"Isso não é nada, ele não é nada"

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  Juh e eu entramos na escola e fomos recebidas pelo recado da nova diretora nos altos falantes da escola, anunciando que todos os alunos deveriam se apresentar no pátio principal para cantar o hino nacional. Não sei porque eles acreditam que isso magicamente fará nascer um senso patriótico nos alunos, mas era obrigatório então nós fomos com relutância.
- Aff, essa nova diretora mal assumiu e já tá tacando o terror.
- É nem me fale, tomara que ela não remova as mudanças colocadas pelo grêmio. Tipo não ter que usar uniforme ou fila dupla na cantina.
- O que aconteceu com a antiga mesmo? Nath? Tá ouvindo o que eu tô falando? - Por um minuto as coisas instintivamente pararam, as pessoas e seus devidos sons silenciaram-se em um ato involuntário até ele chegar... E foi como se o sol finalmente tivesse  decidido aparecer iluminando seus olhos, o ventou soprou uma brisa leve em seu rosto, como uma onda amiga na areia da praia. Naquele momento ele foi como um sonho do qual eu não queria acordar... Bom demais pra ser realidade, tudo dentro de mim gritava em reprovação e eu mesma não pude entender os sintomas físicos que isto causou em mim... Isso é ridículo, isso não é nada, ele não é nada.
- Nath?!
- Oi! - Gritei e estranhei sua reação quando seu olhar se manteve fixo em um ponto por segundos demais... - O que você tá olhando?
- Aquele deus grego bem ali, eu sei que você viu! - Disse dando uma risada tão boba que me fez rir também.
- Tá e o que? Ele é só mais um garoto bonito, e daí?
- Hãm! Olha com quem ele tá indo falar...
- Que? Luís?
- Hahahahah - Ela gargalhou em alta voz em um tom sarcástico que não precisou de uma resposta. Mas se calou quando os dois começaram a vir na nossa direção...
- Oi gente - Falou o Luís no tom amigável de sempre. E embora eu não quisesse nada com ele, não pudia negar que era muito bonito.

 Eu, Juh e ele somos amigos desde a oitava série, eu o amo como um amigo, mas as coisas se tornaram estranhas desde que ele disse que gostava de mim

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Eu, Juh e ele somos amigos desde a oitava série, eu o amo como um amigo, mas as coisas se tornaram estranhas desde que ele disse que gostava de mim. Quer dizer, como assim gosta de mim? Como alguém da nossa idade pode gostar de alguém dessa forma? Eu estou sendo paranóica? Ele é meio "popular" joga no time de futebol da escola e muitas garotas dão em cima dele. Sinceramente não sei bem como uma pessoa como eu se tornou amiga de uma pessoa como ele, somos definitivamente o oposto um do outro. Mas o mais importante, como alguém como ele se interessou por alguém como eu?
- Esse é o Manuel.
- O-Oi - A Júlia respondeu meio acanhada enquanto eu provavelmente encarava algum lugar das longas filas que se formavam...
- Oi.. E quem é essa? - Ele espiou o ponto que eu tanto encaro, mas mesmo assim não foi o suficiente para me desprender dele.
- Não vai falar seu nome? Nath? Natalia!
- Qual foi a pergunta? - Acordei num estalar de dedos, e um leve incômodo surgiu por eu forçar as vistas, dificultando eu retornar por completo a realidade e distorcendo um pouco o foco das coisas.
- Bom agora ele já sabe haha - Disse Juh tentando quebrar o gelo.
- Enfim... Esse é o Manu meu amigo, eu conheci ele num jogo de futebol interescolar uma vez e por coincidência ele acabou de se mudar pra cá.
- Num jogo de futebol? - Perguntei incrédula.
- Ih agora babou... - A Juh sussurrou prevendo uma catástrofe estilo Catrina... - É provavelmente um idiota. - Falei enquanto ele me olhava sem conter meu hábito de ironizar e gesticular. Eu já conhecia bem o tipo, a maioria dos garotos que faziam parte do time eram assim. Ocos. Sem nada de valioso por dentro, como uma dessas frutas que só prestam por fora. - Ah, não, não, não se ofenda. A maioria é.
Antes que alguém pudesse dizer qualquer coisa, foi avisado o ínicio do hino, nos viramos e ficamos parados em nossas respectivas filas. Antes de sair sorri torto, e me surpreendi ao vê-lo fazer o mesmo. Afinal o que foi aquilo? Eu sou a única que pode ser debochada aqui meu bem, puf, novato.
Após o encerramento do hino, que aliás foi reproduzido duas vezes por gracinhas de gente do terceiro ano, finalmente poderíamos ir pra aula, ou pensamos que poderíamos. A direção pediu para que os alunos se reunissem ( como se já não estivéssemos reunidos) para orar, rezar, ou seja lá no que cada um acreditasse, por um aluno que passaria por uma cirurgia de risco naquela tarde. Geralmente eu não apoiaria demonstrações em grupo de uma determinada religião em uma área escolar, onde muita gente provavelmente não sabe no que acreditar. Mas achei justo, refleti sobre isso enquanto via o bufar dos ateus e a animação dos católicos. Os evangélicos apoiaram a causa de uma maneira que pareceu tão natural que nem tenho muito o que dizer. Como se não estivéssemos abordando o assunto religião, mas realmente pedindo por alguém que precisava, me senti bem com isso. Tudo ia bem até pedirem para que formassemos um grande círculo, que ficou parecendo mais com um ovo, e déssemos as mãos. Não consegui não imaginar que a maioria daquelas pessoas nem tinham lavado as mãos. Eu não me acho maníaca por limpeza, simplesmente não consigo ignorar o fato de que essas pessoas provavelmente tocaram em lugares, cumprimentaram mais pessoas, se coçaram, talvez tenham espirrado, aí não gosto nem de pensar...
Eu estava pessimista delirando sobre a mão que eu teria que segurar por alguns minutos e até cogitei me retirar, mas isso pareceu errado, considerando a causa nobre. Eu senti um toque especial na minha mão direita e quando liguei o braço ao corpo era ele, como uma premonição meu corpo se arrepiou bem antes  do olhar chegar a cabeça.
Ele me olhou, bem fundo nos olhos, me admirando... ou mais possivelmente tentando entender porque o chamei de idiota na cara dura. Vai saber.
Quando havia terminado senti receio de soltar minha mão, ele a segurava com tanta segurança que era como se já o tivesse feito antes. Ele encarou nossas mãos quando as de todo mundo já haviam se soltado, e depois subiu seu olhar diretamente até os meus olhos. Ele a soltou bruscamente.
- Relaxa, não sou tão idiota assim. - Arregalei os olhos de leve, ele sorriu torto, um sorriso sarcástico e conveniente. Puf, sorte dele que tem um sorriso bonito. Não espera, o quê?
 


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