Vira-Tempo

Prólogo

Harry sentiu o vento lhe tocando suavemente o rosto, o clima estava mais ameno do que o de costume e predominantemente calmo, sem a presença de grandes nuvens que pudessem atrapalhar a visão do céu que ainda possuía tons azulados em pastel. Estava uma bela tarde em clima agradável em Wiltshire, perfeita para se aproveitar a hora do chá que se aproximava.

Mas ainda assim, os olhos verdes intensos cobertos pelos aros redondos das lentes corretivas do óculos não apreciavam a bela vista daquela tarde, mas sentia ganas de voltar atrás na sua decisão de ter aceitado aquele convite para uma conversa, que sabia que remontaria lembranças da qual ele ainda não sabia responder se estava preparado para ter.

Suas mãos suadas escorregaram para dentro dos bolsos traseiros de sua calça jeans, enquanto sua jaqueta de couro fazia um barulho incômodo com a movimentação. O grifinório estava na parte bruxa do sudoeste da Inglaterra, em frente aquela construção que, mesmo com o passar de dois anos ainda se erguia assustadora fazendo descargas de arrepio percorrer pelo corpo do moreno na mesma medida que lembranças desagradáveis invadiam sua mente.

Harry constatou que ainda odiava aquele lugar e ele não era muito de odiar as coisas. Mas sua mente ficou em branco quando aqueles imensos portões de aparência desgastadas rangeram no ato de se abrirem e os olhos verdes do adolescente capturaram a imagem de longos cabelos bicolores perfeitamente ajustados, apesar do vento leve que fazia e o corpo da senhora Malfoy emoldurado por um vestido preto e longo, cobrindo-lhe quase que o corpo inteiro, ele bem sabia que ela ainda mantinha um estado de luto mesmo após um ano do final da guerra.

Com a imensidão dos jardins verdes e da grande mansão, Harry achou que Narcissa Malfoy se tornava extremamente pequena diante desses detalhes e parecia crescer apenas poucos centímetros enquanto ele avançava pela larga estrada que separa os portões da entrada da Malfoy Manor.

O tempo parecia se arrastar até que ele tivesse de fato uma visão da mulher à sua frente. O vestido era liso de detalhes, cobrindo-lhe até abaixo dos joelhos e adornando seus braços com longas mangas. Ela calçava um salto pequeno e suas mãos estavam repousadas em frente ao ventre magro. Os grampos pretos em seus cabelos cobriam as partes loiras repuxadas para trás, criando um enorme destaque. Ela mantinha uma pose totalmente ereta e aristocrática como devia ser ensinada desde nova, estava deveras impecável e bonita apesar de tudo.

Se Potter não soubesse identificar a dor e o vazio, iluminados pelo fraco sol daquela tarde nos olhos azuis da mulher a sua frente, poderia jurar que era uma senhora com vida feliz e recheada de luxúria, como sabia que foi em algum momento do passado.

— Boa tarde, Senhor Potter. - Harry notou que aquele era um dos tons de voz mais polidos e bonitos que teve o prazer de ouvir em sua vida. Era melódico, apesar de formal. — Entre, vou lhe preparar um chá para uma boa conversa. - E um sorriso doce adornou os lábios finos e pouco avermelhados de Narcissa. Acima de elegante, parecia uma mulher gentil. Entrando após um cumprimento silencioso por sua parte, Harry suspirou ao perceber o quão diferente as aparências eram da realidade.

A aparência externa da mansão não deixava dúvidas quanto ao imenso número de cômodos enormes que deveria existir internamente. E Harry já estivera uma vez mesmo que não em uma ocasião agradável dentro daquela construção sóbria e bela.

Mesmo que não achasse, Potter percebera naquele momento sua capacidade para memorização visual uma vez que comparava as paredes em tons negros e sombrios de outra época com as extremamente claras naquele momento, dando um ar de graça e limpeza ao ambiente de hall de entrada. Talvez todas as impressões sombrias que tinha eram derivadas da situação de sequestro que havia passado, mas outra coisa que havia notado naquele momento era a ausência completa de móveis ou objetos de decoração.