O mesmo pesadelo. Sempre o mesmo pesadelo! Cada noite é um sucessão de imagens, cheiros, sons e cores funestos, cheiro de morte, sons das almas que caminham plácidamente em direção ao buraco que os levará ao meikai, portanto, ao inferno. Ox andava naquela fila sem conseguir fazer parar suas pernas. Elas não lhe obedeciam!
-Para, porra! Para, merda!- Dizia ele como se gritasse, embora nenhum som saísse de seus lábios. Era como se seu corpo não o obedecesse mais, a impressão era de que ele já não controlava mais seu corpo.
À medida em que ele se aproximava do cume da montanha do Yomotsu Hirasaka, ele pensava aflito para onde aqueles condenados em fila indiana estavam indo. Aquela fila sem fim era enorme, realmente não era possível saber onde começava. E aquele caminho parecia não dar em lugar nenhum. Ox sentia uma angústia, uma sensação de horror a medida que se aproximava do alto daquele monte, o que estaria ali? E como ele foi parar naquele local?
-Ei!- Gritou ele para um dos que seguiam junto com ele. Um homem andava na sua frente. Ox o cutucou, a pessoa à sua frente estava de costas para ele e não respondeu. Ox insiste de novo, fazendo um esforço enorme para mexer seus braços conforme sua vontade:
-Parceiro, qual é o do rolê? Para onde estamos indo? Que lugar é este?
Porém o homem à sua frente estava de costas para ele e o ignorava.
-Ô seu corno do caralho, eu tô falando com você, porra!
Ox reúne as suas forças e dá um empurrão nele, que mesmo assim, não reage e continua seu caminho. Ox com muita raiva começa a empurrar mais e mais, quando sente várias mãos e braços segurando todo seu corpo. Os mortos o seguram com muita força e Ox se desesperava, tentando se desvencilhar, mas parecia que quanto mais se debatia mais os mortos o agarravam. Era inútil fugir.
-Você agora é um de nós!- Gemia um.
-Se debater é inútil! Você é uma alma morta como nós!
-Venha! O mundo dos vivos não é mais o nosso lugar! Venha sofrer eternamente conosco!- Gemia outro.
-Calem essa boca! Que papo é esse? Eu estou MUITO VIVO, entenderam? Me soltem!-Ox se debatia mais e mais.
O grupo que carregava Ox para o cume do Yomotsu. Ox se debatia e gritava. Ao chegar no alto do monte, ele viu o enorme penhasco que dava para o nada.
-Chegamos, irmão. Eis o destino final daqueles que partem do mundo dos vivos!
Ao olhar para baixo, seus olhos se encheram de horror: Um enorme escorpião estava subindo o monte e com sua cauda assassina ia espetando as almas e as jogando do alto do penhasco. Ox queria gritar, mas era inútil. Nenhum som saía de sua boca. Ele via horrorizado o monstruoso aracnídeo o pegar com suas pinças e o destroçar...
Ele acorda assustado, o suor parecia cair de seus poros como uma cascata. Ox se levanta e se senta na cama. Ele passa as mãos na cabeça tentando acalmar-se. O quarto estava totalmente escuro, salvo alguns raios de luz noturna que entravam pelas frestas da janela. O quarto era simples. Apenas uma cama, mesa, cadeira e seu violão. Um baú pesado em um dos cantos continha suas roupas e poucos livros. A vida dos cavaleiros não era de luxo. Não havia televisão, rádio ou internet. Sequer havia sinal de celular. A vida rústica dos cavaleiros era repleta de humildade, o santuário ficava em Atenas, na Grécia e foi levantado pela própria deusa Atena, no alto de uma montanha, isolado do mundo. A cidade mais próxima, Rondorio, ficava mais de 15 quilômetros dali descendo a montanha. Do local era possível ver o oceano, e dava para ver os demais continentes bem longe, quase fora do campo de visão. A vida monástica dos cavaleiros era centrada em treinos diários, longos e puxados, e também aulas teóricas que incluíam grego, filosofia, matemática, astronomia, química, física, e idiomas. Homens e mulheres do mundo inteiro vinham todos os anos para se submeterem aos intensos treinamentos para se tornarem cavaleiros, mas a maioria morria ou desistia. Poucos, muito poucos realmente se tornavam cavaleiros.
Ox se põe em pé e sai dos seus aposentos para respirar. Ele sai e respira profundamente o ar fresco e frio da madrugada sentindo seu corpo acalmar-se. Suas mãos que antes estavam trêmulas, agora estavam tranquilas. Ele contemplava as imensas escadarias esculpidas em pedra que ligavam as casas zodiacais, onde habitavam os chamados cavaleiros mais poderosos do exército de Atena, a deusa da guerra. À sua frente, mais embaixo, ficava o coliseu, onde eram realizados os treinamentos de combate. Ox sentou-se em um dos degraus e ficou olhando. A lua estava cheia e a noite estava salpicada de estrelas.
