Capítulo 1 - Catarina

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Os longos cachos de Catarina caíam sob sua pele escura. Embora o lado esquerdo de seu cabelo estivesse armado, a outra parte (e mais volumosa) caía até suas bochechas. A garota prontamente desligou o seu despertador, enquanto metodicamente levantava da cama e calçava os seus chinelos. 

Como toda manhã de segunda-feira, encarou o espelho enquanto deslizava suas mãos besuntadas de creme para cabelo, ela moldava delicadamente o cabelo junto à uma escova de pentear, que deixavam o seus cachos morenos bem mais definidos e levantados. Os castanhos olhos de Catarina, que só não tinham um tom mais adocicado do que as sardas que cobriam seu rosto, encaravam o seu concluído trabalho: um cabelo impecável. Ao sair do banheiro, desceu as escadas sem pressa, já que sempre acordava antes do horário previsto para poder ir para a escola. 

O colégio onde Catarina fazia o Ensino Médio era considerado um dos melhores de São Bento, levando até o nome da própria cidade. A garota, dotada de uma determinação implacável, conseguiu ficar em primeiro lugar na prova de admissão, sendo premiada com uma medalha pela antiga escola, que não tinha uma conquista dessas há muito tempo.

Assim que entrou na sala de estar, sentiu o cheiro de pão com manteiga na chapa, sem dúvidas uma maneira espetacular de começar o dia. Mesmo que para alguns o começo do dia seja a parte mais monótona e chata, sempre sendo repetitiva, Catarina gostava do pequeno momento que tinha com seu pai antes de voltar a mergulhar nos estudos e, seu pai, no trabalho.

-Bom dia, minha rainha - disse seu pai, enquanto fazia um cafuné na cabeça de Cat - dormiu bem? Vai ficar até tarde na biblioteca municipal de novo, ou vai prefere voltar e comer algo maneiro com seu pai? 

-Bom dia, pai! Acho que não dá para recusar uma proposta tão tentadora, acho que são coisas como essas que provam o quão você é um bom advogado. 

-Não diga isto, você sabe que a pior parte do meu trabalho é ter que ficar muito tempo sem te ver, dói o meu coração mole deixar minha filha sozinha em casa e não ter nem a oportunidade de assistir um desenho legal com ela - Anderson, o pai de Catarina, tem uma história ótima com desenhos animados, principalmente os que passavam no Cartoon Network antigamente. Assisti-los junto à Catarina realmente era um ânimo ao seu dia. 

O barulho do relógio de seu pai veio junto com as risadas que os dois soltaram, que se transformaram em uma silenciosa agonia. Anderson passou a mão na cabeça calva e foi em direção à porta, ainda com o pão na mão, pegou sua maleta e vestiu desajeitadamente o seu paletó. 

-Tenho que ir querida, melhor você ir daqui a pouco também. 

Catarina acenou com a cabeça, voltando sua atenção para o copo de achocolatado. Era só ela e seu pai. Embora a situação da maioria das famílias seja o inverso, Catarina nunca de fato conheceu a mãe, conhecendo-a apenas pelas histórias que seu pai contava. Ela não tinha nem mesmo uma foto. 

Durante o caminho para a escola, Catarina refletiu um pouco sobre sua mãe. Não costumava pensar tanto nela e, sinceramente, não ligava muito. Geralmente tais pensamentos sobre sua mãe só apareciam em datas específicas, como o dia das mães. Por algum motivo, entretanto, Catarina começou relembrar de algumas histórias que seu pai contava sobre sua mãe. 

Quando se deu conta, estava em pé na frente da sala de aula. Seu déficit de atenção realmente a tirava dos eixos as vezes, mesmo tendo um truque secreto contra isso. Toda prova ou atividade acadêmica importante, ou estudo, Catarina respirava fundo e fechava os olhos quando a desatenção atacava, ou as palavras embaralhavas. Ao terminar uma contagem de 10-0, conseguia voltar sua atenção para o que estava fazendo quase que imediatamente.

-Bom dia, Catarina. 

-Ah! Bom dia, Lauren. Como se sente hoje? - a garota pulou com o susto, despertando-a de seus pensamentos. 

