-Capitão Huxl, confirme. Capitão, reporte o que você vê. - Dizia a voz feminina que ecoava dentro do capacete do astronauta.
Ele estava, parado olhando pra frente, quase catatônico.
-Roy! - Depois de um breve silêncio a voz voltou a reverberar acordando-o de seu estado.
-Comando... Comando, o que foi filmado pela minha câmera? - Huxl disse de ainda voltando a si.
-Como assim, Capitão? Apenas rochas como todas as outras que existem por todos os lados da lua.
-Foi aqui... Eu sei...
-Capitão... - Dizia agora uma voz masculina. - Volte para o seu módulo.
-Major...
-Imediatamente!
Alguns minutos depois dirigindo seu carro lunar sucateado Huxl chega no módulo.
Era pequeno mas era o suficiente para os três astronautas trabalharem e, assim como o carro, era aparentemente feito de sucatas.
Não conversou, apenas reportou sobre suas tarefas ao Major e seguiu para sua pequena estação de trabalho, que consistia em uma espécie de cadeira e um pequeno computador num dos cantos. Começou a escrever seus relatórios e logo em seguida partiu para escrever seus pensamentos.
-Capitão. - Chamou o Major em vão, Huxl estava totalmente absorto em sua escrita. -Roy! - Disse alto fazendo-o virar em um sobresalto.
-Sim, Major? - Respondeu finalmente. Tinha o semblante assustado e aparentemente confuso.
-O que está acontecendo? Só assim agora para obter sua atenção?
-Perdão, acho que estou cansado.
Os companheiros do Capitão se entreolharam preocupados.
-Roy... - Deixe que a Doutora Kinderd o examine.
-Não acho que há necessidade, Major.
-Por favor, Doutora.
-Vamos lá, Roy. Não vou lhe machucar. - Ela disse sorrindo tentando contagia-lo com um ar mais leve.
Ele suspirou e deu de ombros enquanto era dado início a uma pequena bateria de exames.
-O que você viu que te assustou tanto?
-Doutora...
-Marion, por favor. - Ela o interrompeu - Nós três já temos intimidade o suficiente para, entre nós, nos tratarmos pelos nossos nomes e não por nossas funções.
Ambos concordaram com as cabeças.
-Títulos ou patentes não descrevem tudo que somos. Somos mais que isso.... Mas não fuja do assunto, Roy.
-Tudo bem, Major Connor... Digo... Arthan.
Marion estava na etapa final enquanto Roy relatava toda sua tarefa.
-E por último vi naquele rochedo alguma coisa... - Parou engolindo em seco - Mas aparentemente eram apenas sombras, uma simples pareidolia...
-Mas afinal de contas, o que era essa tal coisa? - Disse Arthan perdendo a paciência.
-Num primeiro olhar parecia um homem sentado, me olhando, me encarando... - Seus olhos começaram a ficar marejados.
-Um homem? Mas como assim parecia? - Marion disse confusa.
Roy rabiscou numa folha a silhueta do homem que dizia ter visto, o que chamou atenção de seus companheiros era a presença de um imponente par de chifres.
-Chifres? Em um homem na lua? - Arthan disse.
-Não era parte do traje espacial? - Marion tentava racionalizar aquele relato.
-Ele não vestia nada além de um terno do século passado...
-Um homem, com chifres e se vestindo como se estivesse no século XXII?!
As primeiras lágrimas flutuaram levemente do rosto de Roy ao chão do módulo.
-Descanse, Roy. - Disse Arthan, tentando acalma-lo.
Marion tocou uma pequena caixinha no braço de Roy e ao apertar um botão nela o agitado Capitão começou e parecer cada vez mais relaxado e dentro de segundos adentrara no profundo reino onírico, dos sonhos e... Pesadelos.
Horas mais tarde acordou, sua cabeça doía mas estava mais calmo.
-O que eu tenho, Marion?
-Todos os exames mostram que sua saúde está em ordem.
Voltaram a trabalhar e tudo foi voltando ao normal conforme as horas e dias passavam.
-Temos ainda que pesquisar algumas rochas e o material ferroso que detectamos, estão a cerca de 200 metros à leste do ponto anterior. Precisamos das amostras. - Disse Arthan.
-Será que estão aqui desde a última exploração? - Marion indagou.
-provavelmente sim, devem ser pequenas partes dos destroços. - Dizia Roy enquanto ajustava seu traje, se tremia um pouco ao saber que iria encarar mais uma vez algo próximo ao local onde havia tido a macabra visão. -Irei pegar as amostras.
Sentiu em seu ombro a mão de Arthan, o impedindo de continuar se equipando.
-Fique e continue seu serviço, eu vou.
-Eu estou bem... Não precisa se preocupar.
-Fique. - Disse Arthan, soando como um ultimato.
Algum tempo depois, após verificar se tratar realmente de materiais de alguma exploração anterior, colocava a última leva no carro. Mas antes de embarcar detectou em um dos sensores de seu traje um rápido e fraco pulso emitido perto dali.
-Major Connor, o que foi isso? - Roy perguntava do comunicador.
-Vocês também detectaram?
-Sim, foi fraco mas detectamos um pulso de calor vinda de 9 metros do senhor. - Marion esclarecia a Arthan.
-Será... Ele? - Disse Roy.
-Não seja estúpido, homem! - O Major esbravejou tentando esconder o próprio medo que surgiu de súbito.
