Capitulo 1 - A luz do lago

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David



A nossa velha caminhonete vermelho-ferrugem estava a toda velocidade numa longa estrada deserta, coberta de folhas secas alaranjadas do outono, que caiam distraidamente sobre o chão e formavam pequenos redemoinhos ao passarmos por elas.

O ar frio e cortante batia forte em meu rosto, avermelhando levemente minhas bochechas e espalhando meu cabelo negro sobre os meus olhos fechados. Acordei a tempo de ver os últimos raios de sol se esconderem por detrás das montanhas de picos nevados.

"Greenfield deve ser bem fria." - pensei olhando a bela paisagem do pôr do sol, decorado com as imponentes montanhas e a densa floresta bem abaixo delas.

– Pai já estamos chegando? - perguntei ainda meio sonolento, tirando os fones do meu ouvido, mas ainda podia ouvir Billie Eilish cantando "Lovely" bem baixinho.  

"Isn't it lovely, all alone?

Heart made of glass, my mind of stone

Tear me to pieces, skin to bone

Hello, welcome home."

Meu pai, o Dr. Jonathan Sullivan, era um renomado arqueólogo e professor de história muito disputado por várias das melhores faculdades do país, sei disso pois passamos um bom tempo em cada uma delas e todos queriam a atenção dele. Há poucos dias ele havia recebido uma ótima oportunidade de ir trabalhar na cidade para onde estávamos indo. Na verdade, era mais um pedido de ajuda da nossa última parente viva, minha tia, Penelope Vanbroots. Ela estava desesperada com a morte repentina e misteriosa de seu marido o Dr. Richard Vanbroots que simplesmente apareceu morto da noite para o dia.

Papai estava muito concentrado na estrada. Parecia estar disputando uma corrida com o por do sol. Demorou quase um minuto para que ele me respondesse. – Ah. Oi David, já acordou? - falou meu pai me olhando através dos óculos redondos de hastes marrom.

– Sim ... já chegamos? - falei num tom um tanto irritado de forma negligente.

– Não, ainda não. Mas falta pouco, só mais uns vinte minutos e chegaremos lá. Disse-me ele com uma expressão estranha no olhar, um misto de ansiedade e preocupação que cintilavam em seus olhos cor de esmeralda.  Apesar dos seus 42 anos de idade, meu pai não parecia ter muito mais que 30, ele era forte e jovial com seus cabelos negros iguais aos meus. Sua vivacidade era de por qualquer um no chinelo, principalmente a mim.

A noite estava se aproximando sorrateiramente e o vento uivava como os lobos a luz do luar.

Vinte minutos me pareceram uma eternidade naquela estrada sem fim. Eu ainda estava com muito sono e a viagem de avião tinha sido extremamente cansativa. Eu liguei o rádio do carro. Mas eu não queria dormir de novo. Não com aqueles pesadelos me esperando. Não que eu tivesse medo de pesadelos, mas eu já estava começando a ficar atormentado com eles. Desde o meu aniversário de dezesseis anos na semana passada os pesadelos não pararam de me perseguir toda noite. E eu já estava começando a achar que estava sonhando acordado, pois ontem mesmo pensei ter visto um homem de capa preta no meio do aeroporto nos observando enquanto nos passávamos pelo portão de embarque e segundos depois ele desapareceu no ar. O rádio estava falando sobre a morte do tio Richard.

"... toda a cidade de Greenfield sente a morte do estimado Dr. Richard Vanbroots que nos deixou de uma maneira tão repentina e misteriosa. Sua esposa a Sra. Penélope Vanbroots está inconsolável e se encontra recolhida em sua mansão desde a noite do ocorrido e não querendo dar entrevistas a ninguém. O que conseguimos descobrir foi que o Sr. Vanbroots estava voltando de carro para casa na noite de 22 de novembro durante a madrugada de sábado para domingo, mas por algum motivo parou no meio da estrada a mais ou menos uns três quilômetros de sua casa. Depois disso, pela manhã, seu corpo foi encontrado no meio da floresta por um grupo de estudantes e professores da escola de Greenfield que faziam pesquisas sobre a diversidade local. A polícia ainda não tem explicações para o que aconteceu com o Sr. Richard ..."

As Crônicas do Guardião - O Despertar das SombrasOnde histórias criam vida. Descubra agora