O espaço vazio na cama é o espaço que você nunca vai preencher, é o meu braço que nunca vai doer porque você nunca vai estar deitada sobre ele, é meu colchão que você nunca vai aquecer. O que me faz pensar sobre isso é que hoje é domingo, e toca Rubel, porque você me apresentou ele ontem. É que está anoitecendo, e o céu fica bonito quando decido compará-lo com os teus olhos negros. Tem toda uma confusão de pensamentos rodando na minha mente e todos meus impulsos elétricos terminam em você.
Teu cheiro ficou no travesseiro, porque você assistiu teu desenho favorito deitada nele enquanto a festa seguia na sala. E quanto mais as bebidas queimavam minha garganta mais eu pensava em como você é fogo, como me arde e como brilha tão forte sozinha. Mas tu não tá aqui, e agora já é noite. Ainda tem álcool na geladeira e a casa cheira cigarro, no banheiro tem o resto de uma carreira que esqueceram e imagino se não foi você quem a deixou lá, porque estava ocupada me dizendo que eu deveria me preocupar mais comigo mesma.
A questão é que olhar nos teus olhos e entender que você nunca vai estar aqui e que sua mensagem não vai chegar pela manhã é doloroso. Porque você, como luz, brilha e o estado normal do ser humano é buscar a luz, mesmo que não haja nenhuma garantia de que tu não vá me queimar e apenas aquecer. Talvez seja menos complexo e talvez a alucinação do álcool passe agora e eu perceba que tu nem é meu par perfeito e que as músicas que você gosta nem são as minhas favoritas. Talvez eu passe a achar que teu jeito de rir não seja minha sinfonia preferida e que teus olhos não são infinitos de estrelas caídas. Talvez eu comece a acreditar que você usa entorpecentes demais e que suas viagens pra dentro de si mesma não são as viagens que eu quero ter, que teu gosto pelos filósofos seja totalmente contrário a minha tendência ao niilismo e que há mais pessoas no mundo que eu preciso conhecer.
É sobre seguir o que você me disse e me preocupar mais comigo, porque não importa o quanto eu me doe, você nunca vai ceder. Porque eu sou a amiga que você encontra nas festas mas não se preocupa com como eu voltei pra casa e se cheguei segura. É sobre todas as coisas que eu sinto e sobre o quão profundamente fui capaz de cair nos teus jogos e sobre o quanto eu nunca vou poder amar por dois. É principalmente sobre como você nunca vai saber de nada disso porque a sobriedade me impede.
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joguei as cartas fora
Non-Fiction"joguei as cartas fora" é um compilado de textos e cartas que eu escrevi enquanto estava morando sozinha numa cidade longe da minha família e vivendo meu caos interior dos pés à cabeça. O final da adolescência e o começo da vida adulta é aterrorizan...