Capítulo 1

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Estou aqui novamente nessa poltrona,esperando ser chamada para mais uma seção da terapia,que por sinal eu acho totalmente desagradável,mas depois da terceira tentativa de suicídio,minha mãe resolveu dar uma de preocupada e me obrigou a fazer.
Pra falar a verdade até que estou me esforçando,mas como hoje é um daqueles dias em que eu prefiro que minha língua seja arrancada à ter que falar alguma coisa,sinto que a próxima hora vai ser beeem produtiva.
“Claire" a secretária me chama,pronunciando meu nome errado como todo mundo faz,passo por isso todos os dias graças ao meu pai,que é americano e convenceu minha mãe a me dar o mesmo nome de minha avó.
“Ser pronuncia ‘Cler’ e não ‘Claire'” digo a ela revirando os olhos, sem a menor intenção de ser educada.
Entro na sala cheia de fotografias de família,da doutora Helena,que faz meu estômago revirar,com tanta alegria sendo jogada na minha cara.Deito no divã a sua frente e ela me olha por cima dos óculos.
“Boa tarde Claire" ela me cumprimenta esperando minha resposta.
“E aí” respondo sem entusiasmo
“Como vai?” ela insisti.
“Estou levando” digo da pior maneira possível,pra que ela perceba que não estou a fim de conversa.E parece que funciona.
“ Então hoje é um daqueles dias,em que você acorda sem querer falar não é mesmo?”
“Nossa!Que bom que você percebeu!" Digo sendo sarcástica.
“Claire,você sabe que isso não é bom pro seu tratamento,não é?”
“Hum”
“Pois bem,ficaremos aqui nos olhando até você falar algo,como está se sentindo hoje?Como foi a sua semana?Tem tido os pesadelos de sempre?” Ela para de perguntar por um instante como se estivesse,pensando nas palavras que vai usar a seguir,mas desiste e começa a anotar alguma coisa,naquele maldito caderno,que eu adoraria ver o que tem sobre mim.
Passo os próximos minutos com os dedos entrelaçados em cima da barriga,mordiscando o canto da bochecha,e balançando os pés,acho que a Dra Helena tenta se comunicar mais algumas vezes mas não faço questão de ouvir e ela desiste.
“Bom!Acho que nossa hora acabou" ela diz,me dando a notícia que estava esperando desde a hora que cheguei.Em um salto me levanto e antes que eu consiga sair,ela se levanta e me para.
“Você precisa falar mais Claire,se não esses sentimentos de perda e culpa nunca vão para de atormenta-la,você precisa ser forte para se livrar deles antes que eles tomem conta de você.”
Paro um pouco pra pensar no que ela acabou de dizer,e então respondo:
“E se eu não quiser afastar esses sentimentos? E se eu tiver a impressão de que são a única coisa que existe dentro de mim,que me fazem lembrar do meu irmão ?” E antes que ela possa dizer algo mais,me afasto e saio de seu consultório batendo a porta.
Quando volto a sala de espera,meu pai está me esperando e não posso deixar de dizer que fiquei surpresa ao vê-lo aqui,ele nunca veio me buscar,nem aqui e nem em qualquer outro lugar,está sempre ocupado demais para se dar ao trabalho.Geralmente quem faz esse sacrifício é o seu motorista,Toni,ele é até bacana,mas fala demais,o que me irrita pra caramba.
Ele sorri,e faz um meneio com a cabeça,me convidando a sair,eu o sigo até o seu carro uma Land Rouver Discovery 2019,vermelha que para mim é tão chamativa quanto o seu terno da Calvin Klein,ou seja lá qual for a marca extravagante,que ele está usando desta vez.Meu pai é um homem charmoso,com seus olhos azuis marcantes,cabelos pretos lisos,e um sorriso encantador,chama muita atenção,mas para a sorte de minha mãe,ele só tem olhos para ela.
Todos dizem que me pareço muito com ele,e eu sei que é verdade,só não tenho mais paciência para ficar me comparando.
O trajeto até nossa casa é tomado por um silêncio estranho,que não sei bem como explicar,é como se ele quisesse me dizer alguma coisa,só não sei o que.
Chego em casa e começo a subir as escadas para ir ao meu quarto,mas sou interrompida por minha mãe.
"Olá,querida! Como foi a terapia hoje?" Ela diz olhando estranhamente para o meu pai,que balança a cabeça de leve,pensando que eu não percebi.
"O que está acontecendo aqui?" Pergunto já sem paciência.
"Nada minha filha,só queria saber como você está se sentindo"
"Hum...Sei...estou bem.Posso subir agora?"
"Claro filha,fica a vontade".Olha pra ela com os olhos semicerrados,e balanço a cabeça.Como se eu me sentisse a vontade nesta casa,o meu irmão era a única pessoa que eu tinha de verdade,que me compreendia e me fazia sentir vontade de ser melhor a cada dia,mas agora por minha causa isso já não existe mais.

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