Chocolate quente

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  Sabe aqueles dias que você tem vontade de se tele transportar para outro planeta, de sumir e não deixar rastros? De enfiar a sua cara no buraco e não tirá-la mais de lá? É assim que estou me sentindo hoje. Hoje e nas últimas duas semanas. Estou me sentindo um nada, a pessoa mais idiota e burra da face da Terra. Talvez eu não esteja me sentindo assim. Talvez eu sempre tenha sido assim. E talvez tenha sido esse o motivo de ter sido trocada por outra. É. Acho que foi esse o motivo.

  Eu tinha um namoro tranquilo, um namorado lindo e estava apaixonada. Na verdade, ainda estou. Tudo ia bem até aquele dia. Aquele fatídico dia em que meu mundo veio abaixo.

  Eu e meu ex não éramos casados, mas morávamos juntos. Não somos de nenhuma religião rigorosa que só permite que os casais durmam juntos após o casamento. Acho que no mundo atual está bem difícil, para não dizer impossível, encontrar casais que só fazem sexo depois do casamento. Mas vamos voltar ao ponto. Bom, nós namorávamos há três anos e morávamos juntos há dois. Ele trabalhava em uma firma de advocacia e eu trabalhava em uma clínica médica. Sou pediatra.

  Nós dois sempre trabalhamos muito. Em parte porque pensávamos no futuro e em parte porque nossos trabalhos exigiam muito de nós. Principalmente o meu. A clínica dava movimento o dia inteiro. Às vezes chegava a ficar assustada com a grande quantidade de crianças passando mal que chegavam lá. E nos últimos meses, se é que é possível, o movimento estava ainda maior. Eu estava chegando em casa nove e pouca, dez horas, todos os dias. Com exceção do dia em que tudo aconteceu.

  Eu comi um salgado ao invés de almoçar e quase morri algumas horas depois. Ok, estou sendo exagerada. Eu não estive a beira da morte, mas passei muito mal. Tão mal que não aguentei trabalhar e tive que ir embora cedo. E, graças a isso, presenciei a cena mais humilhante e dolorosa da minha vida: Meu namorado com uma piranha, transando na nossa cama. Na nossa cama!!!

  De início fiquei paralisada, sem acreditar no que os meus olhos estavam vendo. Mas depois, esqueci que estava passando mal, e comecei a agir, dando um berro tão alto para chamar a atenção dos dois, que todas as pessoas num raio de cinco quilômetros devem ter ouvido.

  E o safado ainda teve a audácia de me dizer que não era nada do que eu estava pensando. Fala sério! Eu o peguei com o pau dentro da boceta de outra mulher e ele diz que não é nada do que eu estava pensando. É muita, mas muita cara de pau.

  Nunca senti tanta raiva na minha vida, como senti naquele momento. Estava com tanta raiva que não dei brecha para a tristeza. Ainda bem. Mas foi apenas naquela hora, porque, assim que ele saiu do apartamento, sendo expulso por mim, comecei a chorar e não consegui mais parar. E isso continuou acontecendo até, bem, até hoje a tarde, quando Mia, minha melhor amiga, resolveu dar um basta no meu sofrimento e praticamente me obrigou a vir para essa boate. E o pior não é ter sido obrigada a vir – o que já é bastante ruim  –,  pior ainda é ter sido abandonada no meio desse monte de gente que nunca vi nada vida.

  “Era só o que me faltava!” penso, ao tomar um banho de só Deus sabe o que, que um idiota – provavelmente bêbado – acaba de derramar em mim. Como costumam dizer: as coisas sempre podem piorar.

  – Me desculpe! – pede, gritando para que eu escute, devido a música alta.

  Levanto o olhar para dar o olhar mais mortal e furioso que conseguir, mas meus planos fracassam ao olhar para o rosto do homem a minha frente. Ele realmente parece arrependido e, devo confessar, é muito – MUITO – bonito.

  Não sei se é impressão minha ou se ele também está meio paralisado olhando para mim. Provavelmente refletindo ao meu estado abobado.

  – Tá tudo bem? – pergunta.

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⏰ Última atualização: Aug 05, 2014 ⏰

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