-Bem, meio cansada, mas ainda bem. Tive algumas dificuldades fazendo a lição de física, você pode me ajudar com... 

Entraram enquanto discutiam sobre o plano de estudo do dia, não demorou para a aula começar. 

Depois de uma visita rápida à cafeteria (junto de Lauren), Catarina voltou para sua mesa, que agora tinha um pequeno pedaço de papel de caderno, um tanto amassado. Abriu o papel fazendo uma careta, com um claro desconforto no olhar. Sua expressão foi de incomodada com a situação, para surpresa, sua boca caiu de uma maneira devagar enquanto não acreditava no que lia no papel. 

"Eu posso descobrir quem é sua mãe. Catarina, se você está lendo isso, encontre-me na área de história antiga na Biblioteca Municipal.

Venha sozinha." 

As letras estavam apertadas e demorou um pouco para entender o que dizia na mensagem inteira, mas a primeira frase estava bem visível. 

-Tá tudo bem, Cat? O que é isso? - Catarina não se conformou em ter tomado outro susto, no mesmo dia, da mesma pessoa. Ao notar a presença de Lauren, colocou o pedaço de papel por de baixo de seu caderno.

-Não é nada, não precisa se preocupar. 

-Certeza? Estão sendo babacas com você de novo? Sabe que não precisa esconder de mim. 

-Não, não é nada de mais, eu juro. 

De fato, o ensino médio é uma das fases em que as pessoas nele são bem cruéis com as outras, principalmente quem não se encaixa em algum padrão da escola em que está. Como a escola de Catarina era formada por uma grande maioria branca e da alta elite, a aceitação dela não foi a das melhores. Entretanto, um dia Lauren deu uma surra em alguns garotos que tentavam assediar Cat (depois deles passarem alguns dias fazendo comentários maldosos sobre ela), após isso, as coisas esfriaram e esse tratamento acabou.

Lauren deu de ombros, ou pelo menos fingiu dar, voltando para sua carteira para aguardar a aula.

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A curiosidade é a ruína de alguém. Principalmente quando você sabe que as possibilidades de algo de ruim acontecer são altas, porém o que de fato motivou Catarina ir de encontro com quem enviou o bilhete foi porque a biblioteca é um local publico, mesmo que não seja tão movimentado as pessoas que trabalham lá dariam falta dela, afinal, ela os conhece de longa data. 

Seus pés batiam ansiosamente sob o carpete empoeirado da área de história, fazia tempo que sua ansiedade não atacava desse jeito. 

-Agradeço por aceitar o convite. 

Catarina encarava a figura à sua frente, dotada de roupas básicas e um longa capuz, parecia uma cena clichê de filmes de mistério. Ao tirar o mesmo, Cat deslumbra o rosto da garota, com seus cabelos platinados em um corte chanel com franja e um tapa olho de couro cobrindo seu olho esquerdo. 

-Sinceramente, achei que não viria. Antes de mais nada, devo adiantar algo. Eu não sei exatamente quem é sua mãe, também não sei se você se importaria o suficiente para isso. A razão de eu ter vindo falar com você foi por conta da galera que manda lá no retiro, caso contrário eu não viria de tão longe. De qualquer forma, você conhece as histórias gregas?

-Tipo Platão ou Sócrates? - a voz de Catarina tentavam disfarçar o nervosismo. 

-Não! A dos Deuses Gregos. Catarina, você é filha de um Deus, sangue do olimpo corre em suas veias.

O lábio de Catarina secou conforme a garota terminava sua frase, com um olhar intimidador e sério. Não parecia uma pegadinha, ao menos não tinha visto nenhuma câmera, tampouco parecia uma lunática qualquer que resolver encher o saco dela. 

O silêncio mortal e constrangedor se rompeu quando a garota foi ao chão, derrubando alguns livros que estavam sob a mesa. O máximo que Catarina viu foi um enorme vulto a derrubando, junto de um grunhido estranho.

Com as palmas das mãos suadas, Cat tentou verificar o que atacou a moça, suspirou em alívio ao ver quem era.

Era Lauren.

A Filha da JustiçaOnde histórias criam vida. Descubra agora