Capítulo 01 - Emmy

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Faz 6 anos que eu danço, dança para mim é como uma âncora para um navio, me dá suporte e faz com que meus problemas sumam enquanto danço conforme a melodia.
Quando eu tinha 13 anos minha irmã e mãe faleceram. Desde então, venho sendo acompanhada por uma psicóloga, descobrimos juntas o poder da dança em mim, o seu feito em minha mente, minha libertação dessa vida.

Agora estou dançando na minha audição para uma vaga em Juilliard, se estou nervosa? Não. Por incrível que parece quando estou dançando mesmo que diante de uma plateia ou em frente a um espelho, sinto a mesma coisa, só as notas e minha pulsação. Todos os passos que tanto memorizei vem rápido  quando a sinfonia começa, meu coração bate rápido, meus pés se movimentam, meu corpo se entrega e minha mente se concentra em cada movimento.

Quando a sinfonia acaba, estou suando e respirando aceleradamente, olho para o jurados que agora estão fazendo anotações em seus bloquinhos. Concordam e sussurram. Faço uma pequena reverência de agradecimento e saio. O resultado sai daqui 3 semanas. Mal posso esperar. Juilliard é meu sonho desde que tudo desandou na minha vida. Espero que se eu passar, minha alma encontre certa paz.

Depois de me vestir, pego meu casaco marrom que vai até metade das minhas coxas, presente de Alisson, minha melhor amiga. Abro a porta de saída e sou pega desprevenida por um ventinho gelado, a rua está bem movimentada.
Nova York é realmente bem agitada para pessoas como eu que gostam do sossego. Fui criada em Sant.Antoni uma cidade da Califórnia, uns 60km de Los Angeles. Lá é bem sussegado, fica mais balado no verão ou quando Los Angeles recebe as bandas do momento. Graças ao meu peculiar gosto para os clássicos, prefiro ficar longe, bem diferente da Ali.

Agito meu braço para um táxi que vem em minha direção. Ainda bem que ele para e consigo entrar.
- Qual seu destino ?. Me pergunta um senhor que aparenta uns 60 anos.
- O aeroporto John F. Kennedy. Preciso chegar bem rápido, meu vôo parte em 2 horas. Sorrio rapidamente e ele concorda já arrancando com o carro.


                                                                                5 horas depois:

Após pegar minha mala, ando até chegar em um local cheio de pessoas esperando os que desembarcam, procuro Alisson rapidamente mas então eu a vejo e sorrio, corro até ela e é muito reconfortante abraçá-la.

- Garota que saudade que eu senti ! - Alisson fala aos pulinhos e eu rio. 

- Também senti Ali - A abraço outra vez e pego minha mala, começamos a andar de braços dados. O estacionamento está bem cheio, mas o carro de Ali logo apita quando ela o abre. Me sento no banco do passageiro e suspiro passando aos mãos pelos cabelos.

- O que foi? Nervosa com o resultado? - Ali pergunta segurando minha mão.

- Sim, você sabe o quanto é importante para mim.  Além disso, vou ficar muito decepcionada, isso é minha vida e Juilliard é incrível, o campus é lindo, até me imaginei caminhando por lá. - Ali me encara com os olhos sorridentes e me abraça.

- Emmy ! Todo mundo que te ver dançar vai ter um dia ganho por que o que você faz é incrível, você põe a alma nisso, se aqueles jurados não verem isso eu chuto a bunda de cada um. - Ela gargalha e eu faço o mesmo, quando Alisson dá partida no carro, o clima está leve e tenho certeza que não importa o que aconteça ainda tenho Ali.

O caminho para casa é tranquilo, demoramos cerca de uns 50 minutos até em casa, moro com a Ali e sua família desde que minha mãe... bem, vocês sabem. Na casa dos Percy eu tenho um quarto grande e confortável, a casa têm dois andares e a família sempre me tratou muito bem. Os pais dela me tratam como uma filha e Ali virou minha irmã. Somos muito unidos e a segurança que me passam é uma bolha que me protege de coisas ruins, como meus pensamentos.

