O sol estava se pondo quando ele rebanhou a derradeira ovelha ao seu repouso. Com o cajado em mãos, vestido num tecido de lã e algo mais para do frio lhe cobrir, entrou em casa antes de escurecer. Despojou-se do excesso de vestes, arriou o cajado e deu um beijo em sua mulher, que cozinhava envolta de um aroma agradável. Sua filha veio correndo ao seu encontro, tomou-a nos braços e, em silêncio, orou a Yehowah... Pedindo em seu coração que estendesse sobre aquele pequeno corpo sorridente e cheio de vida as Suas bênçãos.
Jantou de maneira pacífica, colocou a sua filha para dormir, embalando-a em um cântico. Foi deitar. Parecia mais um dia de trabalho naquele pequeno pasto, comum a todos os outros. Dormia em sono mais doce quando levantou para mictar. Saiu de casa, atendeu-se e, ao retornar do ar livre, sentiu algo estranho, como uma sensação de formigamento e arrepio. É quando um clarinar de galo rompe o ar... Fitando acima de seu humilde telhado, uma luz muito intensa parecia romper o horizonte. Em um susto, corre até o quarto da filha para ver se está tudo bem. Temia pela sua sanidade, pois acabara de presenciar a noite desobscurecer. "Era o alvorar do dia, mas se deu em pouquíssimos segundos!", pensou. Chegando ao quartinho, ela estava de pé, sorrindo e tentando ver o que acontecia lá fora. "Você viu, papai? Você também viu?!", perguntava entusiasmada.
E aquele dia durou algum tempo. Os galos remendavam um louvor que não tinha fim, pareciam explodir. Saíram de casa para testemunhar... Os pássaros cantavam, as ovelhas pulavam de alegria, percebeu os lírios desabrocharem em segundos... Ele já não temia, abraçado a sua filha, com olhos marejados. O sereno da madrugada aconchegava-os como um cobertor, e sorriam, porque era belo.
O céu, aos poucos, se cobria com um negro manto cravejado de diamantes, revelando as suas estrelas... Na barra da vista, aquele clarão retornava ao seu ponto original. Quando a noite se reestabeleceu, avistou no horizonte - mais distante ainda - um outro ponto de luz fluorescente remanescente na abóboda celestial, como uma estrela, porém, "é muito maior", pensou. Os animais estavam em festa: Ovelhas, cabras, galinhas e, cachorros... Agitavam-se num floreio sem igual. "A natureza se alegrou, papai!", disse sua filha, num sorriso.
Aquele ponto de Luz ornamentava o céu, riscando-o, aos poucos, sereno. Trazia em si uma fina beleza, onde, de sua calda luminosa, desprendiam-se pequenas centelhas, como as de uma fogueira, que desapareciam no ar. "Olha, papai! Aquela Estrela em Belém!", disse a pequena, apontando e saltitando.
Ajoelhou, fechou os olhos, curvado em punhos ao chão e pediu esclarecimento, orando em seu coração, em silêncio. Elevou o seu pensamento, naqueles pequenos segundos e sentiu uma Paz. "Como, Senhor?", pensava... Abriu os olhos e viu o Tempo clarear.
Sentiu um cheiro leve, de frescor, junto a uma finíssima luz azul que abria uma clareira ao seu redor. Ouvia uma música, ao longe... Não sabia bem o que era. Percebeu que vinha do céu, e foi tomado de um temor muito profundo. Ao levantar os olhos, viu um Ser de Luz vindo ao seu encontro.
"Não temais; eis aqui vos trago boa-nova de grande alegria, que o será para todo o povo: é que hoje vos nasceu, na cidade de Davi, o Salvador, que é O Senhor. E isto vos servirá de sinal: encontrareis uma criança envolta em faixas e deitada em manjedoura." E, subitamente, apareceu com o Anjo uma multidão da Corte Celestial, louvando a Deus e cantando: "Glória Deus nas Alturas e Paz na Terra aos homens de boa vontade!"
Derramava lágrimas, extasiado. Estava vendo, naquele milagre diante de seus olhos, o mais fino encantamento do que posteriormente chamaram de Anunciação. Recebeu toda a confirmação que procurava, em sua intimidade, durante toda a sua vida: A Existência do Eterno, a Glória Divina. Sentiu um conforto tão forte, ao sentir que Deus nunca os desamparou. E os Anjos voltaram, da mesma maneira que vieram: Alegres e pacíficos. A música silenciava ao longe em seus ouvidos... E ele queria que aquele momento se eternizasse.
Passou algum tempo ali, ajoelhado. Era tanta coisa a se pensar... Tanta coisa a alegrar. Queria acordar a sua amada e contar o que tinha presenciado.
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Contos Natalinos
SpiritualContos cristão, sem ser necessariamente católicos. Uma maneira espiritualizada, poética e bela... Como foi e como sempre será. O Amor acima de Tudo, na Vitória sobre todas as coisas.