CAPÍTULO UM

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Há milênios, houve uma grande batalha nos céus entre aqueles que aceitavam a existência da raça humana, e aqueles que os abominavam por causa da inferioridade de sua criação, já que estes, por conta de sua fragilidade, recebiam mais atenção e cuidados. Dois poderosos Arcanjos, deram início a batalha que terminou com uma terça parte do Corpo Celestial, lançados a terra. E como punição por sua inveja e rebeldia, eles foram amaldiçoados, tornando-se em parte, como aqueles que eles mais desprezavam.

Ao atravessarem o Véu Celestial, suas características angelicais, imediatamente foram modificadas. E como pequenas esferas de fogo, eles entraram na atmosfera terrestre, chocando-se violentamente contra o solo terreno. E foi nesse momento, que perceberam sua transformação, sentindo na própria carne, o peso de sua maldição.

Em suas entranhas, algo que eles não sabiam explicar os incomodavam; uma sensação nunca antes sentida. Suas armaduras, antes forjadas a partir da mais pura luz, foram completamente consumidas pelo fogo, deixando-os inteiramente nus; suas anatomias, antes indefinidas, agora se mostrava dividindo-os entre machos e fêmeas. Tal qual os humanos a quem eles tanto odiavam.

Munidos de fúria e ódio por terem se tornado iguais aos humanos, eles correram pelo deserto árido seguindo o cheiro daqueles que lhes causavam repugnância, até chegarem ao primeiro vilarejo que encontraram. Sentindo uma sede insaciável, a qual para eles não tinha explicação, fincaram seus dentes pontiagudos direto na jugular daquelas criaturas inferiores que não tinham forças sequer para se defender. E ao beberem de seu sangue quente, sentiram o alívio que suas entranhas ainda não tinha encontrado. Aquilo que os incomodavam, se chamava sede. Então, a partir daquele momento, fizeram do sangue, o seu alimento.

Muitos porem, mesmo bebendo o sangue, não encontraram alívio para o que os incomodavam. A ira os consumiu por completo, levando-os a despedaçarem suas vítimas; arrancando seus membros, abrindo seus corpos da jugular até o abdômen, deixando suas vísceras à mostra. Com ódio e desespero, seguindo apenas seus instintos como animais selvagens, devoraram os órgãos internos daqueles que não tinham a menor chance de escapar da morte. Finalmente, o terrível incômodo que sentiam em suas entranhas, foi aliviado; aquilo que estavam sentindo, mesmo sem saber, era fome. Foi a partir daquele momento, que fizeram das vísceras, o seu alimento.

E quando o mais velho entre eles, sentindo-se aliviado ergueu os olhos para os céus, sentiu em seus músculos a grande força que irradiava da maior esfera que brilhava no céu naquele momento. Então, lembrou-se da morada de seu Pai, para onde talvez, não fosse mais digno de retornar. Ele deu um brado, tentando pronunciar um pedido de perdão, pois tudo o que mais queria naquele momento, era voltar para os braços de seu Criador. Porém, assustou-se com o poderoso som que saiu de sua garganta; um uivo tão potente e lamentoso, que chegou a abrir uma pequena fresta que riscou o céu, fazendo com que seu lamento, chegasse aos ouvidos do Pai. Presenciando aquele pequeno, porem significante acontecimento, todos que estavam ali presentes, e até os que ainda se encontravam espalhados pelo deserto, fizeram o mesmo.

Imediatamente, ao ouvir o pedido de perdão e o doloroso lamento de seus filhos, o Criador de todas as coisas, decidiu perdoá-los. Mas como consequência pelo que fizeram aos humanos, consumindo sua carne e seu sangue, todos seriam castigados. A mando de seu Pai, o poderoso Arcanjo Gabriel, revestido de esplendor e glória, irrompeu o Véu Celestial; pairando acima deles no ar com sua Espada da Justiça em punho, e sua dourada e reluzente armadura de batalha, mostrando todo o seu poder, os sentenciou.

— Nosso Pai, o Criador de todas as coisas, ouviu os seus lamentos; e como bom Pai que é, decidiu perdoa-los. Porém, por toda a dor que lhe causaram ao tirar a vida de nossos pequenos irmãos, todos vocês serão punidos por seus atos, antes de retornarem para a morada de nosso Pai.

— E qual será nossa punição? — perguntou o mais velho e imponente daqueles que sentia fome.

— Para aqueles que se saciaram da carne dos humanos, se tornarão como os lobos selvagens, tomando sua forma quando a lua mais cheia e brilhante, irromper nos altos céus; e assim, transformados em feras selvagens, vocês viverão até o raiar do novo dia. Sentirão a dor de seus ossos se quebrando na transformação, assim como a dor que infringiram nos humanos quando os dilaceraram. E entre eles, vocês ficarão conhecidos como, Lobisomens.

Gabriel fez uma pausa, encontrando com o olhar, aqueles que se alimentaram do sangue humano. Então, continuou falando:

— E vocês, que encontraram alívio ao consumir o sangue dos humanos, como as criaturas da noite que se alimentam de sangue, vocês se tornarão. E assim como os morcegos temem a luz do sol, vocês também a temerão; pois arderão em chamas queimando até os ossos, se expostos a luz da maior e mais brilhante estrela do céu. Assim como os morcegos chupadores de sangue, vocês terão o sangue frio. E serão conhecidos entre os humanos como, Vampiros.

— E quanto tempo durará nosso castigo? — perguntou o mais velho daqueles que foi o primeiro a beber do sangue.

— Até o dia de sua morte terrena — respondeu Gabriel.

— Então, não será muito tempo, visto que agora viveremos como eles — Assim, deduziu o bebedor de sangue.

— Não pensem que será tão rápido — continuou Gabriel. — Vocês foram amaldiçoados, tendo que suportar viver com a mesma anatomia dos humanos, no entanto, seus corpos não herdaram a mesma fragilidade deles. E mesmo que não sejam indestrutíveis, na terra, vocês serão imortais.

— Isso não é justo, os humanos são fracos. Nunca conseguirão nos destruir. Como nossa vida terrena chegará ao fim? Por acaso teremos que matar uns aos outros, nos caçar como inimigos? — perguntou aquele que foi o primeiro a pedir perdão.

— Logo vocês descobrirão quem será o seu predador natural — disse Gabriel, batendo suas enormes e esplendorosas asas, subindo aos céus. — Sejam sinceros em seus arrependimentos, e espero que aprendam a conviver em paz com nossos pequenos irmãos.

A carnificina sessou naquela noite, tão logo Gabriel desapareceu atravessando o Véu Celestial, metade dos amaldiçoados sofreram a dor de sua primeira transformação. E em sua forma de lobos selvagens, correram para as montanhas, procurando ficar o mais longe possível dos humanos. Já aqueles que não foram transformados, ficaram olhando estupefatos, porém, nada podiam fazer, aquele era o castigo imposto por seu Pai.

Enquanto os muitos lobos uivavam no alto das montanhas, a metade restante dos amaldiçoados, começaram a se transformar em grandes morcegos de olhos vermelhos. O peso de sua maldição os fez chorarem de arrependimento, e tão grande era a dor que sentiam pelo que tinham feito, que suas lágrimas se tornaram em sangue; o sangue vertido de seus irmãos. A imensa nuvem de morcegos, encontrou abrigo nas cavernas montanhosas, e lá, procuraram permanecer, longe da presença dos humanos.


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⏰ Última atualização: Jan 11, 2019 ⏰

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Os Amaldiçoados do Templo SagradoOnde histórias criam vida. Descubra agora