-O que está fazendo acordado a essa hora?
Ox virou-se. Asclépio, o cavaleiro de ouro de Serpentário estava atrás dele. Asclépio tinha um aspecto calmo, sereno, era um homem bonito, gostava de se vestir com uma elegância discreta, tinha longos cabelos negros, era alto e de pele muito clara. Magro, mas atlético, e possuía uma voz gentil e pausada. Ele era o médico do Santuário e também um dos instrutores. Ele era considerado o homem mais sábio do mundo. Conhecia tudo sobre filosofia, astronomia, já tinha lido inúmeros livros e possuía um vasto conhecimento cultural.
-Você sabe- Respondeu Ox- Aquele maldito sonho de novo.
-Entendo.- Disse Asclépio- Tem certeza de que não quer conversar a respeito?
-Para quê?- O rapaz deu de ombros- Foi só um maldito sonho idiota. Não há nenhum significado transcendental nisso.
-Ox, você possui um cosmo muito poderoso, aliás, tão poderoso quanto o de sua mãe. E você sabe também que seu cosmo está ligado ao sekishiki, esse sonho talvez seja seu eu interior tentando lhe mostrar...
-Com todo respeito, mestre, mas eu não estou interessado nesse papo zen. Eu me tornei cavaleiro contra a minha vontade e o senhor sabe muito bem porquê. Eu o respeito, porque o senhor foi um dos poucos aqui dentro que me tratavam com dignidade. Mas eu desprezo este lugar e estas pessoas.
-Seu coração está ferido, eu sei.- Disse Asclépio serenamente sentando-se ao seu lado- Entendo o que está sentindo e eu mesmo fui testemunha de tudo o que você passou. Mas não deixe que estes sentimentos te dominem. Um cavaleiro precisa saber dominar a si mesmo e deitar fora seus sentimentos pessoais para manter o seu cosmo focado no caminho da luz. Se você não aprender a trabalhar seus sentimentos, eles o levarão a um caminho perigoso e sem volta. O cosmo de um cavaleiro reage conforme seus sentimentos. Quanto mais sentimentos bons, mais fino e luminoso será seu cosmo, mas se deixar seu rancor, seu ódio dominar seu coração, seu cosmo se tornará denso e pesado, até que se corrompe totalmente e se torna um cosmo de trevas, e uma vez dominado pelas trevas, é quase impossível retroceder.
-Agradeço o conselho, mestre, mas eu assisti Star Wars.- Ox finalizou a conversa ali- Eu tenho um objetivo, provar a inocência de minha mãe e acabar com a raça daqueles dois vermes que a mataram. Depois disso, vou embora deste lugar e nunca mais eu piso aqui enquanto viver. Atena que se dane!
-Eu sei que no fundo do seu coração você não pensa assim, meu jovem. E a prova disso são os sonhos que você tem. Você é um cavaleiro de Atena, é seu destino, você está ligado a ela como sua mãe era. Eu não tenho dúvidas disso.
-Preciso de uma cerveja.- Disse Ox se levantando- Se um dia Atena aparecesse na minha frente eu ia perguntar a ela porque ela abandonou minha mãe. Porque ela consentiu que aqueles calhordas matassem minha mãe. Ela viu e poderia ter impedido, mas só ficou olhando, não fez nada!
-Atena jamais faria isso. E aquela que está morando no salão do papa certamente não é Atena. Eu sei disso e sua mãe também sabia.
-Não me interessa se era o Michael Jackson. Fui.
Ox se levantou e desceu as escadas saindo dali. Asclépio sorriu calmamente e enquanto via o jovem cavaleiro pegando sua máscara, ele pensava consigo mesmo:
-Ox... Quando toda a verdade vier à tona você verá que tudo teve um propósito.
Ox pegou uma mochila estratégicamente escondida entre uns arbustos e tirou seu conteúdo. Uma jaqueta de couro, calças jeans limpas, um par de sapatos de couro pretos e uma camiseta preta. Ele guardou sua máscara dentro dela e vestiu as roupas ali mesmo. Ludibriou os guardas que vigiavam o local e rumou para a cidade mais próxima, Rondorio.
