Capítulo 1

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9 de Abril de 1912, Southampton

Ponderei mais uma vez sobre tudo o que estava acontecendo. Eu deveria ficar feliz é claro, pois o casamento com Elizabeth Wilson com toda certeza traria muitos benefícios para a alfaiataria de minha família. Contudo, aos vinte e um anos, não era como se eu estivesse mesmo disposto a me prender a um casamento arranjado com alguém que eu sequer conhecia bem. Eu, Klaus Green Thompson me recusava piamente a me juntar à caçula dos Wilson apenas por dinheiro, mas é claro que seria necessário.

É difícil descrever a sensação que tive quando descobri sobre a união. Eu tinha planos. Viajar o mundo, reerguer o negócio da família com meu próprio suor e talento, e não usando do nome de outra pessoa. Mas aqui estava eu, duas da tarde na cidade de Southampton terminado de reorganizar minhas malas para voltar a Nova Iorque com minha futura esposa e meus futuros sogros. Só de pensar meu estomago doía.

_ Por favor, Klaus! – Jackson Green, um primo e também meu melhor amigo exclamou. – Elizabeth é rica e ainda por cima uma das damas mais bonitas que já vi, se me permite dizer caro amigo, não consigo entender porque está assim.

_ Eu não a amo, Jackson – falei irritado pela milésima vez. Fechei minha ultima mala e o encarei. – E não estou dizendo essas coisas porque espero um dia achar o amor verdadeiro, mas porque Elizabeth merece isso, e uma esposa agora só atrapalharia meus planos.

Jackson, com seus cabelos loiros, jogou as mãos para o alto e se levantou, abrindo a gaveta da escrivaninha e tirado uma garrafa de bebida de lá, dando um grande gole no whisky importado antes de se retirar.

_ Pelo menos finja interesse na festa de hoje – pediu ele. – A família Wilson preparou tudo só para poderem lhe agradecer pelo noivado da filha, mesmo que amanhã estejamos voltando aos Estados Unidos, e que eles venham conosco, ainda sim significa que a caçula saíra de casa.

Respirei fundo assim que vi Jackson deixar o quarto, meus ombros caíram exaustos e me joguei na cama, passando as mãos pelos cabelos negros bem penteados e encarando o lustre de cristal do quarto onde estava. Se pudesse haver uma única forma de conseguir impedir esse casamento, mas não tinha, se conseguisse ao menos me livrar da festa que dariam durante a noite já poderia me considerar um homem sortudo. O casamento aconteceria poucas semanas depois da chegada a Nova Iorque, onde eu morava, queria por uma ultima vez ter um momento para esquecer toda a pressão que estava sendo jogada em minhas costas.

Voltei a me levantar da cama, olhei a cadeira de frente ao gabinete, me aproximei e passei a mão pelo tecido do smoking que usaria mais tarde. Se Jackson não tivesse carregado a bebida consigo, ao menos eu poderia esquecer isso com umas boas doses. Fui até a varanda, acendi um charuto e senti a brisa britânica contra minhas bochechas. Deixei a fumaça escapar pela minha boca lentamente, horas depois resolvi por fim me arrumar.

O baile em agradecimento ao casamento de Elizabeth Wilson acontecia noite a dentro. Eu tinha que confessar, a moça realmente estava muito bonita em seu vestido salmão. O pescoço decorado com perolas, dois pares de rubis lhe enfeitavam o lóbulo da orelha e seu cabelo louro caía sobre os ombros em uma trança bem feita. Jackson tinha razão, quanto a beleza da jovem eu não poderia sequer me queixar. Uma verdadeira dama britânica, que carregava uma fortuna em seu nome com apenas dezesseis anos de idade.

