A Velha Máquina

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Numa tempestade de verão, a energia resolveu acabar quando estava quase concluindo a fase mais difícil daquele jogo. Fiquei irritada em meio a formas geométricas que via, aos poucos, desaparecer da tela do computador. O que eu fiz às divindades superiores, para ter esse trágico fim? Eu sei, é só um jogo, mas era o meu jogo idiota favorito – pois todos os jogos favoritos são idiotas. Eu não havia planejado mais nada para o fim da minha tarde, só eu e meu lindo computador. Não tenho irmãos, e mesmo que tivesse, ninguém merece passar o tempo sem luz com pequenos projetos de si mesmo. Luz por favor, volte para mim!

Sai andando pela casa na esperança de tropeçar em algum objeto extremamente precioso que fizesse o tempo passar voando na velocidade da luz. Bom, tropeçar não seria a melhor maneira... Ei, o que é isso?

– Mãe? Tudo bem?

– Oi filha! Estou aproveitando a falta de energia para dar uma arrumadinha nessas coisas aqui.

O chão do quarto dela estava parecendo uma piscina pública. Não havia espaço para se locomover, nem se eu pulasse com só uma perna. Diversos objetos terrestres não identificados. Alguns nem conhecia...

-Pra quê isso serve? – opa, alguém pensou alto demais.

– É uma máquina de escrever, filha.

– Que legal, quer dizer que ela escreve tudo que eu digo com reconhecimento de voz? – achei meu objeto precioso.

– Não meu bem, você digita com os DEDOS, como nos computadores.

– Mas não tem tela! – nova tecnologia: digitação via além.

– Você precisa colocar o papel. É como uma impressora instantânea!– incrível...

– Posso testar?

Depois de ganhar autorização para mexer na máquina de escrever, levar meia hora para encaixar o papel, descobrir que não precisava de energia, e que aquelas teclas fazem um barulhão. Consegui escrever alguma coisa, mas fiquei triste quando descobri que não é possível apagar o que foi escrito. Igual as escolhas sem volta que a gente faz na vida. É preciso pensar três vezes antes de datilografar alguma coisa.

Inventei várias frases estranhas tentando construir histórias sem sentido, me perdendo naquele formato de letra esquisito.

– Filha! – minha mãe aparece de repente – Você ainda está mexendo na máquina?

– Estou esperando a luz voltar...

– Mas já faz duas horas que a energia voltou.

Perdi totalmente a noção do tempo enquanto estava descobrindo um novo mundo nessa máquina, nessas teclas. Quem precisa de tecnologia, quando a distração pode ser encontrada num baú?

A Velha MáquinaOnde histórias criam vida. Descubra agora