Capítulo 2

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Era o primeiro dia de aula do Terceiro Ano do Ensino Médio, ano este que prometia ser o melhor até então na vida daqueles jovens cheios de sonhos e energia. Chris estava sentado em uma das mesas, rodeado por um grupo de amigos, colocando os assuntos das férias em dia, sorrindo e brincando e, então, uma garota entrou na sala acompanhada pelo professor de Matemática, que os saudou.

—Bom dia, alunos, sejam bem-vindos. Sentem-se, por favor.

A novata procurou um assento no fundo da sala, mas estavam ocupados pelo grupo de Chris. Sentou-se, então, em qualquer lugar vago na fileira do meio. Os garotos a olhavam curiosos, as garotas cochichavam e riam baixinho. A novata não olhava para os lados, nem para trás. Estava confortavelmente imóvel, parecendo mais entediada do que realmente preocupada em pisar naquele terreno estranho da nova escola.

— Bem, alunos, acredito que todos aqui já se conhecem com exceção de mim e dessa mocinha que acaba de entrar. Meu nome é Adil, sou professor de Matemática e os acompanharei nesse último ano, inclusive para a preparação para o vestibular. Poderia se apresentar, mocinha? — solicitou, se dirigindo à novata.

Ela permaneceu em silêncio, meio tímida. 

— Qual é o seu nome? — insistiu o professor.

— Clara.

— Ótimo. É o bastante. Terão tempo de se conhecer depois. Agora precisamos discutir o cronograma...

 Adil virou-se para o quadro e fez algumas anotações, explicando como seria seu curso naquele ano. Clara abriu o caderno e começou a escrever. As garotas se cansaram de falar mal da novata e viraram-se para frente para copiar. Um amigo de Chris fez qualquer comentário do tipo “feiosa”, antes de se virar para frente.

Chris ficou inerte, olhando aqueles cabelos vermelhos compridos e aqueles tênis All Star surrados que ela calçava. Vira o rosto dela muito rapidamente e agora a nova aluna estava sentada de costas para ele. Chris tombou o corpo para um lado e para o outro, mas tudo o que conseguiu foi vê-la de perfil. Ele desistiu e resolveu concentrar-se na aula. Seria interessante ter aquela garota na sala. Pelo menos uma pessoa diferente daquelas patricinhas competitivas da turma.

 Com os olhos alternando entre o quadro e o caderno, Clara copiava as anotações do professor sem o mínimo de entusiasmo, respirava fundo pensando em quanto aquele último ano seria difícil e no esforço que teria de fazer para suportar aquele bando de patricinhas e playboys que infestavam o colégio. Desejava ter ido para uma escola pública, qualquer que fosse. “Escola é tudo a mesma coisa”, pensava. Mas seu pai fora irredutível e obrigou-a a aceitar permanecer no sistema privado. Ela detestava tudo aquilo e não entendia por que o pai pagava uma fortuna nas mensalidades de um colégio como aquele. “Era ridículo!”, julgava a menina.

Clara entrou naquela escola já bastante pessimista. Tentava, sem sucesso, se apegar as palavras de sua melhor amiga, que a incentivava a confiar em Deus e acreditar que seus problemas seriam resolvidos. Contudo, presumia que o que a esperava naquele lugar não seria nada diferente de todos os colégios nos quais já tinha estudado. Seria hostilizada pelo grupinho dos populares, principalmente pelas garotas, que se achavam as mais belas do mundo. Não atrairia nenhum olhar masculino, pois não julgava possuir os atributos que aqueles rapazes procuravam em uma garota. Talvez se destacasse pelas notas altas, mas odiaria ser elogiada por algum professor diante da turma. Preferia ficar no anonimato, que a deixassem em paz, esquecida em um canto, o que era impossível com aqueles cabelos vermelhos e o jeito incomum. Ela não conseguia perceber que quanto mais tentava se esconder, mais atraia olhares curiosos. Talvez, se fosse uma garota comum, pudesse passar despercebida, mas não, ela não tinha nada de comum, era muito diferente... E isso atraiu a atenção de Chris.  

 Clara era de estatura mediana, cabelos compridos e tingidos de vermelho, ondulados, inteiros, cuja franja era do mesmo tamanho de todos os outros fios. Nenhum corte definido. Para falar a verdade, não cortava o cabelo há um bom tempo.  Aparava as pontas, de vez em quando, para não ficar longo demais. Seu uniforme, já customizado do ano anterior, seria aproveitado também nessa escola, que era da mesma rede. Pouca maquiagem, apenas olhos bem marcados por delineador preto. Levava dois brincos pequenos em cada orelha, prateados. Poucos anéis, muitas pulseiras e colares diferentes, tênis All Star bastante gastos. Suas roupas largas e desbotadas não revelavam seu corpo magro e claro. Suas unhas costumavam ser pintadas com esmalte escuro, mas nada feito em salão, ela mesma fazia, ou sua melhor amiga, chamada Ariana, quando passavam a tarde conversando. Talvez fizesse amizade com um ou outro nerd que puxasse papo. Ela tinha preconceitos. Quer dizer... Não contra os nerds, mas sim contra as patys e playboys.

Um Ano Bom - DegustaçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora