A madrugada avançava rapidamente e com ela a roupa da mulher mudava sua cor, era cada vez mais escura. Era claro que a roupa tinha ligação com os planos da morte naquele lugar, e enquanto a ampulheta da vida rodava, a areia levava não apenas o sopro da existência, ela levaria a pureza da alma.
— Eu... eu não sei sobre o que você está falando. Matei meus filhos e agora vou encontrá-los e os matei para isso. Agora todos vamos ficar juntos, meu esposo, meus filhos e eu.
— Mentira! — A mulher pela primeira vez alterou o semblante calmo para um ar sombrio e assustador.
A morte se colocou de pé, sua face branca e enfurecida estava próxima a Margoth, seus olhos eram como a neblina. Se ela tivesse algum hálito ele poderia ser sentido.
— Sei que Pierre não era seu irmão de verdade, sei que seus pais acolheram você com carinho, mas que você não saiu da barriga de sua mãe.
Margoth levou suas mãos ao rosto e fechou os olhos.
— Cale-se!Cale a boca! Não quero ouvir! Por favor! — Ela implorava.
— Eu sei de tudo, mulher! Quando seus pais morreram ele abusou de você! Pierre tirou sua dignidade, ele sugou sua vida!
Margoth prostrou-se no chão e começou a chorar, enquanto implorava para que a mulher interrompesse aquilo, lembranças de algo podre, de algo sujo.
— Ele a tocou, tocou como um esposo tocaria sua mulher. Você detestava, ele te dava nojo. Quando conheceu Esteban, você contou tudo naquela tarde e por isso ele queria matar Pierre, mas você não permitiu, o amor que você tinha por aqueles que te criaram não permitiu que você o deixasse morrer.
— Isso não é verdade, não é verdade...
Margoth desesperada apenas balançava a cabeça e escondia seu rosto. A mulher agora com o vestido preto como piche, prosseguia com sua fala:
— Sim é verdade! Quando Esteban morreu, você pensou que talvez pudesse voltar para onde cresceu e viver tranquilamente, pensou que Pierre já deveria estar morto ou casado e não a procuraria, contudo, ele o fez e a obrigou a levar os filhos para casa dele.
— O que você quer de mim? O que quer que eu diga?
— Diga a verdade, Margoth! Por que você matou seus filhos? Diga que você não quer morrer!
Enfurecida e com os olhos vermelhos ela se levantou para disparar tudo aquilo preso em seu peito, para expulsar aquilo que não a deixava respirar.
— Eu não quero morrer! Sempre tive medo de você! Eu odeio Pierre com todas as forças da minha alma, nunca deixaria ele tocar nos meus filhos como ele fez comigo. Nunca! Eu matei meus filhos porque não conseguiria matá-lo. E por mais que eu também te odeie prefiro ir embora com você para o inferno do que voltar para a casa dele!
Gradualmente a respiração ofegante diminuía, tudo estava exposto e de certa forma pela primeira vez em anos ela se sentiu livre de verdade. Estava exposta como nunca, porém todo o peso desapareceu de sua alma. A morte sorrindo voltou a sentar na cama.
Antes que Margoth pudesse questioná-la o guarda cambaleante, andava pelo corredor em direção a sua cela proferindo uma série de impropérios. Com o álcool agindo em seu corpo ele desengonçadamente procurava a chave da cela com um ar de malícia.
— O que ele faz aqui? — Perguntou Margoth para a morte.
— Ele veio tomar seu corpo antes que o sol desponte no horizonte.
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A Morte & A Dama (Conto/Drama/Épico/Suspense)
Mistério / Suspense------ SEM REVISÃO ------ Margoth é condenada à pena de Morte por um crime denunciado pelo irmão, o assassinato de seus filhos. Enquanto passa a última noite de sua vida, em uma pequena cela, ela recebe a visita daquela que é responsável pelo descan...