Visitante Inesperado

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["Pare de culpar as circunstâncias externas pelo seu caos interior."]

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Norte de Londres, 1950.

René aproveitava a vista da Londres animada no pico do horário matinal pela janela da lanchonete, sentado enquanto tomava uma boa xícara de café, por vezes dirigindo o olhar para Joy, que andava de um lado para o outro, equilibrando bandejas como se não fosse nada. Era um pouco estranho vê-la com aquele uniforme, ainda mantendo em sua mente a imagem daquela jovem moça arrumada impecavelmente. Mas, é claro, não deixava de ser linda.

Quando tinha tempo e nenhum cliente a chamava, acercava-se da mesa onde estava sentado, conversando por breves segundos até ouvir outro grito e afastar-se às pressas. Nos últimos dias, para se conhecerem um pouco mais e enfim ela lhe compartilhar o seu nome verdadeiro ou qualquer informação relevante, René a visitava na lanchonete, tomando um bom café e aceitando cada recomendação nova.

A movimentação excessiva só se acalmava poucos minutos antes de fecharem as portas para a pausa do meio-dia. René, portanto, sempre tentava convencê-la a irem a um restaurante, porém ela sempre recusava, alegando não ter tempo e optando por comprar um lanche rápido e comê-lo sentada no meio-fio.

E dessa vez não foi diferente.

O homem ao menos se ofereceu para pagar o seu lanche — após muita conversa — e depois ambos sentaram-se um ao lado do outro, observando a rua movimentada. Definitivamente não estava acostumado a uma vida mundana como aquela; bem, não é como se não tivesse vivido parcialmente como um humano estando com Amélia, no entanto, os tempos eram diferentes e certamente comer sentados em uma calçada não era exatamente o tipo de coisa que realizavam.

— Se dá tempo para terminar o seu lanche aqui, por que não daria para eu levá-la a um restaurante? — René então lhe indagou. — Se não quiser sair comigo, basta me dizer.

— Não é isso. — Suspirou, dando mais uma mordida em seu sanduíche. — Eu gosto da sua companhia, René. Porém... há certas coisas que eu quero deixar para outro momento, entende? Sair para comer em um restaurante parece... um pouco demais. Meio íntimo, sabe? Não estou preparada para esse tipo de coisa ainda.

— Bem, não seria necessariamente um encontro. Apenas sairíamos para comer alguma comida melhor... e provavelmente sentar-se em um lugar mais confortável. — Deu de ombros, encostando o cotovelo em seus joelhos e apoiando a cabeça em uma das suas mãos. — Mas eu entendi o seu ponto de vista. Creio que faz sentido. E, além do mais, eu ainda sou um estranho.

— Exatamente. — Concordou com um breve sorriso. — Mas não me entenda mal, ok? Você é um homem... diferente, René. E eu gosto disso em você.

— Normalmente 'diferente' não é utilizado para definir algo bom. — Riu, fitando-a.

— Mas eu estou usando a definição do bom. — Suspirou. — Eu gosto de estar perto de você, como amiga. É como se eu estivesse revivendo um sentimento que nunca senti antes. Por isso é diferente, mas é um diferente bom.

René atentou-se mais do que deveria no "amiga", soltando um longo suspiro antes de desviar o olhar. Novamente as suas expectativas lhe dando um belo banho de água fria. Tampouco poderia culpar Joy por falar daquela forma, afinal, se conheciam por apenas algumas semanas e ela sequer conhecia o edifício onde residia. Então, sem dúvidas, ela não seria maluca em lhe chamar de qualquer outra coisa. Era, na verdade, surpreendente que tivesse se referido como amiga, e não uma simples conhecida.

Em Um Pedestal  [LIVRO 2]Onde histórias criam vida. Descubra agora