Crowley desceu do carro desanimado, não estava quase a chorar, porque não sabia exatamente se o que sentia no momento era tristeza, e sabia da sua nova natureza de caído que demônios só choravam quando enfrentavam as maiores tristezas de suas vidas.
Os anos setenta haviam passado rápido demais para si, suas devidas traquinagens não eram tão frequentes quanto o inferno desejava que elas fossem, pois o mesmo estava sempre dando desculpas e inventando novas histórias para não ter que trabalhar no seu cargo de demônio, não é que não gostasse de tentar pessoas, mas o trabalho de fazer tudo como mandava as regras no papel lhe era cansativo demais, afinal era um demônio, e demônios não fazem as coisas certas mesmo, entrariam em um grande problema -com uma papelada gigante- com o inferno se as fizessem.
Nas últimas décadas seu foco havia passado de cumprir seu trabalho para um certo anjo loiro rechonchudo que lhe tomava os pensamentos de imaginação fértil sempre que o mesmo permitia, Aziraphale, o qual Crowley tinha um caso de algumas centenas de anos, havia lhe dado o mais recente pé na bunda, e Crowley duvidava muito que as coisas entre eles voltassem ao que era antes, quando se entendiam o suficiente para permanecer no mesmo ambiente por uma quantidade de tempo aceitável, não entendia a frase do anjo, não entendia como o mesmo poderia ir rápido demais, quase seis mil anos, e desde o primeiro momento em que se viram, Crowley sabia de seus sentimentos pelo anjo loiro, só não esperava que no momento em que se declarasse, mesmo que intencionalmente, o anjo iria lhe dar o maior pé da bunda de sua vida – o único também.
Os anos oitenta chegaram e sua vida complicou ainda mais, era um amante ávido das músicas humanas, consumia de tudo, mas o pop e rock de época eram seus favoritos, e quando a onda de músicas de amor se iniciou, tudo -ainda mais- lembrava seu anjo, que havia quase sumido do mapa, sabia que teria que ir devagar com Aziraphale, e estava disposto a esperar, só não sabia se a Terra iria suportar essa espera com ele, ela seria a primeira a morrer com o Armagedom que viria décadas depois, não sabia o que o céu e inferno planejavam, mas tinha certeza que a raça humana e derivados não sobreviveriam.
Não precisou tocar na porta vermelha sangue para que ela se abrisse, não parecia haver ninguém ao redor do bar, mas várias pessoas se espalhavam pelas mesas que ficavam nos cantos das paredes, o ambiente era mal iluminado, mas parecia ser proposital, pois cada mesinha tinha sua iluminação amarelada, o ambiente era em sua maioria vermelho sangue e preto, lembrava-lhe dos cabarets que visitara anos antes, gostava do clima do lugar, todos eram reservados e a escolha das músicas que tocava em uma altura confortável lhe agradava bastante.
Se aproximou do balcão em frente ao bar e sentou-se, esperando a barista que sempre o atendia, era uma mulher calada e pelo tempo de visitas do ruivo ao local, sabia das preferências do mesmo, o que lhe garantia algumas gorjetas a mais, a garrafa de uísque Rodgers foi colocada à sua frente juntamente com um copo pequeno de doses, pelo luxo que o demônio ruivo gostava sempre de pregar, as pequenas mensagens entalhadas no vidro diziam "Aziraphale", nas mais diversas línguas, algumas que até nem mesmo o próprio Crowley conhecia. Não gostava de se torturar, mas ter o nome do causador de suas bebedeiras no copo em que iria beber -por provavelmente a noite toda- lhe confortava de alguma forma.
A noite se transformava em madrugada e quase toda a garrafa de uísque já estava em seu organismo, sua cabeça estava leve e agora sua vontade de falar ao mundo o que sentia e pensava triplicou, levantou a mão e a barista que atendia outros clientes lhe trouxe uma garrafa de vinho, ele nem se importava quem o havia produzido ou o ano, geralmente gostava de apreciar um bom vinho, mas no momento, com uma garrafa de uísque dentro de seu organismo, se lhe dissessem que água da torneira era o mais fino Dom Pérignon, ele acreditaria.
Não entendia mais com clareza o que acontecia no redor do espaço do ambiente, mas viu uma mulher loira, muito bonita por sinal sentar-se no banquinho do bar ao lado do seu, os olhos azuis e os cabelos loiros eram um combinação muito atraente, qualquer pessoa admitiria a beleza da mulher, mas o ruivo só tinha olhos para uma pessoa, o anjo de sua vida, coincidentemente também loiro e de olhos azuis, seu coração apertou ao lembrar de como beleza nenhuma na Terra ou em qualquer outra galáxia se comparava aos charmes de seu anjo. Olhou ao redor e viu que todos os outros banquinhos estavam vazios ao longo do balcão do bar, e foi aí que percebeu as intenções da mulher.
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Turn Around, Bright Eyes
FanfictionOs anos oitenta chegaram e sua vida complicou ainda mais, era um amante ávido das músicas humanas, consumia de tudo, mas o pop e rock de época eram seus favoritos, e quando a onda de músicas de amor se iniciou, tudo -ainda mais- lembrava seu anjo, q...