A COLINA MORTA PARTE 1

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   No alto da sombria colina Morta se erguia solitário um grandioso pé de mangueira. Sua frondosa copa composta por galhos retorcidos e agourentos, sussurrava doces melodias, quando açoitada pela sorrateira brisa noturna. Os olhos de incautos viajantes que se atreviam por aquelas vicinas desoladas, freqüentemente eram atraídos para a magnânima figura que lhes acenava imponente e convidativa no limiar alto da visão. Muitos se diziam encantados pela estranha arvore, chegando a se reter minutos sem fim a admirá-la em seu dançar constante e hipnótico; outros ao vislumbrarem por relance os três obeliscos sob sua sombra tomados por um medo súbito se arrepiavam ao encenar o sinal-da-cruz pondo-se logo em retirada. Mas nenhum deles podia sequer imaginar tamanha danação que pairava ao redor daquele tronco antigo e amaldiçoado.

  O solo seco e rachado, não permitia qualquer indicio de vida nos limites da Colina Morta. Talvez por isso os velhos moradores do local há tivessem apelido de tão bizarro nome. Colina Morta. Talvez fosse por isso... Mas nenhum nome cairia melhor para aquela protuberância de terra estéril e fraca, cujas plantas não encontravam nenhum mineral para se fortificarem, Cuja vegetação se negava a florescer, cujo solo permitira a infiltração de tão maldita forma de vida. Era notório o espanto ao se apreciar aquele ambiente todo castigado e desprezado pela existência, contrastando com o arvoredo que crescia belo e frutífero, sem qualquer sinal de problemas. Era estranho. Os mais velhos apontavam tal fato a obras malignas e demoníacas, os mais novos sem explicação aparente diziam que aquilo era um fenômeno a ser estudado. Mas sem sombras de duvidas, todos, sem exceção escondiam um medo literal ao abordarem aquele curioso assunto. Principalmente o qual envolvia a assustadora história do velho David.

  Muitos camponeses assustados fugiram durante a noite carregando suas famílias no interior de carroças apertadas, deixando para traz suas casas vazias e abandonadas ao receber tão demoníaca noticia. A alarmação foi geral, se espalhando como praga e incumbindo os moradores de medo e terror. Pobre do David. Aquele homenzinho que se fazia amável e respeitável sendo incapaz de cometer mal a uma única mosca, compactuando com tal atrocidade; não se fazia possível acreditar. Com certeza haveria mais coisas por trás daqueles obscuros fatos em que meras mentes humanas jamais seriam aptas a compreender.

  Eram meados de junho de 1857. Um frio incomum assolava a região, castigando a plantação de milhos com geadas furiosas e ventos avassaladores. Os habitantes, meia dúzia de famílias espalhadas por sítios vizinhos em casebres de madeira e sapê enfrentavam problemas graves com doenças respiratórias e gripes constantes, que afligiam principalmente as crianças e os homens mais velhos.

  Com David não era diferente, Fátima sua filhinha de sete anos sofria com extremas crises de bronquites nas noites geladas, respirando sofregamente em busca do ar que lhe faltava. Ervas medicinais e rezas eram tudo com o que podiam contar para amenizar o sofrimento. Aquela região era afastada de tudo. Não havia médicos por perto. Muitos doentes já haviam morrido em busca da cidade mais próxima, que ficava a cerca de setenta quilômetros dali. David se mostrava bastante preocupado com a sua menina que inúmeras vezes havia chegado ao ponto de ficar roxa sobre a caminha improvisada de madeiras, esperneando com lagrimas nos olhos. Aquele barulhinho rouco escapando de seus pulmões atravessava como flecha a mente atordoada de um pai impotente. Mesmo quando o homem se encontrava na lida com a plantação, seus pensamentos acompanhavam a menina. Todos tinham a certeza de que David era um homem honrado e amava a família mais do que tudo no mundo.

  E foi num sábado qualquer, em que David havia ido a missa buscar proteção divina, que ocorreu o bizarro fato. O padre Ozório, um senhor gentil e agradável, celebrava o culto numa capelinha decadente, com imagens de santos em que as faces haviam sido completamente manchadas pelo tempo e as más condições. A igreja adornada por uma cruz quebrada em seu telhado furado, se encontrava na rua principal do vilarejo, ladeada pelo pequeno mercadinho e um bar fétido abarrotado de beberrões inúteis que gritavam e brigavam o tempo todo enquanto entornavam a água ardente.

A COLINA MORTAOnde histórias criam vida. Descubra agora