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Os faróis marítimos são pontos de referência para navios e embarcações que navegam pelo grande oceano. Eles os ajudam a se situarem pelas águas, encontrarem um porto seguro e acharem suas rotas novamente.

E em um desses faróis vivia o pequeno Jeon Jungkook. De todos os lugares que haviam no mundo, todas as paisagens para se admirar, todos os sons da natureza que pudessem deliciar seus ouvidos, eram dali que vinham suas preferências. Dali conseguia ouvir as ondas do mar quebrando nas rochas em baixo das janelas, as gaivotas vinham lhe dar bom dia e o cheiro gostoso do mar fazia carinho em seu nariz.

Mas a parte favorita de morar ali, Jungkook diria, definitivamente não era seu pai. Não, ele não. O homem era muito rabugento e complicado, o pequeno não gostava de ficar perto dele.

A melhor parte eram as conchinhas que moravam na areia grossa da praia, bem pertinho da água. O menino saia descalço pelo caminho bonito entre o farol e o restante da paisagem, sentindo os grãozinhos entrando entre seus dedos e vinha procurando aquelas "pedrinhas" por aí, colocando tudo dentro da cestinha que fazia com a própria blusa no corpo, ou então no potinho cor de rosa da cozinha - quase nunca lembrava de pega-lo.

Passava horas fora de casa, coletando o máximo de conchas para sua coleção, sempre fugindo quando as ondas tentavam apanha-lo e cantando uma música baixinho. Não sabia direito o que a música queria dizer, a mãe cantava para si antes de dormir. Ela parecia uma princesa com aquela voz linda, os cabelos bem escuros e o rosto quase que esculpido por anjos. Ela era um doce - tão doce que o mar se apaixonou por ela e um dia a pegou para si e nunca mais devolveu - essa história seu pai lhe contava sempre. Jungkook não se lembrava muito dela, mas a música recordava direitinho e estava sempre na ponta da língua para que pudesse cantar quando saísse em sua busca.

E foi em um desses dias um pouco quentes, onde a areia fica bem morninha e o mar não tão gelado que Jeon repetia o refrão da canção enquanto pegava uma conchinha pequena e lilás, que seus olhos capturaram um movimento entre as ondas, longe de onde era raso. Os dedos deixaram a concha voltar ao seu lugar e ele ajeitou as costas, franzindo a testa enquanto tentava enchergar o que vira à princípio.

E como um bicho assustado, aquilo sumiu. Mas além de assustado, o que quer que aquilo fosse parecia curioso também, então apareceu novamente na superfície molhada, agora um pouco mais perto.

E Jungkook pôde ver que era um garoto.

- Oi..? - não teve medo, por isso não se afastou, apenas continuou ali, observando e sendo observado de volta.

O menino lhe mostrava apenas o rosto do nariz achatadinho para cima e se aproximava muito lentamente, parecendo analisar Jungkook com um receio cada vez maior. Quando o viu sorrir, seus olhos ficaram apertadinhos e ele tirou a cabeça da água, mostrando que sorria também.

- Vem brincar comigo - o pequeno Jeon chamou e se sentou na areia, deixando as conchinhas ao lado de seu corpo e batendo com a mãozinha no lugar ao seu lado.

O menino continuou vindo em sua direção, o corpo se encolhendo cada vez que saia mais da água. Sua pele brilhava na luz do sol, cheia de escamas clarinhas e seus cabelos eram loiros e estavam grudados no rosto. Ele tinha pernas bonitinhas um pouco gordinhas e os dedos eram unidos por uma fina merbrana, como um peixe. Entretanto não foi nada disso que chamou mais a atenção de Jeon.

- Você tá pelado!

Vendo-o ficar corado e cobrir o rosto com as mãos, envergonhado com o que vira, voltou para a água depressa, sumindo entre as ondas.

- Não... - lamentou-se triste, levantando-se e correndo até ficar com água nos calcanhares, parando por aí porque não sabia nadar. - Não precisava ir embora...

Ficou ali, olhando a espuma branca das ondas trazer e levar consigo várias conchinhas mas elas nem eram tão importantes para ele agora. Queria mais o amigo novo que fizera.

Um biquinho se formou em seus lábios e ele cruzou os braços, chateado.

- Não faz cara feia. Eu já voltei.

O menino surgiu novamente das águas, agora vindo para perto de Jungkook mais rápido, o fazendo pular de susto. Não estava mais nu, agora tinha algumas algas enroladas em seu corpo como um short que parecia confortável.

Os dois meninos permaneceram se encarando, se reconhecendo e sorrindo um pouco com a curiosidade que os rondava. Eram duas crianças de mundos completamente diferentes, de aparências diferentes porém eram tão iguais.

- Como você se chama? - Jungkook perguntou, enrolando um dedo no outro atrás das costas, tentando engolir sua timidez.

- Jimin. E você?

- Jeon Jungkook. Eu tenho dez anos.

O loiro lhe analisou novamente. Não tirava os pés da água em nenhum momento.

- Jeon Jungkook de dez anos, pode cantar de novo aquela música que estava cantando antes?

Surpreso com a pergunta e começando a ficar com vergonha, o menino assentiu e se sentou na areia novamente, vendo Jimin ficar um pouco sem reação antes de tomar lugar na sua frente, as ondas batendo em sua costas enquanto as pernas dobradas balançavam como asas de borboletas.

Jungkook limpou a garganta e sorriu antes de começar a cantar.

E Jimin o escutou em silêncio, fechando os olhos a cada palavra as vezes desafinada, sentindo a melodia daquela música da qual tinha tanta saudade encher os seus ouvidos. Lá embaixo, no fundo do oceano, não tinha nenhum som além do farfalhar de barbatanas e era tão bom escutar uma canção depois de tanto tempo.

Jungkook permaneceu olhando seu rosto quando terminou, notando os olhinhos fechados e o formato do maxilar. Seu novo amigo parecia um anjo.

- Você veio do céu?

- Anh? - o loiro abriu os olhos.

- Você parece um anjinho, você veio do céu?

Jimin piscou algumas vezes e franziu o cenho, confuso.

- Você não me viu saindo da água?

- Eu vi, mas...

- Eu não entendi porque me perguntou isso então.

- E eu que não tô entendo nada? - Jungkook disse para a própria camiseta molhada.

- Eu acho melhor ir embora. - Jimin levantou-se e virou para a água, envergonhado e confuso. Aquele menino era estranho.

- Não!

Foi a primeira vez que alguém como Jungkook tocou alguém como Jimin. Não foi nada demais, apenas a mão do moreno segurando na pele escorregadia dele. Mas as coisas especiais nunca são "demais".

- Você não viu minha coleção de conchinhas ainda... - embora tremendo um pouco pela sua ação, não se moveu mesmo sobre o olhar do loiro que caia sobre si.

Não se sentiram estranhos nem quando se tocaram pela primeira vez, nem quando aprenderam um pouco um do outro numa curta conversa, nem quando a canção de Jeon foi cantada por novamente, na verdade, nada daquilo parecia estranho.

Era só um garoto que surgiu do mar e um que catava conchinhas fazendo amizade.

Era só um jeito do destino fazer o oceano e a terra criarem um amor puro.

Shells in the ocean [jikook]Onde histórias criam vida. Descubra agora