Enquanto eu nem olhava direito naqueles olhos de cobra, fingindo extremo interesse e perícia em dividir as carreirinhas de pó, pensava em como me livrar dele, da presença dele, que não só por causa do esculacho, mas por causa da sensação de dualidade que causava em mim, eu queria manter o mais longe possível. Mas Louis, como eu ouvi o chamarem, estava sentado na mesma mesa que eu, e de repente, me vi fazendo piadinha com ele. Era bizarro como o PM não tinha medo de mim e parecia não ter de ninguém, será que ele achava que o peito dele era de aço? E por falar em peito, os três botões abertos da camisa branca exibiam o cordão de ouro que brilhava sobre as tatuagens coloridas, o qual o policial não tirava os olhos. Depois da minha pergunta de duplo sentido, ele deu um sorrisinho debochado, negou com a cabeça mas tirou do bolso uma onça e enrolou, abaixando a cabeça em seguida e dando um teco.
- Cordão bonito ein talibã! - ele disse esticando a mão e colocando os dedos entre o cordão e a minha pele, puxando um pouco. Eu fiquei imóvel, não dava pra acreditar que aquele baixinho era tão confiante e abusado, mas acabei gostando disso. Depois de quase quebrar a minha costela ele estava tocando em mim e nas minhas cosas. Sorri e assenti, olhando fixamente nos olhos dele enquanto levava minhas mãos para trás do pescoço e abria o fecho, deixando a corrente de metal cair nas mãos dele. - Experimenta aí o 18k, vê se fica maneiro. - meu tom foi tão arrogante quanto, ostentando um cordão que custava pelo menos dois salários dele. E ele colocou, e ficou lindo, mas instantaneamente eu senti tanta raiva que enrolei minha nota de cem e dei dois tiros, erguendo o rosto com agressividade e passando a mão abaixo do nariz.
- Quer um, herói? - o chamei desse nome que seria usado muitas vezes em muitos contextos de forma extremamente provocativa enquanto tirava um cigarro do maço. Lambi a ponta dele e passei nos rastros de pó, antes de colocar na boca e acender. Provavelmente ele entendeu, mas me ignorou com naturalidade e colocou o cordão no próprio pescoço, bem quando uma das garotas da Zona Sul que era viciada e curtia baile, se aproximou. Ela era filha de um ex governador e agora deputado federal e se chamava Penelope. Aquele nome me lembrava o desenho Corrida Maluca, e ela também, já que era loira e frequentemente usava brilhos e roupas bem atraentes. Pepê, como era chamada pelo pessoal, era linda, gostosa e tinha uma arrogância atraente, porém, às vezes eu notava o quanto ela visitava a favela do mesmo jeito que visitava um zoológico. E era por isso que ela tinha gamado em mim, não por isso, mas pelo modo como eu a comia com raiva, como eu a tratava como puta na cama e não como a princesa que ela era quando estava no asfalto.
- Qual é, talibã? Vamos dançar meu gostoso... - ela chamou com o dedo e um sorrisinho extremamente sexy. Ela usava maquiagem demais, mas eu já tinha a feito suar o suficiente pra ver as sardas tão desejáveis que tinha por baixo daquilo tudo. Dei mais um tiro e passei o cigarro pela metade, dando um longo trago enquanto me levantava. - Dá um tirinho aqui cachorra, pra gente ir pra pista. - eu mandei, e ela se aproximou e cumprimentou Louis com um sorrisinho e um beijinho no rosto, que foi recíproco, assim como a atração de um pelo outro. Foi o suficiente para que eu grudasse meu corpo na bunda empinada dela e esfregasse o volume marcado na loira, apesar dos meus olhos estarem fixos no segundo tenente com uma expressão de tesão que eu não sabia identificar o motivo. E ele, com aquele sorriso que eu já estava cansado de achar uma definição especial, me olhou de volta, sustentando o olhar, só sendo cortado pelos cabelos loiros de Pepê quando ela se levantou.
Segurei na mão dela e a puxei pra pista, girando a loirinha até ela ficar de costas pra mim de novo, rebolando enquanto eu sarrava na bunda dela e apertava sua cintura. Alguns baldes de Antarctica e o som do batidão estourando no nosso peito me deixou mais animado. Puxei os cabelos dela, a trouxe para um beijo e levei a mão até o meio da saia da loira, quando percebi o que eu jamais esperava. Meus lábios estavam na curva do pescoço da patricinha, chupando as sardas clarinhas ali, quando entre as coxas dela toquei uma mão masculina que não deveria estar lá. Ergui o rosto a tempo de ver uma das luzes do baile iluminar de azul o rosto do PM que ousava meter a mão entre as pernas da minha mina. Minha reação foi tão brusca e rápida que arrancou um gemido dela. Ergui a mão que não estava segurando em sua cintura e puxei Louis pelo meu cordão, que não arrebentou, mas ele deu uma gargalhada, uma gargalhada tão gostosa que me fez dar um tapa na cara do moreno.
- Caralho Zaca, tu vai arrumar treta com P... - ela ia me repreender, até que ele devolveu o tapa, e eu puxei os cabelos de Louis para trás, com a garota no meio dos dois, se esfregando e sendo esmagada entre os corpos que não mais lutavam, apenas tentavam se impor um ao outro cheios de tesão. - É mesmo, talibã...isso já não deu certo hoje, a gente pode pular isso e... - o funk estava muito alto mas pude ouvir as palavras dele também serem interrompidas por um puxão das unhas felinas de Pepê para que o rapaz a beijasse. Vi aquele beijo e senti meu caralho pulsar dentro da cueca, mas não, aquilo não ia ficar assim. Simplesmente meti a mão nos cabelos dela, assim como no meu cordão que ainda estava no pescoço do menor, puxando os dois e arrastando pelo meio do baile, nem me importando com quem ia me ver com a filha do ex governador e um PM da UPP subindo a ladeira com violência.
