Face It, Tiger

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James não conseguia não encarar a ruiva. Era impossível. O cabelo dela longo, acaju meio acobreado e avermelhado, com todas aquelas ondas, era fascinante demais. As sardas espalhadas delicadamente pelo rosto eram um charme extra. Seus olhos verdes eram tão intensos e pareciam esconder os segredos do universo, sugando James repetidamente para aquele vórtex interminável. Os longos dedos pareciam tão delicados ao passar pela estante, escolhendo um encadernado aleatório para abrir e folhear. Já havia decorado a sequência: escolher um encadernado, abrir, folhear, morder os lábios, tentar prender atrás da orelha aquela insistente mecha de cabelo da franja que caía sobre os olhos, tão logo surgindo aquela pequena e adorável ruga entre as sobrancelhas conforme avaliava o que via.

Toda terça e quinta feira, pontualmente às 17h ela aparecia ali, justamente na golden hour, fazendo parecer que ela própria era o sol. O cabelo parecia fogo; na verdade, tudo nela parecia queimar intensamente a todo momento. Quando ouvia o sino indicando que a porta havia sido aberta, James sabia que a visão da ruiva lhe tiraria o fogo. Poderia jurar nesses momentos que viveu sua vida em escuridão e só agora conhecia a luz do sol, só agora que a conheceu.

Sabia já o que ela faria toda vez. Chegaria por aquela porta, daria para ele um tímido sorriso e se dirigia direto para a seção de hqs do Batman. Passaria algum tempo ali, indo direto para as do Capitão América em seguida, X-Men, uma olhada geral e, por fim, acabaria levando uma qualquer do Homem Aranha. Uma vez por mês, na primeira quinta feira de todo mês, ela levaria algum encadernado. Esses eram os dias que ela passava mais tempo na loja, escolhendo cuidadosamente. Então ela passaria no caixa, daria outro sorriso tímido para James, agradeceria e iria embora, parecendo levar o sol com ela.

Sabia de todos esses detalhes da garota e sequer sabia a coisa mais básica o possível: seu nome. Sim, ele soa como stalker, mas não era. Era apenas que seu cérebro parecia não conseguir lidar com o quanto ela era linda e na hora de falar algo pertinente tudo que saia eram variações de "ahn", "hum" e "aaaaa". Demorou algum tempo até ele conseguir formar um simples "boa tarde" e "obrigada por sua compra e volte sempre". E ainda assim, toda vez que ele dizia essas frases, podia sentir suas mãos suando nervosamente.

O que era absolutamente patético. James Potter não era alguém que não sabe como falar com garotas. James Potter, na verdade, tinha a capacidade de falar com qualquer um que chegasse em sua frente. Esse era um dos seus dons: sua personalidade extrovertida e tranquila. Tudo sempre estava bem para ele, não existia situação constrangedora e a popularidade não era um estorvo e sim uma benção.

Ele tinha a vida dos sonhos de qualquer um que cresceu vendo filmes de high school poderia desejar. Era bonito com sua estatura de 1m82, os ombros largos e orgulhava-se particularmente de seu sorriso relaxado e de seu cabelo que tinha praticamente uma reputação por si só. Era capitão do time de lacrosse e tinha os melhores amigos que poderia desejar. E falando em desejar, sabia que era desejado por ¾ da população daquela escola. Suas notas também eram excelentes sem esforço.

Entretanto, havia uma parte de sua vida que gostava de manter separada e essa parte era sua verdadeira nerdice. Não porque tinha vergonha; isso nunca, mas sim porque parecia ser algo tão pessoal e íntimo que apenas seus amigos mais próximos sabiam. Sentia que se algum semi conhecido lesse suas hqs preferidas e lesse seus tweets descompromissados em sua conta anônima, estaria, na verdade, tendo uma visão exclusiva e privilegiada de sua própria alma.

Então, mantinha essa parte de sua vida muito bem escondida, obrigada. Trabalhava meio período em uma comic store do outro lado da cidade, onde podia passar horas em meio ao conteúdo nerd que tanto amava, onde podia estudar em paz devido ao movimento tranquilo da loja e ainda, toda terça e quinta feira, podia ver a Mary Jane Watson que entrava por aquelas portas pontualmente. Se o mundo todo lhe pressionava para ser o filho perfeito, o capitão perfeito do time de futebol, o futuro médico genial, o pegador, sabia que naquela loja ele poderia ser simplesmente ele mesmo.

A Spiderella StoryOnde histórias criam vida. Descubra agora