Na manhã de sexta-feira., Lilly manteve os olhos baixos, temorosa de que, se os erguesse na linha do horizonte, pincelado do mais pálido amarelo, um sorriso abrir-se-ia num piscar de olhos. Seu coração palpitava sob o vestido de linho azul, com sua cintura império alcançando a base de seus seios enquanto as pequenas mangas bufantes faziam cócegas em seus braços. Com rapidez, a garota prendera suas madeixas amendoadas com uma fita azul-celeste enquanto descia as escadas.
- Já vai, minha filha? – Indagou Célia, surpreendendo a garota, que parou segundos antes de tocar a maçaneta da porta da frente.
- Assustou-me, mamãe.
A mulher estava sentada com os olhos na direção da janela da sala, a qual permitia a entrada obliqua de uma luz fraca dos primeiros raios de sol, suficientemente quentes para Lilly e o suficiente para refletir o rosto exageradamente maquiado, com lábios vermelhos cor de sangue, de sua mãe, que trajava sabe-se lá que modelo de vestimenta rendada, tão perdida em camadas que tornava-se uma poluição ao olhar. Célia tinha agulhas na mão direita, espetadas em pequenos suportes de algodão feito por ela mesma, o tecido rosado na outra mão já possuía bordados e arabescos em suas extremidades.
- O que a senhora está fazendo? – Lilly perguntou, aproximando-se com passos leves e quietos, que não abafaram os leves ruídos que vinham da cozinha, onde os novos criados ainda lutavam para se acostumar com o novo espaço de trabalho.
- Teremos um baile em apenas nove dias, minha filha. – Admitiu com certo cansaço, desejando que a filha não começasse uma discussão. Estava sem forças para ganhar qualquer protesto naquele momento. - Creio que vá querer estar vestida de forma...adequada, pelo menos. – Célia pareceu suspirar por entre o fim da frase, como se o evento fosse um fardo para ambas, os ombros abaixando com o movimento.
- Não precisa reformar este vestido...
Os olhos da mulher estavam marejados, brilhosos das lágrimas enquanto seus lábios falavam:
- Queria poder acabar com esse baile, minha cara Lily. – A filha andou até a frente da mãe, ajoelhando-se perante ela, o vestido protegendo seus joelhos do toque direto com o tapete, afagando suas mãos e entrelaçando os dedos. – Queria que...
- Não há necessidade disso, mamãe. – Lilly fechou os olhos e baixou o rosto, um pesar surgindo em suas têmporas. – Não precisa se desculpar.
- É claro que preciso. – Ela respondeu conforme engolia em seco e fungava o nariz, afastando as mãos das da filha, usando uma delas para apoiar seu queixo contra a parte superior da cadeira.
Lilly uniu os lábios e forçou um sorriso, levantando-se enquanto alisava o tecido de suas vestes.
- Estou indo para o café, mamãe. – A garota voltou para a porta. – Quer que eu traga alguma coisa?
- Não, não será necessário. – A mãe deu um sorriso amarelo, querendo que aquela conversa tivesse tomado outro rumo. Havia tanto que Célia gostaria de dizer à filha, mas o medo de ser ouvida por William, que se trancafiava naquele maldito escritório, era o bastante para conter o seu ímpeto. Constantemente algo travava em sua garganta, como se ela soubesse que aquelas eram as palavras certas a serem ditas, mas no final, a mulher não se forçava a expeli-las. Palavras que ela guardaria para mais tarde, talvez, se o momento fosse oportuno. Se não houvesse o medo do marido.
Com o coração batendo tão violentamente quantos as primeiras ondas da maré, Lilly fechou a porta atrás de si e permitiu-se que seu corpo fosse envolvido pela atmosfera quente do exterior, seus pés tentando não tropeçar um no outro durante o caminhar, enquanto animava-se com a ideia de rever aqueles olhos tão intensos, talvez tomar uma xícara de chá e mergulhar nas palavras de um livro. Mas, acima de tudo, saber que teria companhia ao fazê-lo era o que mais lhe aquecia o coração.
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Antes que a Maré Baixe (Degustação)
Tiểu thuyết Lịch sử"O amor tem suas escolhas, assim como o oceano tem suas ondas." Em 1715, Lilly Talbot sabe que o seu destino nunca esteve tão fora de suas mãos; condenada a seguir o modelo de sua sociedade e encontrar um marido, ela percebe que sua liberdade é res...