Afya

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A mais bela das filhas do rei. Aos quinze, seu pai deixou que escolhesse presente.

- Quero aprender a cuidar dos doentes e trazer crianças ao mundo.

- Filha, não há pedido mais absurdo para uma nobre. Não pode pensar em outro presente?

- Nada mais faria sentido!

- Pois bem, que seja feito!

A rainha sorriu, feliz com a decisão do marido. Orgulhosa da filha.

Afya aprendeu sobre ervas e nascimentos. Durante três anos passou tempo na companhia das avós da aldeia. A mais jovem entre mulheres sábias. Causou algum constrangimento, mas era querida e prestativa. Seu povo se acostumou com a nobre curandeira.

Num fim de tarde, Afya voltava para casa com ervas frescas. Não era mais a velha vila. Um amontoado de gente desesperada corria para se salvar. Casas destruídas, animais mortos, desolação por toda parte. Cheiro de morte e de escravidão, aromas que se irmanam...

Os reis do povoado, farrapos ensanguentados que puxavam a fila dos acorrentados, em nada lembravam as figuras altivas que governaram durante tantos anos. Afya os avistou. Não resistiu ao impulso de gritar pelos pais. Foi agregada à fila.

O ritual de venda foi rápido e insípido. Grupo de novos escravos para lá, marfins e temperos para cá. Depois, a cela escura. Através da fresta por onde recebiam mingau ralo e água suja e malcheirosa, Afya viu o inferno chegar. Ele metia medo. Era grande. Trazia toda a escuridão em si. O inferno pode ter muitos nomes. Mas esse se chamava Caridade, a galeota que acabara de aportar em Luanda.


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