ÁUDIO NÚMERO 288: Minha mãe queria que eu fizesse faculdade de Direito, então...

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Jimin correu até a loja de conveniência e molhou todo o seu moletom para comprar um guarda-chuva. Irônico.

Não quis mais ficar sentado e seguro dentro da biblioteca quando soube por Namjoon e o resto do grupo que teria uma tempestade de relâmpagos aquela noite. Triste e miserável tudo bem, mas não queria voltar para casa tostado.

Aproveitou e comprou um pacote de balinhas. Enfiou-as nos bolsos antes de sair e firmou as mãos no guarda-chuva. Com a ventania, a única parte do seu corpo que ficaria seca depois de chegar ao ponto de ônibus seria seu rosto.

Resmungou, amargo.

Quando pensou em atravessar a rua, quase foi atropelado por uma bicicleta. Viu cabelos castanhos, bolsas escuras embaixo dos olhos, uniforme da loja de conveniência em questão que tinha acabado de sair.

Completamente encharcado.

O homem, que mais parecia um garoto, olhou para Jimin vagamente, como se mal conseguisse o enxergar. Ele o pediu desculpas rapidamente e saiu arrastando sua bicicleta até o estacionamento.

Jimin não pôde deixar de o encarar, distraído, antes de forçar-se a atravessar a rua e se dirigir ao ponto de ônibus da esquina.

Talvez o criador de Meus Pêsames estivesse nessa situação. 

Tentou tirá-lo da cabeça mas não conseguiu, já que a voz do mesmo passou a se reproduzir em seus fones de ouvido.

Tinha conectado-o em seu celular, o site, e "sem querer" autorizou a reprodução automática.

Deixou o guarda-chuva aberto em cima da cabeça mesmo depois de chegar ao ponto. E ficou ali, em pé do lado dos banquinhos encharcados e da sombrinha pequena demais para fazê-lo escapar das gotas d'água.

Ouviu um batucar em ambos os seus ouvidos pelos fones, e por isso, forçou-se a prestar mais atenção na movimentação da rua. Movimentação nenhuma, quis dizer.

— Minha mãe queria que eu fizesse faculdade de direito, então eu comecei a fazer de artes.

Abriu um sorrisinho. Não tinha nada que a família de Jimin queria que Jimin fizesse. Quando completou 18 anos, tudo que sua mãe tinha o dito fora: "Se eu ficar rica no final e você bancar o resto da minha vida, você pode fazer o que quiser."

Olhou para a rua e viu um ônibus vindo na distância. O número começava com 2. Ainda não era o seu.

A segunda coisa que ela tinha dito era: "... Literatura não combina com você." Jimin concordava.

Depois de três meses de faculdade, pelo menos.

— Diferente do que meu pai acha, não foi de propósito. — O homem deu uma pausa para uma risadinha abaixa e não demorou para continuar. — Okay, talvez um pouco.

Jimin não conseguiu tirar o sorrisinho besta no rosto. Áudio passado o homem soava como alguém que já estava cansado de tudo antes de começar; nesse, ele soava como uma criancinha sapeca.

— Comecei a fazer arte porque tenho uma paixão esquisita por cores. E porque eu posso ter a chance de destruir a Disney se conseguir um emprego lá, o que é improvável.

Gargalhou, baixinho. O ônibus parou no ponto em que estava, bem em sua frente, e molhou sua roupa mais ainda quando abriu as portas. Se sentiu mal com a mulher que descia dali, com seus saltos limpinhos e um guarda-chuva igualmente curtinho e provavelmente improvisado.

Pediu para Deus que não voltasse para casa tão encharcado quanto ela estava, e a bolsa dela também.

— Não, a verdade é que amo poder tirar o embolado da minha cabeça e jogar tudo isso na tinta, enquanto tenho meus acessos de raiva. — O homem batucou o lápis contra o microfone, fazendo um som desconfortável passar pelos ouvidos de Jimin. Resmungou. — Opa, desculpa. Quer dizer, não é realmente um acesso de raiva. Mas de qualquer jeito, quem me ver tendo um só vai pensar que eu estou realmente inspirado enquanto pinto.

O homem soltou uma risadinha contida, como se não quisesse acreditar no que estava rindo. — Haha, pinto.

Revirou os olhos e deixou os lábios derreterem naquela linha esquisita, onde não se sabia se queria parar de sorrir ou sorrir mais ainda.

Outro ônibus veio da distância. 372. Jimin se aproximou e se preparou para entrar.

—Bem, meu pai já sabe que eu não vou ser o irmão rico da família. Eu não vou o comprar sofás novos todo ano e Iphones a cada lançamento. Mas prometi que iria pagar pelas flores deixadas no caixão de mamãe, então promessa é promessa.

O sorriso nos lábios de Jimin tremeu. Ele tentou escondê-lo quando subiu no ônibus e quando passou seu bilhete na entrada, atravessando a catraca rapidamente. Jurou que o motorista olhara-o de modo estranho.

Seu humor estava nas nuvens. Ouvir aquele homem falar tão tranquilamente sobre tudo era como uma massagens em seus ombros tensos depois de um dia exaustante na faculdade. Era incrível.

— Então, por favor, me apoiem. Me deem dinheiro.

E Jimin se sentou, assim que o áudio acabou com pedido tão absurdamente normal. Encarou a janela e questionou se tiraria o celular do bolso, ou se deixaria com que aquele bater tranquilo de seu coração continuasse.

Não tinha ninguém no ônibus além dele, e do motorista. Já era um pouquinho tarde para estar casualmente na rua, e não em baladas. O céu estava num azul mar bonito, e já conseguiria ver aquele montão de estrelas o pintando por ali.

Deixou continuar.

Se aconchegou no banco frio e virou o rosto para a janela, ignorando seu próprio reflexo. Encarou as ruas praticamente desertas, molhadas e talvez tão assustadas da tempestade anunciada recentemente.

Não sabia se queria continuar a faculdade. Ou se queria trancar e trabalhar com os pais até se decidir. Ou se queria mudar de curso logo no começo. Ou se queria fazer de tudo um pouco.

Só queria se sentir satisfeito, completo. Mesmo que fosse sofrer, assim como o criador de Meus pêsames, que sofresse ficando satisfeito com suas escolhas e decisões.

Queria ter algo que se interessasse tanto quanto arte para ele.

— Oi, eu arrumei um emprego na loja de conveniência daqui perto porque meu amigo foi demitido e olha! Eu acho que sou melhor que ele.

Deu risada.

Sentiu como se estivesse mais perto, só de estar pensando sobre. Sussurrou um curto e pequeno:

— Obrigado.

so i failed at acting like a normal human beingOnde histórias criam vida. Descubra agora