Memento Mori

IV

Assim que termina de comer Junior começa a falar durante longos quinze minutos o motivo de ter terminado e tudo que tem feito nesses 6 meses que estávamos afastados, sei que tudo o que está fazendo é para me distrair mesmo que esteja se segurando para não tocar no assunto mais temido, após uma longa pausa em sua fala eu falo:
"Ele me beijou!"
"Quem?"
"O Lucas, ele me beijou!" digo em voz alta, mais pra mim do que pra Júnior, não consigo acreditar no que aconteceu em tão pouco tempo e preciso reafirmar várias vezes para me dar conta, quando Junior diz, quebrando a série de afirmações em minha cabeça:
"Como você está se sentindo em relação a isso?"
"como estou me sentindo? ah, eu não acredito que você está me perguntando isso..." digo com uma pequena risada irônica.
"Sim, eu sei que você não está bem, mas falar sobre isso pode te ajudar"
"Me ajudar? Sabe o que pode me ajudar? Que as pessoas parem de me abandonar, que todo mundo deixe de ser tão filha da puta e egoísta, e que parassem de me procurar quando estão triste por um término ou com um tesão passageiro.."
Sei que peguei pesado com Junior, que fica olhando para o chão sem dizer uma só palavra, sinto um alívio por ter falado o que queria e consigo continuar mais calma.
"Olha, eu só estou muito cansada, recebi a visitas de dois fantasmas do passado, fantasmas esses que eu considerava muito e foram embora da minha vida sem pensar duas vezes..."
Junior levanta a cabeça e vejo uma expressão sincera de arrependimento, eu o conheço bem o suficiente pra saber que minhas palavras o atingiram de um jeito não tão bom, mas sei que, para que eu considere que ele volte a ser meu amigo é importante que ele saiba que não é tão simples.
Ele levanta de onde estamos sentados e sussurra um "vou te levar pra casa" que quase não consigo ouvir.
O silêncio reina dentro do carro durante um tempo até que Junior diz
"Olha, eu sei que você está brava comigo, mas também sei que você está precisando de um amigo, eu não vou te deixar sozinha, não hoje..."
Como uma mensagem divina minha mãe me liga e diz que o voo que ela e meu pai estavam esperando fora cancelado e que passariam a noite em um hotel. Eu convido Junior para dormir em minha casa já que não me sinto tão confortável dormindo sozinha e por maior que seja a raiva que estou sentindo dele, ele tem razão em dizer que não devo ficar sozinha.
Assim que chegamos, eu preparo o sofá para ele passar a noite e deixo as coisas para ele tomar banho, sem muita conversa solto um "boa noite" e subo pro meu quarto, onde tomo um longo banho e me deito, na esperança de dormir mas a única coisa que de fato acontece é que fico imersa a pensamentos do passado, juras de amor e a felicidade que sentia quando estava com Lucas...
Sem a minha percepção o dia começa a raiar, e só depois que o sol entra por minha janela é que consigo cair no sono, como se ele tivesse vindo para aquecer minha alma depois dessa noite.