Em duas horas Ox chega à cidade, de carona. Vai a um bar que estava aberto, e entra. Aquela era a pior área da cidade, onde a escória do mundo se encontrava. Ponto de drogas, prostituição, crimes, armas, as pessoas que frequentavam aquele lugar não eram pessoas boas, ao contrário, eram criminosos da pior espécie. Ox senta-se ao balcão e pede uma cerveja. O barman mal encarado nem olha para ele e o serve. Ox abre a garrafa com os dentes e começa a beber. Num palco improvisado uma mocinha da sua idade cantava acompanhada de um velho com um violino surrado. Ninguém lhe dava atenção. Mas Ox ouviu a voz da jovem, que era doce e suave. A melodia desafinada do instrumento surrado do velho era um contraste com a voz harmoniosa e gentil da moça. Aquela voz parecia acalmar e acalentar por instantes aqueles corações endurecidos. Nisso, algumas vozes ruidosas e grosseiras pareciam atrapalhar a melodia. Ox se voltou e viu um grupo de homens rindo e falando palavrões. Ele tentou se concentrar na música enquanto bebia. Um dos homens se levanta e vai até o palco cambaleante e começa a gritar em grego vários palavrões para a jovem, que um pouco assustada, parou de cantar. Ox olhou a cena com o canto de olho e pensou: "Foda-se, não é da minha conta!"
Mas seu íntimo se incomodava. Os impropérios que o homenzarrão gordo gritava para a jovem já podia ser ouvido por todos no bar, porém, era como se nada estivesse acontecendo. Aquilo incomodava Ox. Aquela mocinha amedrontada recuava enquanto o gordão avançava, então ele agarra seu braço com violência dizendo:
-Vamos, garota, porque não larga esse velho aí e vem sentar com a gente? Eu e meus amigos ali queremos ver você cantando nos nossos microfones, se é que me entende, heheheh
A menina estava apavorada, o velho, trêmulo, nada podia fazer. O gordo vendo que a garota resistia, pegou sua arma e encostou na têmpora do idoso, dizendo:
-Ou você vem ou eu espalho os miolos desse fóssil velho por toda essa espelunca!
-Que arma grande- Disse Ox em grego sem olhar para eles enquanto bebia sua cerveja- É pra compensar o seu pau pequeno?
O local ficou em silêncio. O gordo olhava em volta furioso, e gritou:
-Quem? Quem foi o filho da puta que disse isso??? Apareça!!!
Todos tremiam. Mesmo aqueles homens, alguns eram criminosos perigosíssimos, pareciam ter medo daquele gordo. Ox porém, não se abalava, continuava bebendo calmamente enquanto todos estavam estáticos, horrorizados assistindo tudo aquilo.
-Quem disse que eu tenho pau pequeno? Seja homem e se apresente! Será um homem morto!
-Além de pau pequeno ainda é surdo.- Disse Ox se levantando calmamente enquanto bebia sua cerveja, encarando o gordão- Eu não disse que você tem o pau pequeno, perguntei se o tamanho da sua arma era pra compensar o seu pau pequeno, VOCÊ afirmou que tem o pau pequeno, não eu.
-Meu Deus...- A jovem balbuciou- Você... É completamente louco!
O homem ficou ainda mais vermelho de raiva e disse rosnando:
-Você faz idéia com quem está falando, idiota? Sabe quem eu sou? Sou Nickolai Aeroupolos, filho do cartel mais poderoso da máfia grega! Você tem noção do que eu posso fazer com você?
-Se eu fosse você pediria clemência de joelhos ao senhor Nickolai, talvez ele te mate rápido por misericórdia.- Disse secamente o barman atrás dele.
-É mesmo?- Ox deu uma risadinha debochada- Então eu devo implorar misericórdia a um gordo escroto que se considera o tal por andar armado, que molesta uma garota indefesa. Eu caguei pra quem você seja, vermes como você me dão asco. Você diz que vai me matar, mas sabe de uma coisa? É você quem vai morrer aqui.
Um breve silêncio toma conta do local, interrompido em seguida por uma ruidosa gargalhada geral.
-Você é quem vai me matar? Você??? Um fedelho? Você é engraçado, me faz rir, é uma pena que vou te matar, você seria um comediante e tanto!
Ele atira em Ox na frente de todos. Vários tiros. Mas Ox continuava de pé bebendo na sua frente sem sequer piscar.
-Mas como? Eu descarreguei minha pistola em você e você nem sequer se mexeu! Nem um ferimento, nada!
-Você atirou, é? Nem percebi!
-Desgraçado!!! Matem ele!!!
Os homens que acompanhavam o gordo sacaram suas armas, eram metralhadoras,escopetas, um tiroteio terrível, corre corre, confusão, uma poeira grossa, gritos, o local virou um pandemônio total. Quando a poeira baixou, Ox continuava em pé normalmente com sua garrafa de cerveja na mão, abrindo com o dente, ao seu redor, vários corpos. Os homens que atiraram, estirados no chão dilacerados.
