15/07 17:10 PM

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Estávamos na costa, sentados nas cadeiras artesanais de um restaurante praiano e antigo enquanto devorávamos um prato gigantesco de frutos do mar quando eu percebi algo.

"É estranho o fato de eu ainda não saber como você se chama?"

Ela riu e ajeitou o chapéu de palha fina que havíamos comprado com os vendedores ambulantes a uma hora atrás, juntamente com dois óculos escuros baratos e ridículos e duas pulseiras hippies coloridas.

Tinha sido uma grande tarde.

Porra, a melhor tarde em séculos.

Visitamos o zoológico praticamente despovoado de Kaila Bay, demos os nossos nomes como "Bonnie e Clyde" (Acreditam que eles caíram mesmo nessa?) e ela quase caiu de cara no aquário de um tubarão mortífero de quatro metros de comprimento. Compramos alguns discos de vinis antigos numa venda de garagens da Republic Street, aprendemos a fazer tranças box brades com uma militante ativista no meio da praia (Saí de lá com duas delas no meu cabelo e tendo conteúdos o suficiente para escrever um livreto sobre as lutas feministas e o racismo enraizado), batemos o recorde de algum adolescente desocupado no Street Fighter de um fliperama, entramos nas sessões proibidas do museu de artes, tiramos fotos imitando as pinturas eróticas e renascentistas com a minha polaroide e corremos do segurança por termos entrado nas sessões proibidas do museu de artes até finalmente chegarmos na costa.

"Faz diferença?" Ela respondeu.

"Um pouco, se não quiser que eu continue te chamando de Ei, Você!"

Pagamos a conta com o resto das economias que havíamos juntado e acabamos sentando na areia da praia, a alguns metros do restaurante, já que não tínhamos comprado uma canga no meio do caminho e todas as cadeiras de plásticos já estavam sendo coletadas pelos donos das barracas da orla.

O tempo poderia parar naquele mesmo horário pelo resto das nossas vidas, e eu não me importaria nem um pouco.

Cara... Eu adorava os fins de tarde. Adorava como o clima não era nem tão frio e nem tão quente. Adorava as cores imprevisíveis do céu de cada dia. Adorava sentar aonde quer que eu estivesse e admirar o pôr do sol — Ele geralmente faz com que você enxergue a vida de uma maneira melhor. Como os funerais... Exceto que todo mundo é feliz entre as quatro e meia e as cinco da tarde, e não entre catacumbas e restos mortais —

"Sabe... Quem teve a brilhante ideia de reciclar um nome que já foi usado?" Ela me perguntou de repente. O pôr do sol também costuma nos fazer refletir sobre os detalhes mais aleatórios das nossas vidas, tinha me esquecido dessa parte.

"Como assim?" Recostei o meu tronco na areia e apoiei as duas mãos atrás da cabeça.

"É que, tipo...." Ela se juntou a mim e apoiou as duas mãos atrás de sua cabeça "Não existe uma outra pessoa como você, ou como eu, ou... porra, COMO A RAINHA DA INGLATERRA! Entende? Não existe uma outra pessoa sequer que olhe para o sol do fim de uma tarde refletindo na maré, como a da nossa frente, e pense na mesma coisa que eu estou pensando nesse exato momento: Sobre como eu poderia apenas ficar deitada aqui e agora pelo resto da minha vida, sem ter que me preocupar com a senhora Peggy ou com a aula de escrita criativa da segunda-feira... Porque nossos nomes não podem ser únicos como nós?"

Não consegui segurar um sorriso. Eu devia estar falando com a própria reencarnação de um sociólogo contemporâneo.

"Uau... Você deve odiar mesmo o seu nome"

Ela riu e estapeou o meu abdômen.

"Vamos fazer o seguinte..." Virei o meu corpo para encara-la melhor. Agradeci nesse meio segundo por eu estar com os olhos cobertos por lentes escuras, ou ela com toda a certeza notaria a checada que fiz em todo o seu corpo pardo naquele biquíni que ela insistira em comprar mais cedo "Não vamos revelar os nossos nomes verdadeiros. Eu decido do que quero te chamar e vocês faz o mesmo"

"E o que vou ter que considerar ao te batizar com um outro nome?"

"Pode ser o nome do seu falecido tataravô, o nome do seu primeiro animal de estimação ou simplesmente uma junção de sílabas estranhas...Você decide"

"Fechado" Apertamos as mãos e começamos a nos concentrar na nova espécie de registro de nascimento que aconteceria ali.

Ela acabou se tornando Summer e eu, Braiden.

Summer, porque de algum jeito, o mesmo sentimento que me invadia durante o pôr do sol de uma tarde de verão como aquela, aparecia no momento em que ela abria a boca e falava... Ou sorria... Ou, minha nossa, olhava para mim.

Nunca descobri o real motivo de Braiden.

Para todas as noites solitárias da sua vidaOnde histórias criam vida. Descubra agora