III - Perfeitamente no lugar;

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É engraçado como nos sentimos nervosos e ansiosos perto de algumas pessoas a ponto de gaguejar, suar frio e desejar ser abduzido por macacos marcianos ao passo que com outras ficamos tão a vontade que parece que conhecemos aquela criaturinha do bem por uma vida toda, mesmo que só tenhamos descoberto seu nome há pouco tempo - meia hora, para ser mais específico. Tem gente que te inspira dor de barriga e a vermelhidão de um tomate, e tem gente que te faz ficar relaxado e falar sobre o que te der na telha, sem medo de passar uma imagem errada, afinal quem é que está preocupado com imagem? Com certeza não você. E certamente nem a pessoa em questão.



- Gosto de pôr uma caixinha de creme de leite quando tá quase pronto. - Ela falou com um ar de cozinheira profissional vencedora do MasterChef Brasil.

- Ah, já fiz isso, fica bom mesmo. Mas não costumo usar porque dá mais trabalho.

- Pelo amor de Deus, larga de ser preguiçoso, o creme de leite é o toque final do brigadeiro! Cria juízo, garoto. - Agora ela falava como uma mãe que não podia acreditar que seu filho amado se tornou um monstro que não põe creme de leite no brigadeiro.

- Quanto exagero! E achei que o toque final fosse granulado. - Falei dando de ombros como se fosse óbvio, ao que recebi uma cara de interrogação como resposta.


O movimento na rua era fraco e por isso conseguia ouvir com clareza tudo que ela dizia. Não havia nada para desviar minha atenção, e pra ser sincero, poucas coisas conseguiriam realizar esse feito.

Seus cabelos eram ondulados e possuíam um tom castanho claro, enquanto os olhos eram escuros, quase negros. Por baixo da jaqueta jeans, vestia uma blusa branca com pequenas estrelas pretas dispostas aleatoriamente pelo tecido, e isso fazendo par com uma calça preta escura e tênis brancos. Todo esse conjunto estava distribuído em um corpo de 1,70cm de altura e que naquele momento, estava todo desajeitado e contorcido, procurando uma posição confortável na calçada dura e que, diga-se de passagem, não oferecia nenhuma possibilidade de se tornar minimamente confortável. Mesmo assim a garota ao meu lado - Malu, descobri a pouco - estirava uma perna enquanto gesticulava sobre "o risco de extinção das girafas e sua relação com a caça esportiva", para logo em seguida puxar a perna de volta e estirar a outra.

Quando saímos do apê do Ian já era quase meia noite e por isso não havia muitas opções do que fazer, então apenas sentamos no meio fio e conversamos.


- Escuta essa. - Malu se segurava para não rir enquanto direcionava os olhos cheios de expectativa em minha direção. A piada ia ser horrível, não restavam dúvidas. - Por que o Batman colocou o batmóvel no seguro?

- Sei lá.

- Porque ele tem medo que Robin! Entendeu? ROBIN! Ele tem medo que - E antes de concluir a frase desatou a rir feito uma completa louca, com direito a lágrimas e mãos envolta da barriga. Era desconcertante. E vergonhoso.  E engraçado. Muito mais engraçado que a "piada", por isso quando me dei conta já tinha sido contaminado pelas risadas histéricas e estava daquele jeito ou pior.

- Tem outra, tem outra. Calma. Ai. Eu não lembro, calma. Ai minha barriga. Okay lembrei. Se prepara. - Não havia como se preparar àquela sessão de horrores, mesmo assim assenti enquanto meu maxilar dóia de rir das risadas e excesso de autoconfiança da Malu. - Como o Batman dorme?

- Não sei, Malu.

- DE BRUCE! - Risadas. Muitas risadas. Da parte dela claro. - Por que não tá rindo? Você não entendeu? É que o nome do Batman é Bruce Wayne, aí ele dorme de Bruce. - E continuou rindo. Fiquei com certa pena dela naquele momento, parecia uma minhoca radioativa se contorcendo e vomitando, talvez até precisasse de ajuda.

- Essa não rolou. Tenta outra.

- Ah qual é? Essa é maravilhosa, você que é tapado.

- Mas eu entendi, só não achei graça. Tenta de novo.


O vento que batia na minha cara sem piedade tinha ficado subitamente agradável. Todas as coisas tinham ficado subitamente agradáveis. O chão duro da calçada onde estávamos sentados, as formigas que tentavam insistentemente entrar no meu tênis e o vazio do meu estômago resultante de apenas uma refeição decente no dia. De repente, tudo estava ótimo e perfeitamente no lugar.





Hoje teve mais um pq não aguentei de ansiedade, espero que gostem sz

ps. sempre que alguém vota e comenta, um Batman sorri :)

Todas as estrelas do céuOnde histórias criam vida. Descubra agora