1 Lynet

569 19 1
                                    

Lynet a viu pela primeira vez no pátio.


Bom, a garota estava no pátio, Lynet estava em uma árvore.

O zimbro no pátio central era uma das últimas árvores ainda com folhas em Primavera Branca, por isso, era um dos melhores lugares para se esconder no castelo. Acomodada em seus galhos, Lynet só podia ser vista por alguém logo abaixo dela. Esse esconderijo era especialmente útil em tardes como essa, quando ela decidia faltar às aulas sem avisar aos tutores.

A jovem que caminhava às pressas pelo pátio não passou diretamente
embaixo da árvore, por isso não notou Lynet observando. O que primeiro chamou sua atenção foi a roupa da garota. Em vez de um vestido, ela estava
usando uma túnica marrom e comprida sobre uma calça solta, permitindo que
se movimentasse com mais liberdade em um passo longo e largo. Ela caminhava com propósito, os olhos escuros fixos à frente.

Lynet achava que conhecia todos os rostos em Primavera Branca, mas não
reconheceu a garota. Era verdade que o lugar recebia visitantes que iam e
vinham durante o ano, mas em geral isso acontecia em ocasiões especiais, e
mesmo nesses casos, ela reconhecia a maioria de vista, se não por nome.

Toda uma torrente de perguntas brigava por atenção na cabeça de Lynet: Quem era essa garota? De onde tinha vindo? O que estava fazendo em Primavera Branca? Aonde estava indo, agora, com tamanha convicção? Por que levava uma bolsa grande na mão? Ela era um mistério, e mistérios eram raros em Primavera Branca, onde tão pouco mudava de um dia para outro. A estranha era sem dúvida mais empolgante que a aula de música que Lynet estava cabulando.

Agora, no outro lado do pátio, a garota subia o lance curto de degraus de pedra que levavam à ala oeste do castelo. Assim que desapareceu pela porta em arco, Lynet desceu da árvore e correu atrás dela, os pés descalços silenciosos na neve. Olhou pelo corredor e viu a garota começar a subir a escadaria à esquerda. Lynet esperou até que ela desaparecesse e, em seguida, foi correndo até o outro lado do corredor para pular a janela. As pedras irregulares, os beirais e cantos pronunciados de Primavera Branca tornavam o castelo excelente para escalar, algo que ela tinha descoberto desde muito nova. Usou a beirada acima da janela para se apoiar, com cuidado para não prender o vestido cinza de lã nas partes mais afiadas do beiral esculpido. Ela não queria ter de explicar ao pai por que havia um rasgo em seu vestido, ou ver o sorriso forçado quando sua mestra de costura perguntasse por que os bordados feitos por Lynet nas barras na semana anterior já estavam se soltando.

Agachada em silêncio sobre a beirada, Lynet acompanhou os movimentos da jovem em sua cabeça: depois de subir a escada, ela desceria o corredor até chegar à primeira curva, pouco depois de onde Lynet estava empoleirada, e daí poderia seguir sempre em frente ou virar em outro corredor. Lynet contou os segundos, sabendo que ouviria passos a qualquer momento...

Sim, lá estavam eles, passando pelo corredor do lado de dentro. Lynet fez
questão de abaixar a cabeça para que a garota não visse seu cabelo acima do batente da janela e ficou ouvindo os passos continuarem, fazerem a curva e descerem até o fim do corredor, seguidos de uma batida alta.

Ela ouviu uma voz:

- Ah, entre!

E depois o som da porta se fechando outra vez.

Lynet não sabia ao certo quem estava falando, mas não importava quem, contanto que soubesse onde. Ela espiou por cima da beirada bem a tempo de ver a estranha entrar pela porta no fim do corredor à esquerda. Lynet subiu pela janela, atravessou o mesmo corredor e saiu pela última janela, indo parar do outro lado do castelo. Ela seguiu de lado pela beirada com cuidado, contando as janelas mentalmente.

Garotas de Neve e Vidro Onde histórias criam vida. Descubra agora