Capítulo Vinte e Nove

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Eu tinha uma vaga lembrança do que ocorreu, um borrão rápido demais para ser corretamente registrado pelo meu cérebro. Braços me arrastaram para longe de Nicholas, que permanecia dormindo tranquilamente e sons de conversa encheram os meus ouvidos, mas era como se eu estivesse dopada e não pudesse reagir. Então, tudo foi escuridão por um tempo.

Quando acordei, ainda podendo mexer apenas um pouco do meu corpo, notei que estava trancada no escuro, mãos e pés amarrados com força, cortando minha circulação. Buscando compreender onde estava, parei por um segundo permitindo que meus sentidos coletassem informações. Eu sentia o sacolejar causado pelas pedras no caminho, o que me causava um denso enjoo, era capaz de ouvir o trote dos cavalos, forte contra o chão. Com choque, notei que estava em uma carruagem. Por Crown! Por que me colocariam em uma carruagem como se ainda vivêssemos como animais?

A carruagem parou abruptamente e eu levitei alguns centímetros antes de bater no chão com força e rolar, minhas mãos amarradas em frente ao meu corpo, se espalhando imediatamente sobre a minha barriga, rezando para que meu bebê estivesse bem. Quem quer que estivesse conduzindo aquilo, praguejou o fato de uma das rodas ter quebrado, não se preocupando nem um pouco em verificar se eu estava bem. Ficamos parados por um período que pareceu uma eternidade antes que outras vozes se juntassem a primeira e nós voltássemos a andar.

Provavelmente desmaiei novamente, pois a minha próxima lembrança era de estar sendo carregada em meio a escuridão por um garoto de cabelos lisos prateados com um belo halo de luz branca e brilhante em volta de seu corpo.

― Você é um anjo? ― Perguntei debilmente, minha voz, ainda mole, soando estranha aos meus próprios ouvidos.

― Longe disso, querida ― um flash branco de seus dentes no que parecia ser um sorriso de escárnio. ― Se você quer me comparar com algum ser celestial ― respirou ― estou mais para um demônio.

E então, apaguei novamente.

***

Acordei novamente algumas horas mais tarde, deitada em uma cama cujo colchão era tão fino que eu era capaz de sentir cada filamento do estrado. As paredes eram manchadas e o chão sujo. Havia uma pia, um vaso sanitário e um chuveiro no canto do quarto. Não havia nenhuma parede que impedisse a visão daquilo, se eu os usasse estaria completamente exposta. Olhei finalmente para o último canto que faltava e para minha surpresa em vez de uma porta eu encontrei barras de ferro enferrujado. Eu estava presa em uma cela.

― Ainda bem que você acordou. Estávamos começando a pensar que você estava morta ― ouvi.

A voz veio do lado de fora, mais especificamente de um garoto sentado em frente as barras. O garoto de cabelo prateado que havia me carregado mais cedo. Não me aproximei das barras, não queria chegar perto dele. Sentei-me na cama e o encarei ironicamente.

― Então por que não entrou para verificar por si mesmo? ― Falei com uma sobrancelha levantada. Eu ainda estava grogue pelo que quer que fosseque eles tinham usado para me tranquilizar, mas não precisava deixá-lo saberdisso.

Ele comprimiu os lábios em uma linha fina até que estes ficassem inteiramente brancos:

― Para que você tentasse me matar, querida dama? ― Perguntou destilando sarcasmo.

― Como poderia se estava desmaiada? ― Puxei os fios de cabelo com força tentando me concentrar naquele jogo. Vá com calma, Luna ― Com que arma se não tenho nada além das mãos?

Ele deu de ombros parecendo desinteressado.

― Não sei ― afirmou. ― Ela diz que eles ensinam autodefesa naquele covil.

Quis retrucar que aonde estávamos agora era o verdadeiro covil, mas engoli o orgulho, ávida por informações.

― Não consegui chegar a essa parte, vocês me levaram antes que eu pudesse ter a chance de aprender.

Ele riu sem humor.

― Esforços patéticos ― balançou a cabeça ― no final, todos eles serão mortos, sabendo lutar ou não.

Contive um arrepio frio que ameaçou descer pela minha espinha, minha mente correndo por todas as minhas possibilidades.

― Então, vocês vão me torturar para arrancar informações? ― Perguntei temendo unicamente pelo meu bebê.

Ele bufou.

― Não precisamos disso, querida ― ele sorriu daquele jeito assustador, os dentes quase da mesma cor que o cabelo. ― Temos nosso próprio bode expiatório.

Comecei a puxar meus dedos nervosamente pensando. Quem? Quem poderia ainda estar prejudicando os outros enquanto eu estava ali sem poder ajudar?

― Então, por que eu estou aqui? ― Minha voz titubeou pela primeira vez durante aquela conversa e eu me odiei por isso.

Ele se levantou e limpou a poeira do chão sujo das pernas da calça, antes de cruzar as mãos em frente ao corpo.

― É uma longa história, mas acho que tempo é algo que temos em abundância já que você, querida, vai ficar aqui durante um longo, longo período... ― ele deu um sorriso singelo que pareceria inocente se eu não soubesse melhor do que isso. ― Bem, você certamente conhece minha irmã Pixie, não é? Cabelo cor-de-rosa, sorriso alegre, asas azuis? ― Perguntou com uma sobrancelha arqueada em divertimento.

Lembrei-me imediatamente da garota que eu nunca havia visto antes que abraçou eu e Nicholas fervorosamente no dia de nosso casamento ― que havia sido ontem, eu sabia, mas parecia como décadas.

― Pela sua expressão vejo que se lembra ― juntou as pontas dos indicadores batendo-as levemente ― Como uma Pixie, suas habilidades em Encantar, não são tão bem desenvolvidas como as de uma fada, mas são boas o suficiente para que, graças a ela, seu ― ele fez uma careta como se tivesse desgosto com o que diria a seguir ― ex-marido não acordasse enquanto te retirávamos de lá e é por isso você ainda está tão sonolenta ― ele piscou e sorriu como o gato que engoliu o canário. ― E já que você foi uma ouvinte tão boa, acho que merece ser presenteada sabendo um pouco de nossos planos.

Engoli uma respiração, desesperada pelas migalhas de informação que ele estava atirando para mim. Por dentro estava em chamas, mas por fora eu estava impassível.

― Como você já deve ter devidamente percebido, sua mãe está viva e louca para reivindicar esse... ― ele franziu as sobrancelhas em uma careta de repudio ― bebê que você tão gentilmente carrega ― minhas mãos foram em um gesto automático para o meu ventre como se isso fosse impedi-los de tira-lo de mim. ― E depois que você servir a este propósito, minha querida, você se tornará minha esposa e com a dona da principal arma deles, eu, General Alexy Stoneblood, destruirei seu povo ― meu estômago estava completamente revirado e eu sabia que não demoraria muito para expurgar todo o conteúdo do mesmo. ― Espero que você tenha aproveitado sua estadia lá fora muito bem, minha querida, pois daqui ― ele sorriu se afastando das barras ― você não sairá nunca mais.

Bem-vindo ao meu novo inferno.

When We CollideOnde histórias criam vida. Descubra agora