-Mas o que é isso???- O gordo foi tomado de intenso horror- Como isso aconteceu? Era para você estar morto, não eles!
-As balas de uma arma ao sair chegam entre 120 m/s a 1.700 m/s, a velocidade do som é de 340,29 m/s. Só precisei me mover acima desses níveis de velocidade, moleza pra mim!
O homem olhava aquela cena e suava frio. Ox sequer olhava para ele e dizia:
-Você tem até a hora que eu terminar esta garrafa de cerveja para pedir desculpas para a moça e sair daqui, do contrário eu matarei você.
O gordo bufou e olhava a jovem e o velho e olhava para Ox. Nisso, ele disse:
-Eu? Filho do chefe do maior cartel do mediterrâneo, pedir desculpas a uma cantorazinha de merda e a um velho caindo aos pedaços? Olha o que eu faço com eles...
Ele aponta sua arma, e num piscar de olhos, sente uma dor insuportável na mão esquerda, ao olhar, viu sua mão decepada caindo no colo do velho, que na mesma hora, teve um troço devido ao susto. O gordo não acreditava, ele segurou o próprio braço agora sem a mão e grita em desespero. Ox dá um sorriso sádico e diz somente:
-Corre.
O homem sai correndo dali desesperado, enquanto Ox termina sua cerveja. Nisso a jovem grita desesperada:
-Me ajudem, por favor! Meu avô está morrendo!
---------------‐---‐‐----------------------------‐-----------‐------‐Pouco depois a ambulância levava o corpo já sem vida do velho, com o rosto coberto por um lençol. Todas aquelas emoções haviam sido demais para o seu coração frágil e ele morreu antes de receber os primeiros socorros. A jovem chorava abraçada ao violino, enquanto Ox sentado, continuava a beber a sua cerveja. Ele se levanta e vai saindo, quando ouve a jovem dizer:
-O que vai ser de mim agora, sem o meu avôzinho?
Ox para de costas para ela. Em seu íntimo ele conhecia bem aquele sentimento. Ele sabia bem como se sentia. Aquela sensação de perda, de dor... Ele não ousava olhar para a jovem, pois ele mesmo não queria ver a si mesmo diante do corpo de sua mãe. A garota aos prantos, olhando Ox, disse:
-Você é um cavaleiro de Atena, não é? Como pode fazer isto? Como pode nos abandonar? Os cavaleiros de Atena tem a sagrada missão de proteger a paz e a justiça, eles são os cavaleiros da esperança!
-Esperança? Tolice!- Respondeu- Há muito tempo abandonei a minha. Os cavaleiros não passam de uma fraude. Eu não sou nenhum herói aqui.
-Não é verdade!- Ela disse em lágrimas- Os cavaleiros lutam para proteger este mundo, e você me protegeu daqueles homens! Um cavaleiro jamais deve abandonar a esperança porque é ela quem move os cavaleiros!
-Querida, eu NÃO dou a mínima.- Ele ia saindo, mas de repente, sentiu um cosmo quente e doce vindo daquela jovem. Era um cosmo que ele nunca sentira antes. Um cosmo cheio de paz e bondade, ele virou-se e a encarou, mas seu olhar se cruzou ao dela, a menina parecia transfigurada, mas ao cruzarem seus olhares, ela fica envergonhada e seu cosmo se apaga. Ox fica impressionado:
-Você... Você também é usuária do cosmo! Eu vi!
Nisso, uma mão pousa em seu ombro e ele ouve a voz de um homem atrás de si:
-Ox, o Grande Mestre quer saber porquê você fugiu do Santuário.
Ox se volta e vê o cavaleiro de prata Vicare de altar, auxiliar do Grande Mestre. Vicare era sereno e calmo, mas tinha uma seriedade e convicções fortes.
-Vicare, você viu aquilo?
-Vi o quê?
-A garota, ela...
-Que garota?
Ele se voltou e a jovem já tinha ido embora. Como, não se sabe.
Ox não entendia o que estava acontecendo. Mas uma coisa ele tinha certeza: Ele encontraria a garota sem nome novamente.
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Mitos do Zodíaco! Kira, o cavaleiro entre a vingança e a esperança!
FanfictionOx tem estranhos sonhos em que é jogado do alto do Yomotsu Hirasaka e é destroçado por um monstruoso escorpião. Ele acorda sobressaltado, e após um breve diálogo com o seu mestre,Asclépio, cavaleiro de ouro de Serpentário, dribla os guardas que vig...