Eram três da tarde porém o céu cinzento passava a impressão de ser, no mínimo, seis e alguma coisa da tarde. Trovejava um pouco — nada muito espalhatafoso, mas o retumbar tímido marcava presença entre as nuvens pesadas. As gotas de chuva escorriam pelos vidros de todas as janelas do corredor pelo qual Haknyeon passava e, do lado de fora, o Ju podia ver a grama do jardim encharcada, assim como os bancos dispostos pelo pátio do colégio e a cobertura do ginásio mais ao fundo. Em sua mão havia uma pequena caixa branca envolta por uma fita vermelha; o tecido de cetim formava um laço no topo, decorando o presente de forma delicada e precisa. Ninguém o questionava sobre o embrulho, uma vez que quase todos os alunos estavam bem acomodados dentro de suas salas, talvez almejando que o último sinal tocasse logo, diferente de Juhaknyeon, que só queria chegar ao seu destino intitulado como •favorito• desde o primeiro dia em que colocou os pés naquela instituição: a biblioteca.
Por pouco o clima não era igual ao de exatamente onze meses atrás, quando trocou a primeira palavra com Sunwoo naquela mesa redonda de madeira lustrada. A diferença era que agora toda a vergonha e hesitação que o menor guardava haviam sido substituídas por um certo sentimento de culpa, enquanto não devesse carregar sozinho o peso deste.
A verdade era que, por mínimo motivo, Juhaknyeon não gostava de se desentender com o namorado, pois nunca conseguia impedir que um aperto doloroso abraçasse seu coraçãozinho. Ele ficava triste, extremamente, e não era algo com que pudesse ou gostasse de lidar.
A pequena discussão ocorreu há menos de quadro dias atrás, ocasionada pela falta de tempo livre do casal. Com provas finais e vestibulares chegando, tanto Sunwoo quanto Juhaknyeon ficavam, por vezes, imergidos na pressão característica que acompanhava tal fase da vida acadêmica de qualquer estudante, e o estresse afetou suas mentes cansadas a ponto de fazer descontar as frustrações um no outro. Em resumo, trocaram algumas farpas e acusações que não tinham a intenção de trazer à tona se não fosse pelo curto momento de reviravolta com a vida em geral, e não se falaram mais desde então. Agora, Haknyeon se encontrava desolado. Tamanho era o arrependimento por ter explodido com Sunwoo, embora o maior também tenha explodido consigo, e seu maior desejo era consertar as coisas o quanto antes.
Afinal, como podia ver seus animes preferidos — aprendeu a gostar deles por pura influência de Sunwoo — se não tivesse seu namorado para servir de travesseiro e dar beijinhos em baixo dos cobertores? Viver num mundo em que isso não era possível soava como uma tortura para Juhaknyeon, a pior de todas.
Diante das pesadas portas duplas da biblioteca — um lado delas estando fechado e outro entreaberto —, o Ju soltou o ar dos pulmões em uma lufada curta e entrou devagar. Por não haver mais ninguém no âmbito espaçoso e taciturno, a atenção de Sunwoo foi rapidamente elevada ao livro de biologia que descansava sobe o balcão de madeira para seu rosto, mas o loiro não contemplou seus traços por muito tempo antes de voltar a baixar os olhos para as páginas repletas de textos e desenhos sobre células embrionárias. Depois de ter sido claramente ignorado, Haknyeon soltou um novo suspiro e se aproximou do rapaz.
— Você ainda está bravo? — perguntou, apesar de a resposta ser um tanto óbvia, e deu a volta no balcão. A caixinha foi colocada sobre um banco desocupado ali perto; logo, o Ju estava lado a lado com o namorado que permanecia em silêncio. — Desculpa, Woonie — pediu, quase que em um sussurro, os olhinhos carregados de um brilho genuinamente redimido e carente; o ponto fraco de Sunwoo, só para ressaltar.
— Está chovendo e você não precisa mais de aulas extras de geografia — comentou, Sunwoo, ainda sem deixar de fitar o livro. Por mais que tentasse soar seco, a preocupação em em sua voz era evidente. — Devia ter ficado em casa, para não correr o risco de pegar um resfriado.
