele conseguia fazer tudo aquilo. Balançou o rosto e endireitou a postura. Foi rapidamente até a borda de sua cama, onde havia uma capa prateada para por em cima de sua túnica. Depois disso, abrindo a porta de seu quarto, foi recebida com uma dupla de guarda esbaforidos com medo em seu olhar.
— Minha rainha, o Alto Conselheiro recebeu uma mensagem! Solicitou, com máxima urgência, uma reunião do conselho. O Arquipélago de Tundaria está marchando para batalha! Uma guerra irá começar!
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A Tarefa de um Tolo
FantasyUm bobo da corte. Uma rainha poderosa. Um romance incomum que ambos precisam fazer dar certo enquanto uma invasão aproxima-se de todos na magnífica cidade de Ziggler, dentro do Continente de Isamur. Nestes tempos de revolta talvez o amor possa junta...