Capítulo 3 - Lucca

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Lucca fazia o habitual de cada noite. Sentado e encostado em uma árvore, não tão longe do Retiro, mas distante o suficiente para não ver ele em seu campo de visão. Mesmo que a região do interior de São Paulo não fosse tão frio quanto Taquara durante o inverno, ele gostava de sentir o calor de uma fogueira. As chamas douradas como seu cabelo queimavam em sua frente, ele gostava de sentir o calor vindo dela. Sua mochila era organizada o suficiente para acoplar o máximo de materiais de sobrevivência que fossem necessários, mesmo que não fossem tantas coisas para ele. Carne embalada em conservantes que recebeu do Retiro, sal, uma cuia, erva-mate, um machado para pegar madeira, um pouco de nectar, uma garrafa d'água térmica de 700ml, alguns panos e, claro, seus instrumentos que o permitiam arrombar fechaduras. Sua katana, que agora esculpia um longo pedaço de madeira, geralmente fica guardada em sua cintura, ao lado de uma boa e velha Glock G25.

Usar uma arma de fogo é algo incomum e impensável por um semideus "normal", porém Lucca costumava mexer alguns pauzinhos aqui e ali para conseguir armas. Quando os monstros que atacam e ameaçam o que ele protege são humanos, nada que uma boa bala na testa não dê conta do caso.

Com um o pedaço de madeira que esculpiu em um formato pontudo, Lucca perfurou um pouco da carne que guardava em sua bolsa, embebida em sal e azeite. Deixou que ela cozinhasse lentamente, lembrando dos poucos churrascos que teve em sua casa. Seu devaneio em meio ao cheiro de carne grelhando foi interrompido por alguns sons distantes. Os sentidos do filho do Deus Ladrão era aguçado o suficiente para perceber que alguém estava entrando no perímetro de seu acampamento improvisado. A escuridão da noite, apenas alumiada pelas estrelas, acabava impedindo que Lucca enxergasse com clareza quem estava se aproximando.

Subiu sua capa e tirou a Glock do coldre e cerrou a mão esquerda à Katana, esgueirou-se em meio a escuridão e quanto mais mergulhava nas copas das árvores, mais claro os passos dos invasores se aproximavam. Lucca ajoelhou-se atrás de uma das árvores e prendeu a respiração.

"Um pela direita, um pela esquerda e um no meio. Formação amadora, provavelmente são recrutas", pensou enquanto soltava lentamente a sua respiração, quando finalmente seus adversários passaram rente a ele, sem o notar. Todos usavam uma armadura leve e simples de couro, o do meio não tinha o capacete e uma parte de seu peitoral estava danificado. Analisando as armas dos oponentes, Lucca percebeu que não teria tantas dificuldades, já que a maioria eram espadas de prata olimpiana, provavelmente importadas. Embora aquelas armas fossem mortais para monstros no geral, eram de péssima qualidade comparada as armas do Retiro. Sem falar que em um combate, a Glock encerraria o serviço sem dificuldades.

-Nós vimos sua fogueira, apareça agora e mostraremos misericórdia para você e o Retiro. - exclamou o do meio, desembainhando sua espada. Lucca ria internamente da cena patética e típica de filmes medievais ingleses, mas com uma pitada de Mount Python, que era seu filme predileto da infância. 

Lucca disparou dois tiros em direção ao do meio, acertando em cheio sua perna esquerda. Isto fez com que o mesmo dobrasse o joelho oposto, dando oportunidade para o loiro se aproximar e dar mais quatro tiros, um na perna de cada um.

-Bah... vocês tinham que aparecer bem na hora que eu iria comer? - cuspiu Lucca para os corpos no chão, com seu sotaque gaúcho acentuado.

O gemido de dor dos três que jaziam no chão eram substituídos por um leve arfar, Lucca espantou-se ao ver parte das pernas de cada um deles lentamente se recompondo e regenerando. O loiro de um passo para trás quando viu as três figuras se levantarem. Seus olhares, implacáveis. Suas espadas investiram durante o momento de guarda baixa de Lucca, duas das espadas não alcançaram-no devido ao seu reflexo, mas a terceira foi em cheio na região da clavícula, deixando agora o filho da trapaça de joelhos.

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