— Talvez se eu pegasse um resfriado você começasse a me dar atenção de novo.
O acastanhado, então, parou de fingir que estava lendo e colou as orbes escuras nas do mais novo, lançando seu melhor olhar de advertência.
— Não se atreva a fazer gracinhas, Ju Haknyeon — avisou.
— Mas é que eu sinto sua falta — o outro resmungou e seus lábios se esticaram em um biquinho adorável, derretendo o pouco de gelo que ainda restava no coração de Sunwoo. — Sabia que hoje faz onze meses que eu te chamei para sair pela primeira vez? É injusto que fique sem falar comigo logo hoje.
A primeira coisa que veio à cabeça de Sunwoo assim que acordou pela manhã foi justamente aquele fato. Nunca poderia se esquecer da tarde em questão, e só não dizia que ela havia sido a melhor da sua vida porque, duas semanas mais tarde, em outra tarde semelhante, trocaram o primeiro beijo em frente à praça localizada a duas quadras de distância do colégio.
— Eu aceitei seu convite e nós decidimos ir ao cinema e depois ao parque — comentou, sorrindo fraco, deixando as lembranças ensolaradas tomarem conta de seus pensamentos. — Eu passei a adorar clichê depois desse dia.
— Eu sempre adorei — Haknyeon puxou as mangas da blusa — que por acaso •pertencia• a Sunwoo, do verbo •não pertence mais• —, cobrindo suas mãos frias. — Mas confesso que passei a amar de verdade no dia em que você me pediu em namoro, naquela ponte — riu junto com o mais novo. — Aquilo foi a coisa mais clichê que eu tive o prazer de ver.
— Acho que nós passamos tanto tempo lendo livroa assim que virou um hábito
— Mas combina com a gente.
— É... Combina.
Ficaram em silêncio por alguns segundos, com os olhos perdidos em pontos aleatórios da ampla variedade de livros daquela biblioteca, até que Haknyeon voltou a se pronunciar:
— Você vai aceitar minhas desculpas?
— Não tenho que te desculpar de nada, amor, pelo contrário — a voz de Sunwoo, agora, soava terna, apaixonada como de costume. — Fui eu quem perdi a cabeça primeiro, você só respondeu.
— Mesmo assim.
— Vamos só esquecer isso, tudo bem?
— Tudo bem — Haknyeon abriu um sorriso largo e se virou para pegar a caixinha. — Eu trouxe chocolate.
Eram os bombons favoritos de Sunwoo, recheados com calda de morango e pedacinhos da própria fruta. Uma mordida e o mais alto suspirou, de olhos fechados, absorvendo a melhor combinação de sabores do mundo depois dos lábios de Haknyeon. Se juntasse os dois, então...
— Você ainda não me deu um beijinho hoje — disse, fazendo um biquinho na direção do menor. O último, engoliu o doce e selou os lábios alheios por um cinco ou seis segundos, mas, antes que pudesse se afastar, as mãos de Sunwoo foram encontro aos dois lados do seu rosto e o beijo ganhou profundidade, lento, açucarado, perfeito. — Amo você, moranguinho — sussurrou. O mais velho riu do novo apelido, o associando tanto ao gosto da sua boca quanto aos seus fios rubros recém tingidos.
— Também amo você — sussurrou de volta e puxou o namorado para outro beijo, ouvindo a chuva cair com violência ao lado de fora enquanto os trovões riboravam com um pouco mais de força e o vento soprava entre as árvores frondosas, ruidoso.
À sua maneira, era mais uma tarde perfeita, e disso nenhum dos dois podia discordar.
♡
VOCÊ ESTÁ LENDO
LIBRARY. sunhak
أدب الهواةJuhaknyeon ia à biblioteca do colégio todos os dias, ora para ler seu livro, ora para observar o quão bonito era o aluno voluntário que ficava atrás do balcão. 𝗈𝖻𝗋𝖺 𝗈𝗋𝗂𝗀𝗂𝗇𝖺𝗅 𝗉𝗈𝗋 © btwyuta, 2018.