Capítulo 3: A sensação que nunca foi sentida

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Dora estava no transporte público quando sua tia atendeu a ligação:

— Quanto tempo não lhe vejo, minha querida— ela falava enquanto acendia um cigarro. Dora soube disso, pois ouviu o barulho do isqueiro.

— Preciso fazer uma visita para a senhora, acho que vai entender do assunto que vamos conversar— a garota estava apreensiva.

— Estarei aqui te esperando com Raul— respondeu por fim.

Na Cidade do Amanhã poucas pessoas usavam o carro, isso por que o transporte público da cidade (desde metrôs até ônibus) pareciam funcionar de uma maneira que nenhuma outra cidade funcionava. Assim o transito na cidade corria sempre de maneira tranquila, seja em dias corridos, seja em finais de semana com feriados prolongados.

No ônibus Dora guardava o celular na bolsa e observava a paisagem, havia uma propaganda num prédio comercial sobre a atualização no software interno dos Androides de Companhia. Naquele momento um casal entrou no ônibus e se sentou na sua frente, eles pareciam felizes, beijavam-se e conversavam coisas engraçadas. Dora sentiu um aperto no peito, ninguém ali notou seus sentimentos, mas a garota sempre quis saber como era a sensação de se sentir amado por alguém.

Ela tinha o amor de seus familiares, apesar dos pesares, e do seu melhor amigo, claro, mas, Dora nunca havia experimentado aquele tipo de amor, pois nenhuma pessoa até agora foi capaz de amá-la do jeito que ela era.

Houve um tempo em que ela se debulharia em lágrimas ali mesmo, pensando em como as coisas da vida não corriam sempre da maneira como queremos, mas o amadurecimento pousou com graça em seu caráter, fazendo com que Dora não se sentisse tão triste com aquilo. Era apenas uma conformidade que ela tinha o anseio de sempre carregar consigo. Ela precisava disso pra seguir em frente.

* * *

A casa de tia Rosalinda era muito simples, ela trabalhava na empresa de compras onlines e ganhava um salário razoavelmente considerável, afinal, ela tinha um Androide de Companhia, e eles não eram tão baratos quanto deveriam ser.

— Ah, imagina, estava pagando Raul em suaves prestações de 38 vezes sem juros— ela falava, enquanto Dora se servia de um bolo de laranja que ela havia feito rapidamente para receber sua sobrinha.

— A senhora já terminou de pagá-lo? — ela perguntou.

— Bom, houve uns atrasos aqui, umas multas de pagamento ali,mas eu já paguei sim. Mas me conte, o que devo a essa visita inusitada? Sua família me detesta.

— Eles não te detestam titia, eles só... não sabem o que fazem.

Rosalinda confirmou com a cabeça, amargurada, depois daquela primeira vez em que levou Raul a festa tradicional eles nunca mais foram os mesmos com ela.

— Eu vim aqui, pois quero conhecer Raul antes de ir comprar o meu Androide de Companhia.

Naquele momento Raul entrou com uma jarra e dois copos grandes de suco natural de abacaxi, feito pelo próprio. Sentou-se ao lado de Rosalinda e serviu para Dora.

— Ah que felicidade, também vai comprar um? — ela falou, entusiasmada— vou adorar ver a cara de arrependimento dos seus pais quando souberem e...

— NÃO— Dora se prontificou— é por causa de uma matéria jornalística.

Rosalinda murchou

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