22h03

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Isabella já havia passado por muitas situações difíceis em sua vida. Eram tantas, que ela até nem conseguiria contar. Mas relembrá-las, ah, esse era o seu forte. Fazer alguma atividade enquanto relembrava momentos constrangedores do passado era um de seus hobbies favoritos.

Havia alguns que estavam sempre em destaque; como quando ela mudou de escola e acabou pagando mico no primeiro dia de aula por não saber se localizar no instituto, ou quando sem querer derrubou café na camiseta da pessoa que atualmente se tornou uma de suas melhores-amigas. Isa podia ficar horas falando de seus erros nesta história incrível escrita por nós mesmos chamada de vida, mas somente conseguiria compartilhá-las com alguém que merecesse. E Isa nunca conseguiu achar alguém com quem pudesse contar seus maiores segredos. Nem mesmo seus melhores-amigos conseguiam atingir tal ponto de intimidade com ela.

Por isso Isabella era consideravelmente "solitária". E ela se sentia bem assim, rodeada pelos próprios pensamentos, onde ninguém poderia invadi-la inteiramente, e podendo ser quem ela era.

Era só uma das várias características que Isa possuía, e somente uma das únicas que conseguia se lembrar enquanto despejava algumas lágrimas aleatórias na sua almofada junto do sorvete de morango - uma das partes mais dolorosas do momento, pois Isa tinha uma grande obsessão por alimentos naturais.

Aquela depressão pós-relacionamento estava acabando tanto com ela, que tudo o que fazia agora era chorar assistindo o episódio de Chaves em que todos o culpam por roubar coisas na vila e o menino decide ir embora dali para sempre.

Mas, quem nunca chegou a chorar neste episódio?

Desculpas e desculpas, tudo para esconder o que seu coração gritava a cada segundo.

"Ele não vai voltar." Dizia para si mesma. "Foi melhor ele ter ido. Não se preocupe, Isa, tudo vai ficar bem."

Infelizmente, há uma grande distância entre a emoção e a razão para que ambas consigam decidir alguma coisa sensata.

Isa estava ficando cansada daquilo. Cansada de dizer frases positivas para si mesma a fim de conseguir alguma disposição para erguer-se daquele caos; cansada de ouvir as mesmas músicas sobre coração partido e superação de relacionamento; cansada de ouvir conselhos de seus amigos e familiares; e principalmente, cansada daquele gorduroso pote de sorvete - mas era sabor de morango, então ela iria relevar um pouco nisso.

Ela esperava alguma resposta. Uma ideia, talvez uma inspiração para poder erguê-la totalmente de novo à realidade de antes. Uma realidade em que sua única preocupação era a faculdade de Letras, não se atrasar no emprego e o lançamento de músicas novas de sua boyband de k-pop favorita, o Masc.

Isabella ansiava a falta de um mundo sem Yugyeom, era tudo mais fácil quando o coração sabia bater direito.

Então, no momento em que um novo episódio de Chaves começava, Isa ouviu seu celular ecoar o seu toque de telefone. Correu o mais rápido que pôde até a bancada da cozinha americana pequena, onde o aparelho estava carregando. Atendeu sem conferir o contato, respirando fundo logo após a mini-corrida.

- Alô?

- Se prepara, garota! - Uma voz feminina soou, e Isa imediatamente reconheceu como a voz de Izzy. - Hoje, a gente vai sextar com gosto!

- Sério mesmo, Izzy? - Bufou de cansaço. Sextar na balada era o último item na lista de tarefas de Isa. - Eu estou tão cansada, podemos deixar para semana que vem?

- O quê?! Nada disso, dona Isabella! Você sai hoje e pronto! - Outra voz soou na ligação, e Isa teve de conferir o contato, desconfiada.

Estranho. O contato não era de Izzy, e sim de Ana, a garota em que Isabella derrubou acidentalmente o café na camiseta um dia.

Logo, Isa nem precisou de muito tempo para juntar todos os pontos do que estava acontecendo, e balançou a cabeça em negação, fazendo "tsc, tsc, tsc".

- Izzy, vocês estão na frente do condomínio, não é?

Houve um silêncio de Izzy pela ligação, ao contrário de Ana, que respondeu com um grito: "Sim! Agora que já descobriu a gente, poderia dar uma saída daí para descobrir mais coisas, né?"

Isa sorriu pela primeira vez naquele dia - ela não estava contando os sorrisos que teve com a maratona de Chaves -, agradecendo mentalmente por ter as melhores-amigas do mundo.

Mesmo assim, sair estava fora de cogitação para Isa. Claro que ela poderia mentir, falando que tinha trabalhos da faculdade para terminar ou algum compromisso mais tarde. Mas ela pensou "Por que não?", e falou:

- Me dê motivos para eu sair hoje com vocês.

Um primeiro passo para toda a evolução.

Isa ouviu alguns gritinhos no celular vindos de suas amigas, e preparou-se para a enorme bíblia que seria citada por elas. Mas elas fariam de tudo apenas para conseguir um bom argumento que conseguisse mudar aquela cabeça teimosa de Isabella.

- Você vai ver pessoas, vai ouvir música, vai beber, vai estar vestida como uma deusa, vai viver a sua vida com diversão... - Izzy citava. Isa podia imaginar ela contando aquilo tudo com os dedos.

- E o principal, é claro. - Ana lembrou. - Vai conseguir superar o Yugyeom.

Havia argumentos melhores do que aqueles?

Quer dizer, tirando o de "ver pessoas".

Isa respirou fundo, encarando a televisão que seguia transmitindo o episódio, e tomou uma decisão que transformaria sua vida de uma forma impressionante.

- Está bem, eu vou. Me arrumo e já chego aí em baixo daqui uns vinte minutos, está bem?

Após encerrar a ligação, desligou a televisão - obviamente salvando no episódio de Chaves em que ela parou -, arrumou o sofá e guardou o enorme pote de sorvete. Pôs uma música no telefone e foi prontamente vestir alguma roupa decente. Se quisesse mudança, deveria estar pronta para qualquer coisa.

Só uma grande nota sobre isso: Isa não estava esperando nada daquela suposta festa. Mas eis a regra do destino, nada pode impedi-lo de nos impressionar. Seja bom, ou ruim.

A única coisa que Isabella tinha noção de alguma coisa, era do que seu coração dizia agora, o que seus ouvidos escutavam e o que o seu interior desejava. Coisas que nem ela conseguiria adivinhar, mesmo conhecendo-se tão bem.

Talvez nem Isa estivesse à altura de conseguir a intimidade desejada consigo mesma.

Após se vestir e seguir escadas à baixo até suas amigas, Isa respirou fundo, finalizando sua preparação.

Ela tinha toda determinação para esquecer Yugyeom, e acreditava que conseguiria, sim, superar a sua dor.

one night [⭐] jackisaOnde histórias criam vida. Descubra agora