Eram duas da manhã quando Márcio decidiu por seu plano em prática. Já havia fantasiado diversas situações e agora a fantasia não lhe dava mais tanto prazer. Queria ver o medo nos olhos de mulheres indefesas, amarradas, amordaçadas. Desejava ver sua ex-namorada nua, em um galpão abandonado e ouvir suas tentativas de gritar ao ser açoitada. Seu ódio pelas mulheres era tão intenso quanto seu desejo.
Metodicamente revisou seu plano e materiais necessários. Sentia-se no controle desde que aceitou seu lado perverso. O cara que bebia no bar até não conseguir mais andar e que usava a van como a um quarto de hotel não existia mais. Parecia um outro homem, possuído por sua sombra. Agora a vida fazia-lhe sentido. Havia um propósito finalmente, depois de anos de busca por uma razão para viver.
Deitou-se determinado a mudar sua vida para sempre. Amanhã seria "o grande dia". Mal conseguiu dormir ao revirar-se na cama entregue à loucura de realizar sua fantasia. Sentia a adrenalina só de imaginar como seria.
No dia seguinte acordou, levantou-se rapidamente e lavou o rosto. Tomou um rápido café como um soldado em uma missão urgente e saiu.
O dia passou lentamente enquanto ansiava pela noite. Não sabia se suportar a rotina era mais fácil ou mais difícil. Se não ter objetivos fazia o dia arrastar-se tanto quanto desejar seu fim para realizar sua fantasia. Odiar a vida e a si mesmo era a causa de trabalhar disperso, desatento. Neste dia não. Sua falta de atenção tinha outra explicação desta vez. Escolher uma vítima pode não ser tão fácil.
Busca inconscientemente a uma mulher bela e jovem.Talvez a alguma que lhe lembrasse a ex. Sentado a sua mesa, frente a um computador, estava cercado de mulheres vestidas elegantemente. Observava aquelas mulheres de salto alto com seus cabelos sedosos e narizes empinados, ao menos era assim que as via. Nenhuma parecia ser a vítima certa. Ele agora era um caçador e as leis não se aplicavam a ele, não mais.
Leis, regras, prazos... Havia se esgotado de tudo e ser um caçador proporcionava-lhe um novo olhar sobre a vida: viver todo o prazer que ela poderia lhe proporcionar sem temer as consequências.
Finalmente saiu do trabalho e foi para a faculdade. Não amava o curso que fazia, mas ainda assim pretendia ir até o fim. carregava o tema de terminar tudo o que começava. Talvez essa fosse uma regra que não estava disposto a desobedecer ainda. Da classe, era um dos alunos com melhor desempenho. Focado e esforçado bem como isolado, como uma ilha. Não cumprimentava as pessoas, todos pareciam usar máscaras. Tão falsos como Carolina que, num momento parecia ser a única que o compreendia e noutro, lhe virava as costas nos braços de outro.
Era fim de semestre e havia poucos alunos na sala. Muitos planejavam ir a uma festa a fantasia num lugar próximo. Ele a viu como uma bela oportunidade de encontrar a pessoa certa para seu momento macabro.
***
O interfone toca. Quando João olha pela janela, vê seu amigo acenando com um ar de empolgação.
_Nossa, sua fantasia é demais! - disse Lúcio ao ver o amigo vestido de Superman.
_ Você também não está nada mal!
_ Está pronto?
_ Sim, na verdade, só vou usar o banheiro antes. - João entra no banheiro e dá um último retoque no cabelo. - Vamos!
Os dois descem as escadas do prédio animados. Entram no carro de Lúcio e partem para a festa.
_Acho que a faculdade toda vai à festa.
_ Cara, acho que merecemos. Estou cansado de ler. Hoje eu quero é esquecer de tudo - diz João enquanto olha pela janela do carro, observando distraidamente a cidade que mostrava-se diferente a noite.
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O Profeta
General FictionUm cara comum tem sua vida completamente mudada por sonhos cada vez mais reais. Valeria a pena se arriscar pela vida dos outros?