Alisson estaciona na garagem e eu saio e pago minha mala azul do porta malas. Abri a porta da sala e já sinto um cheirinho bom no ar, sei que é torta de maçã, minha favorita. Sou pega de surpresa por um abraço de urso e gargalho, pelo cheiro de canela com certeza é Patrick, meu pai adotivo. 

- Papai não faça isso, vai me derrubar - continuo rindo da cara cômica dele e ele ri junto comigo. 

- Desculpe filha mas eu estava com saudade, aliás como foi em Nova York ?- Carol me abraça por trás e eu viro para abraçá-la também. - Oi mãe, que saudade. - Nós 4 nos abraçamos mas então me dão espeço para eu contar as novidades.

- Foi simplesmente surreal, Juilliard é sensacional, e quando eu dancei foi... não tenho palavras para descrever. - Todos se olham e entusiasmados e concordam.

- Imagino que tenha sido mesmo, agora que tal subir e tomar um banho quentinho para relaxar ?- Carol sempre sabe do que preciso.

- Têm razão, preciso mesmo de um. - Faço menção de cheirar o sovaco e querer desmaiar, fazendo todos rirem. 

Subo as escadas carregando a minha mala, caramba por que tão pesada? Chego ao meu quarto e começo a desfazer as malas, dobrando as roupas perfeitamente em cada gaveta. Após isso, pego uma blusa regata branca e um shorts e vou direto para meu tão sonhado banho. Rapidamente o box fica embaçado e eu começo a desenhar nele. Meus pensamentos vagueiam e vagueiam.

- Sai da minha frente sua vagab***a- Sou jogada com força na parede e vejo meu pai correr atrás da minha mãe, mesmo com uma dor intensa corro até ele e pego seu braço.

- Não faça isso, por favor. - Eu imploro, me contorcendo com a lágrimas, mas não sou ouvida, eu ganho um tapa forte no rosto. Caio e vejo minha mãe contra a parede, fecho os olhos, Meu Deus eu sou uma covarde, ouço seus gritos mas eu sou carregada para fora.

Acordo no meu quarto e vejo borrões, sinto algo subindo pelas minhas pernas, sinto meu corpo reagir com repulsa, minha camisola é tirada lentamente e minhas lágrimas escorrem, isso não é bom, nada bom. Sinto algo se debruçar contra mim e viro o rosto. Se eu ignorar talvez não aconteça. Mas isso não ocorre.

Uma dor forte me atinge e grito mas uma mão tampa minha boca com violência, meu corpo vai e volta, até o corpo cair contra o meu tremendo. A pessoa se vai depois de me dar um beijo na testa e agradecer. Choro como se a água do meu corpo pudesse acabar, fico com tanto nojo que decido dormir no chão.

Estou no chão do box tremendo, respiro forte e choro angustiada, me levanto e começo a me esfregar com força, nesse momento me sinto imunda, sempre me sinto assim quando as lembranças voltam.  Doe tanto lembrar, doe saber que foi por alguém que eu queria que me amasse e cuidasse de mim. 

Me visto e passo um pouco de maquiagem para disfarçar a cara de choro. Ao abrir a porta do banheiro, vejo Ali deitada na minha cama. - Uau você demorou. - Ela fala entendiada e volta a mexer no celular, dou de ombros mas me viro rápido para Alisson quando ela começa a gritar e pular na minha cama. 

- Tá louca? Para com isso, vai quebrar a minha cama! - Mas não adianta ela pula da cama e me segura forte. - Consegui os ingressos para o show do CNYC e na primeira fileira !- Ela grita como uma adolescente histérica e rio da sua expressão.

-Que bom, eu vou ficar e ler um pouco. - Ela faz biquinho e diz - De jeito algum, to querendo esses ingressos faz muito tempo, você vai comigo sim !

- Ali eu não gosto do CNYC, você sabe disso. - Alisson vai até a porta e vira para mim- Vou te convencer  e vai ser a melhor experiência da sua vida.

Não vou ser convencida Alisson.


Head's under waterWhere stories live. Discover now