- Você gostou de ter a mão do bota no meio dessas tuas pernas né, cadela? - esbravejei, sacudindo o cabelo dela ignorando seus gritinhos antes de jogar os dois contra o portão de ferro que dava acesso a minha lage. - FILHO DA PUTA ABUSADO DO CARALHO! Se tu acha que vai ter major que vai me fazer não te passar, teu cuzão do caralho... - eu estava puto, puxando ele pelo cordão e ignorando os socos fortes no meu peito, nem sentia mais dor, só adrenalina, enquanto eu praticamente rosnava isso a menos de um centímetro do rosto de Louis. Eu não sabia exatamente o que ele tinha tomado, só sei que senti a mão do moreno no meu pescoço e a língua dele invadindo a minha boca. Ele era louco, completamente maluco. Será que ele queria me desmoralizar na frente da menina? Mas tinha se fodido se fosse. - Ah então é isso que tu quer, viadinho? Tu quer que eu foda você né? Todo riquinho de olho azul adora uma pica de favelado mesmo... - disse, revertendo a situação e fazendo a loirinha sorrir e lamber o meu rosto, me fazendo arrepiar e pensar que realmente a gente ia fazer uma sacanagem, e aquilo ia ser estranho de manhã.
Isso se o primeiro tiro não tivesse atingido um poste e dado uma explosão. O batidão continuou mas agora os outros tiros e os gritos me fizeram soltar os dois. A gente estava no ponto mais alto do morro e oposto ao que vinha os tiros. Tirei a chave e abri o portão, empurrando os dois para subirem as escadas antes de eu entrar. Subi e olhei pra trás duas vezes, só pra ver as pessoas berrando e correndo pra todos os lados, igual uma manada descontrolada. Estavam atacando o morro. Meus soldados já estavam armados e cada um se posicionou num ponto pra atirar de volta. Peguei um fuzil também e joguei um para o segundo tenente, se ele tava ali ia ajudar ou ia levar bala. - Piranha, entra e se esconde! - disse, antes de começar a atirar de volta, sentindo meu coração apertar a cada morador e até soldado do CV que caía com os tiros da facção que queria tomar meu território.- Esses alemão safado vão pra vala ou então eu não mereço a porra do meu nome! - eu estava louco de ódio da porra da ousadia dos caras de tentarem subir. Eles começaram os tiros do morro do lado mas tinha soldado tentando subir. Deitei dois, mas disperdicei muita bala. Louis ajeitou a calibragem do fuzil e deitou cinco, me deixando ainda mais puto e gastando munição à toa. Apesar disso, os caras desceram e recuaram. Duas ou três horas de tiroteio e estratégia e a gente sobreviveu. - Ô tenente, fica com a mulher que eu vou recolher o corpo de quem foi hoje com a rapaziada. - disse, soltando o fuzil no chão e descendo a escada. Ele protestou, queria ir junto, o que me fez dar uma longa olhada no moleque metido e abusado que agora estava se oferecendo pra se arriscar só pra dar um enterro digno pra aquela gente da minha comunidade. Mas fechei o portão com cadeado e saí, com duas pistolas no cós da calça e um nó na garganta.
Era foda encontrar com uns baleados, outros que perderam parente e amigos, os caras desesperados, eu também tava, mas tinha que dizer alguma coisa, e sempre dizia pra eles ficarem de pé. - Se todo mundo tava aqui era porque era responsa. A gente vai ver irmão indo morar com Deus todo dia, mas não vamo esmorecer não, vamo levar o corpo pra casa deles e...e vamo retaliar amanhã. - minha voz era dura mas a ponta do meu natiz já estava vermelha. Arrastei corpos, vi mães gritando e chorando, uma criança tinha morrido e um adolescente, além de mulheres com balas perdidas. Eu não sabia quem tinha tirado a vida daqueles moradores, pode ter sido bala minha ou de alguém do nosso lado, e essa vida miserável pesou sobre as minhas costas mais do que jamais tinha pesado.
Apesar de não ter levado nenhum tiro, voltei pra minha casa com gosto de sangue na boca e lágrimas nos olhos. Já eram pra lá de quatro da manhã, fechei tudo e parei um minuto apoiado na mureta da minha lage, olhando pro asfalto lá embaixo. Uma lágrima escorreu do meu olho e eu dei um soco no chapisco de cimento, arranhando minha mão, mas logo virei as costas e desci os degraus de pastilhas que davam pra minha porta. Ela estava trancada, então abri com a minha chave e entrei silenciosamente, fechando devagar. Coloquei a chave e as pistolas debaixo da almofada do sofá, tirei a camisa suja de sangue que não era meu e a calça e deixei no chão mesmo, indo pro quarto, onde o PM dormia de conchinha sem roupa com a minha mina. Não senti raiva, nem orgulho nem nada, só consegui perceber o quanto o lençol delineava a bunda perfeita dele, e então me deitei, encoxando Louis e ficando ali, sentindo o cheiro dele, notando no escuro o brilho em seu pescoço e percebendo que ele tinha comido Pepê usando o meu cordão de ouro.
VOCÊ ESTÁ LENDO
ᐅ Blindado ᐊ
Fanfiction"Hoje Deus anda de blindado, cercado e protegido por dez anjos armados" Enquanto um rapaz de olhos azuis e morador de condomínio se corrompe com o arrego da polícia corrupta do Rio de Janeiro, um chefe do tráfico do crime organizado tem um problema...