Comecei a me perguntar se ela já havia se apaixonado antes. Claro que ela não falaria isso para alguém, a não ser para suas amigas, e que com toda certeza nunca tinha sido tocada de forma intima por algum homem, mas mesmo assim, será que já havia gostado de alguém. Assim que reparou que eu a observava as maçãs de seu rosto ficaram de um tom vermelho que chegava a ser fofo, colocou uma mecha que escapava da trança atrás da orelha e sorriu. Retribui. Era melhor que ela achasse mesmo que eu a estava seduzindo, assim talvez uma hora ou outra acabasse se apaixonando por mim, e consequentemente eu por ela.

_ Mas então, Sr. Green – fui tirado de meus pensamentos pelo avô da garota, que me oferecia um charuto. O coloquei na boca e o ascendi. – Soube que os negócios da família não vão tão bem.

_ São tempos difíceis, Sr. Wilson – e lá vamos nós outra vez para mais um papo sobre negócios. – As marcas de roupas estão competindo fortemente com a alfaiataria, mas tenho certeza que conseguiremos nos reerguer rapidamente.

Alguns minutos depois, quando o álcool já começava a afetar a cabeça de todos comecei a pensar na possibilidade de tentar escapar. Toda a família de Elizabeth continuava a beber e fofocar em um tom de voz altíssimo, do outro lado do salão meu primo Jackson se engraçava com uma mulher de seios fartos e a própria Elizabeth parecia já cansada e entediada. Eu falaria com ela depois, minha cabeça já latejava e eu só queria poder sair daquele local.

Coloquei o copo de whisky na mesa e comecei a caminhar sorrateiramente, torcendo para que as pessoas não notassem minha ausência. Sair do salão de festas na verdade tinha sido muito mais fácil do que eu imaginava. Andei pelo corredor repletos de quadros, imerso em um turbilhão de sentimentos que me queimavam o peito.

Parei um pouco, coloquei as mãos no joelho e tentei capturar todo o ar que eu conseguia.

_ Você parece a ponto de um lapso – me assustei com a voz feminina e só então me dei conta de estar sendo observado, ou talvez seguido. Endireitei a postura e olhei para a dona daquela voz forte.

_ Como?

_ É sério, parece que você quer ser atropelado para conseguir se livrar da tortura que é isso aqui. – comecei a reparar em sua beleza. E meu Deus, como era linda. Os cabelos vermelhos como fogo, com mechas onduladas caindo sobre sua testa, o resto preso em um coque. Sua boca tinha cor de sangue e suas bochechas era muito rosadas. Usava um enorme vestido da cor de esmeraldas. Esticou a mão para mim. – Poppy White, é um prazer.

E naquele momento senti vontade de rir, pois ambos tínhamos cores como sobrenomes. Tomei sua mão e a beijei, querendo naquele momento não estar usando luvas apenas para poder sentir seu calor.

_ Klaus Green Thompson, é uma honra madame.

_ Oh! Ouvi falar de você – levantei uma sobrancelha. – Elizabeth na verdade não para de falar sobre o senhor.

_ Elizabeth é muito gentil – sorri.

_ Mas então, por qual motivo está assim? – perguntou. –Não deveria estar lá dentro comemorando com todos?

Abaixei a cabeça.

_ Na verdade estou tentando fugir de todos – falei sincero, não me importando se ela pudesse ou não ser próxima de Elizabeth. – Não sei se eu deveria falar isso para a senhorita...

_Sem formalidades, não precisa disso comigo.

_ Perdoe-me – corrigi. – Não sei se deveria estar lhe contando isso, mas aqui não é bem onde eu queria estar.

Poppy apertou os lábios e aquilo chamou minha atenção. Eram tão pequenos, pareciam tão saborosos quanto morangos recém colhidos.

_ Isso vai parecer estranho, mas vem comigo – Poppy então segurou em meu braço com força e começou a me arrastar para fora da casa as pressas.

_ Para onde estamos indo? – perguntei confuso e entre sorrisos, porque apesar de eu não saber nada sobre Poppy White conseguia sentir que ela mudaria tudo.

_ Sem perguntas, estou apenas mudando o rumo da sua noite entediante.

E saímos, sem que eu sequer soubesse o que estava acontecendo.

A Ultima Noite (conto)Onde histórias criam vida. Descubra agora