PRÓLOGO - A Maldição das Treze

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   O frio descia pela espinha. Mil facas pareciam penetrar sua pele, o vento frio da madrugada sugando sua energia e o orvalho, aquele que sempre tinha sido reconfortante sinal de solitude, salpicava seus pés descobertos como ácido. Nem isso... Nem a dignidade de poder andar calçada fora reservada àquelas mulheres. 

   Mulheres não, coisas

   Elas eram nadas, andando em fila até seus carrascos decidirem dar um fim àquilo. Elas eram nadas, abandonadas pelo próprio coven que lhes prometera proteção. Ela era nada, vazia em corpo e alma. Seu filho, que preenchia seu ventre até tão pouco tempo... Era um menino, no entanto. Estaria salvo, protegido, encoberto. Ele seria algo... 

    "Aqui... Sim. Vejam, que belo destino aguardam as senhoritas!" O velho fedido riu, enquanto os outros se encarregavam de transpassar as cordas pelos galhos da árvore retorcida à frente. Era tão estranho aquele som, as risadas debochadas, o acre gosto do fim.  "Vamos acabar com esses seres" diziam desde sempre, orgulhosos. Tão medíocres, tão ingênuos... Existiam mais delas. Várias. Nenhuma as salvariam, mas elas... 

    A quão alto era o preço, não? Aceitar calada o motim que se formara quando os humanos perceberam quem eram elas. Queria gritar de ódio, de raiva, de arrependimento. Não adiantaria. Na noite anterior, quando o Sumo Sacerdote as reunira, ainda havia esperança. Seriam salvas, conseguiriam viver... "É o momento de desempenharem um papel maior do que podem sequer compreender" ele recitou as palavras, como se as presenteasse. Então elas souberam: não haveria salvação. Vocês prometeram, seus infelizes! Juraram pelo nome de Lilith! Onde estão agora?! Não tinham sequer ido até lá para vê-las. 

    Mas era melhor... Se ele a visse, perceberia. Saberia que seu bebê tinha sobrevivido, e então seu plano iria por água abaixo. O plano de mantê-lo longe do pequenino. 

    Os carrascos ataram os nós. As finas gargantas já rodeadas pela corda grossa esperaram o fim do breve discurso sádico dos homens em sua volta. Mulheres não eram pessoas. Mulheres com conhecimento eram a pior espécie. Quem ousava contrariar um Padre, pelo amor do Senhor Cristão?! Satânicas...

    Tão asquerosos, os humanos... Queria o fim deles. Queria o fim de todos que não as tiraram dali. Mas estava tão fraca, gelada, oca. 

    "Uma pena ser tão novinha..." um dos homens passou os dedos pela face da garota ao seu lado, que tremia sem parar. Sentiu repulsa. Seu estômago parecia prestes a revirar-se. As mãos nojentas se aproximaram dela, tocando sua clavícula por cima do tecido rústico. A voz do macho era sombria, maldosa. "Você, anjo... daria uma rentável prostituta".

    Fechou os olhos com força. 

   Até quando aquilo ia continuar? Até quando... Apertou os lábios para não gritar. Para não chorar.  Então sua mente a sabotou com as dolorosas memórias. "Você pediu por isso" a voz dele invadiu sua mente. Havia prometido não pensar naquele homem nos seus últimos minutos - pois ele saberia que estava em sua última súplica. Ele sentiria. E então procuraria por seu bebê com mais afinco. 

 "Se você me disser... Eu a libero dessa tortura. Apenas me diga onde!". 

   Ele não podia achá-lo... Não podia.

   "Não!" 

    Ela sentiu o ar abandonar seus pulmões. As cordas foram puxadas, as levantando do solo, e seus olhos não podiam estar mais abertos. Meu filho, quero viver por ele! Preciso viver por ele! Suas pernas se balançaram, ainda lutando para encontrar uma forma de sobreviver, enquanto os barulhos a sua volta - os granidos, os gritos... Sentiu seu corpo queimar. Braços, pernas, abdômen. 

A NOITE DAS BRUXASOnde histórias criam vida. Descubra agora