Cuidado

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Era fim da primeira guerra bruxa. E Newt seria obrigado a encontrar o que os outros bruxos chamaram de Cemitério de Dragões.

Aparentemente, era onde os dragões feridos eram deixados pra morrer. E o Ministério da Magia Britânico tinha interesse nas criaturas que pudessem estar vivas.

Newt duvidava muito que apenas dragões estivessem no local. Mas se eram criaturas feridas ele iria o mais rápido possível.

Por isso saiu na surdina da madrugada, rumando para um conjunto alto de colinas. Se ele fosse um dragão ferido em busca de abrigo, sem dúvida escolheria um local de difícil acesso.

Sabia que deveria ter aprendido a voar em vassouras na escola... Mas ele detestava as aulas. Por isso acabou perdendo um bom tempo escalando a colina.

Quando começou a descer para o vale que havia entre elas, onde haviam chamas altas, a tempestade o pegou. Por uma sorte fora do comum, escorregou pela encosta até cair na entrada de uma caverna.

Entrou de ré mesmo, arrastado no chão lamacento. Ao menos a chuva apagaria as labaredas altas para ele poder investigar na manhã seguinte.

Sentiu algo se revirar em seu bolso. O pegou com cuidado, rindo sozinho.

-Niffler! Seu pestinha! Você devia estar em segurança com os outros.

O pelúcio lhe deu um baile e correu para a escuridão absoluta da caverna, quase cantando vitória por fugir do magizoologista.

Newt riu sozinho, enquanto se levantava e usava a varinha para limpar e secar suas vestes. Só quando estava devidamente em pé, ouviu uma respiração cansada, e os resmungos baixinhos do pelúcio. Sentiu a coluna gelar, e se virou para o interior da caverna.

-Quem é você? Por que ele estava no seu bolso?

-Olá.-Apertou os olhos para tentar enxergar a criatura que falava com ele.-Eu sou Newt Sacamander... Niffler é meu pelúcio. Eu o resgatei de uma rede de tráfico de Animais
Mágicos...

-Scamander...-Os olhos dourados se abriram e brilharam no breu do fundo da caverna.-Newton Scamander.

-Sim... Você sabe que eu sou?-Os olhos dourados se fecharam.-Espera! Desculpe, não faço mais perguntas se isso a incomoda. Não fiz por mal...

Niffler voltou correndo e agarrou o magizoologista pela barra da calça, puxando-o com todas as forças de seu pequeno corpo. Newt caminhou até onde o pequeno quis, ainda enfrentado aquela breu absoluto, sem saber o que espreitava na escuridão.

O pelúcio parou e começou a procurar algo na escuridão. Newt ouviu correntes extremamente pesadas se arrastarem e, por impulso, acendeu a varinha.

-Não!

Ele viu alguma coisa se esconder atrás de grandes pedras, mas algo ainda refletia dourado. Algo que escorria nas fissuras das rochas. Sangue.

Então viu as correntes, que Niffler ainda tentava arrebentar com as patinhas, choramingando.

-Oh, por isso está com tanto medo. Sua amiga foi ferida por pessoas muito más, Niffler. Ei, venha aqui. Sei que já arrebentou a outra ponta das correntes... Me deixe tirar os grilhões.-A criatura chegou a suspender a respiração.-Eu não vou te ferir. Só quero ajudar.-De forma muito oportuna, Um certo tronquilho carinhoso saiu de seu bolso.-Pickett! Que bom. Olha só, Niffler tem uma nova amiga que está com problemas. Você pode soltar ela?

O tronquilho entortou a cabeça, antes de Niffler saltar e pegá-lo, correndo para trás das pedras. Newt se sentou no chão duro, fazendo a pequena bolinha de luz flutuar a sua frente e guardando a varinha. Ouvia Pickett mexendo nos grilhões,que caíram um a um. Eram três. O terceiro, pelo baque, era mais pesado.

-Por que soltou algo que não sabe o que é?

-Diferente da maioria, eu sei que criaturas não atacam se não são ameaçadas. Os bruxos prendem, torturam, mutilam e aterrorizam criaturas mágicas, e quando elas se revoltam as chama de perigosas, fingindo não merecer as retaliações. Você está machucada, não é? Está sentindo dor?

-Estou...

-Então deixa eu cuidar de você. Eu trouxe algumas opções curativas simples e algumas ervas pra dor. Ao menos eu posso tentar melhorar um pouco os machucados.

-Não vai mesmo me atacar?

-Não mesmo! Você quer ficar com a minha varinha enquanto olho os machucados? Eu não me importo de entregar ela pra você.

Ele ouviu a criatura começar a se arrastar do outro lado das pedras. Se ergueu de uma vez só, de olhos arregalados. O ser parou, como se o movimento a tivesse assustado.

-Newt?

-Desculpe. Não precisa se mover, vai ficar pior. Deixa que eu vou até você.

Com cuidado caminhou até as pedras, começando a contorna-las. Não fez mais nenhum movimento brusco, até ter uma visão completa daquilo que estava lidando.

Era uma moça.

Na verdade, parecia uma moça. Mas tinha parte do corpo coberto pro escamas multi-coloridas. Os cabelos eram bem curtos e estavam tão sujos de sangue e fuligem que ele não conseguia identificar a cor dele.

Ela estava retraída, mas já não era medo. Parecia mais com vergonha.

Só então ele notou que eram meros trapos sujos de um tecido chucro que cobriam porcamente o corpo dela.

-Não...

-Está tudo bem. Não precisa ter vergonha de mim. Vamos, deixe-me ver seus machucados.

Escoriações, hematomas, cortes, queimaduras, vergões... E a lista só crescia. Ele ia precisar de outras poções para poder curar todos aqueles machucados grotescos.

-Newt...

-Eu não tenho poções o suficiente para tratar todos esses machucados. Mas posso aliviar as dores e depois buscar tudo o que eu preciso no acampamento. Não se preocupe, eu não vou trazer outras pessoas aqui, nem vou ser seguido.

-Aqui é perigoso...

-Aqui é seguro pra você ficar.-O bruxo, vez ou outra, mirava os olhos dourados, que estavam fixos em si.-Como é um lugar difícil de chegar e bem escondido na colina a chance de alguém vir parar aqui é... Quase nula. Agora, madame... Se me permite, eu vou cuidar desses machucados.

Newt transfigurou uma bacia, enxeu de água e diluiu uma poção limpadora. Pegou um lenço limpo e começou a limpar os machucados com todo o cuidado, evitando causar mais dor.

Depois disso passou toda a pomada cicatrizante que tinha nos cortes e queimaduras mais grotescos, para que começasse a fazer efeito. Conseguiria outras em suas coisas no acampamento, e talvez pedisse algo a Aberfort. O Dumbledore mais novo era realmente bom com poções.

Ele se entregava naquilo até a chuva passar. Foi até o acampamento na calada da madrugada, pegou tudo o que podia e ainda pediu algumas coisas a Aberfort, que dividia a barraca consigo, e voltou para a caverna.

Newt não se preocupou em avisar o irmão. Apenas disse a Aberfort onde encontrar o cemitério de dragões. Lançou um feitiço de desilusão na entrada da caverna, apenas para ter certeza de que teria a paz necessária para cuidar de sua nova descoberta.

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