O Fruto Proibido

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"Eu tenho um coração pesado de chumbo

 E tem sido veneno desde o início

 O que você vai me fazer fazer?"

- wrap me up | skin & bones

  ɷ  


     O vento oeste balançou os galhos da velha figueira como se pressentisse algo de estranho no ar. Christopher lembrava de sua avó a cada vez que cruzada aquele pátio enegrecido da Mansão do Círculo - o local resignado aos sacerdotes e estudiosos aprofundados do coven.

     Velha ingênua ela era, acreditava em todos os provérbios lhe ensinados quando criança, repassando-os a seus descendentes com a mesma morbidez. Ele era um incrédulo filho da mãe - orgulhoso disso, sem dúvidas. Não pedia "por favor, vovó, pare" como o caçula, não inclinava a cabeça com maior interesse como a primogênita. Sequer piscava enquanto ela tentava engolir seus irmãos com histórias absurdas. Ele não tinha alma ou a proteção do bem, o que temer então? 

      Por algum motivo, no entanto, sua espinha parecia gelar sempre que via uma figueira - tão velha e ancestral quanto a própria avó. Aquela figueira em especial, sólida no meio do pátio, arrepiava os pelos do braço. 

     Fiquem longe dos figos, meus diabinhos - ela dizia, com um sorriso de mau gosto. - Fiquem longe...  

      - Senhor Müller... - ele ouviu a voz grossa do familiar de Michaelis. 

       Continuou andando em direção à sala do Sumo Sacerdote sem desviar os olhos para a criatura que o cumprimentava. Não bastava ter que aguentar aquele monstrinho em seu encalço durante a época em que havia certo motivo para isso, tinha que o fazer até mesmo depois? Coruja dos infernos.

          Não era incomum perambular por aquela região da Mansão, mas havia um bom tempo que seus serviços não eram requisitados pelo Sumo Sacerdote - ou que recebia alguma visita. Estava intrigado. Receoso. Sua cabeça parecia comprimida.

          Bateu duas vezes na madeira do portal de carvalho que dava acesso ao escritório. A porta abriu em um clique. Adentrou no recinto fúnebre e se surpreendeu com quem estava ali, quase destoado do local.

     William, o caçula dos Müller. Quanto tempo não o via? Nunca se ateve a refletir sobre isso, o tempo passava de maneira diferente dentro da Mansão. Ele não havia mudado em quase nada. O olhar melancólico, as bochechas saltadas, o cabelo loiro em curvas. O mesmo ranhento de quinze anos que o fizera ser espancado pelo pai até perder a consciência. 

    - Meu irmão! - o rapaz de cabelos cacheados se aproximou com rapidez, um sorriso enviesado no rosto. Pareceu querer abraçá-lo, mas algo no semblante do mais velho fez com que ele recogitasse a ideia. Colocou a mão em seu ombro, controlando a respiração. Nervoso. - Bom te ver. Parece... 

       Cada vez mais habituado à escuridão, Christopher adquiria mais e mais características fundas em seu rosto. Olheiras, sulcos e olhares mais sóbrios. Suspirou, revirando os olhos - aparência não era sua preocupação. 

  - William - o cortou com o máximo de polidez que tinha. Tinha trabalho a fazer, não poderia ficar ali conversando asneiras. - Por favor, sem bajulações. Diga-me o que precisa. 

      O rapaz pareceu desconcertado de certa forma., talvez medindo de o irmão iria o amaldiçoar por estar ali. Mas não, Christopher não sentia mais raiva pelo irmão ter negado seu convite ao sacerdotismo. Sua presença não parecia combinar com aquele ambiente - existia uma juventude em seu olhar que beirava à ingenuidade. A Mansão era velha por completo, o devoraria por inteiro. 

A NOITE DAS BRUXASOnde histórias criam vida. Descubra agora