Arthan foi de encontro ao tal pulso, encontrando por trás de algumas pedras uma pequena espécie buraco quase rente ao chão, algo como uma caverna.
-Uma caverna? - Marion dizia -Não a mapeamos ainda. Por favor, traga as amostras e depois voltamos para uma averiguação.
Arthan não respondeu e nem mesmo se moveu, apenas estava olhando para a caverna.
-Major Connor?
Ele começou a andar lentamente em direção a tal caverna.
-Arthan! - Gritou Roy -O que você vê? Sua câmera está falhando.
-O sinais vitais estão em níveis muito perigosos. Seu coração está acelerado, suas ondas cerebrais estão um caos. - Marion disse para Roy.
-Sim... É ele... Está em pé, na entrada da caverna... - A voz de Arthan chegava fraca e falhando ao módulo.
-Volte! Marion, o que a câmera dele está mostrando? Meu monitor não está em pleno funcionamento.
-Aparentemente ele caiu antes de entrar na caverna. Está vivo mas não parece estar consciente.
Roy não pensou duas vezes, se pôs pronto rapidamente ao resgate.
-Eu também vou, Roy!
-Não, preciso de você aqui.
Equipou em sua mochila uma espécie de veículo individual e em questões de minutos alcançara o corpo desmaiado de Arthan. O colocou no carro e estranhou uma queimadura no peito do traje do Major, mas não pode conferir a extensão dela pela posição em que estavam e por estar dirigindo. Nem mesmo havia olhado para a tal caverna.
-Rápido! - Roy dizia, arrastando Arthan para dentro do módulo. -Me ajude aqui.
Ao deitar o moribundo puderam finalmente ver a tal queimadura. Ela era grande, cobria do pescoço até a barriga e tinha o formato perfeito de uma mão. Como se uma mão flamejante gigante o tivesse tocado.
Se entreolharam mas se preocuparam em ajudar o companheiro.
Conforme iam tirando as partes queimadas um cheiro forte permeava o ar.
-Que cheiro estranho é esse, Marion?
-Enxofre... - Ela disse olhando nos olhos de Roy.
-Diga ao comando central que estamos saindo daqui a antes do previsto, eu vou até lá fora desconectar todas as travas para que possamos voltar para o módulo orbital principal.
Já do lado de fora ele destravava tudo que havia de ser destravado. Ao fazer um sinal de positivo viu pela pequena janela que Marion olhava para ele estática, tinha seu dedo apontado para trás dele.
-Roy... Eu o vejo... Ele...
Roy se virou, procurou, mas nada viu e ao se virar novamente escutou pelo rádio um grito interrompido enquanto via Arthan estrangular Marion. Tentou voltar para dentro do módulo mas esse havia começado com a partida para sair da lua.
Tentou sem sucesso abrir a escotilha enquanto via Marion ter seu frágil pescoço quebrado por Arthan enquanto o módulo começava a subir. Foi jogado a alguns metros dali pela potência dos motores que elevavam toda a pequena e sucateada base.
Pode observar o foguete subir e longe do seu alcance contemplou sua destruição, algo pareceu explodir dentro dele o fragmentando antes mesmo de chegar ao módulo orbital principal.
-Comando?!... Marion? Arthan?!... - Gritou Roy enquanto via os corpos dos dois junto aos restos do módulo se separar indo em todas as direções.
Não obteve resposta nem mesmo do comando central, seu rádio estava totalmente mudo.Não conseguia nem ao menos ver o módulo orbital principal, mesmo a olho nu. É como se tivesse simples e estranhamente ido embora. Mas... Como? Sem averiguar o que aconteceu? Sem tentativa de contato?
Uma torrente de pensamentos inundou sua mente. Afinal, o que havia acabado de acontecer? Será que o módulo estava lá e algo o impedia de vê-lo? Será que havia enlouquecido e nada disso se passava de uma alucinação? Ou será que, de alguma forma bizarra, era apenas a realidade fria e brutal? Quanto mais pensava menos encontrava sentido.
Foi ao chão após perceber que, independente de real ou não, por mais que tentasse não conseguia ter contato com seus companheiros do módulo principal, que por mais que tentasse a explosão ainda ecoava em sua mente, por mais que tentasse se acalmar seu oxigênio estava a minutos de acabar.
Desesperado pensou em correr dali mas logo se deu conta de que não havia para onde ir, não havia como pedir um resgate, não havia ninguém. Nesse instante nada fez, nada havia de ser feito, apenas parou.
Cada segundo uma eternidade.
Cada batida do seu coração menos uma lhe restava.
O tempo era agora, mais que nunca, apenas uma contagem regressiva.
Por um breve momento não pensou mais, pegou o carro e se dirigiu até a caverna. Ao entrar ligou as luzes de seu traje e conforme ia adentrando nela percebia que era pequena e que havia algo no seu fundo.
Andou até lá e seu coração palpitou tanto que podia senti-lo querer sair de seu peito. Viu uma figura que jurava ser de carne e osso. Era o tal homem de chifres, estava lá sentado olhando fixamente para dentro de seus olhos. Não era uma sombra, uma rocha ou uma estátua pois se mexia minimamente como se vivo estivesse.
-Onde vamos levamos consigo nossos demônios... -Começou a dizer Roy -Essa foi a última frase da última expedição à essas partes da lua... Não sabia que era de forma tão literal.
O demônio sorriu enquanto levantava e ia em direção a ele.
-Sabia que tinha sido por aqui. Não tenho mais medo! - Disse muito mais para si mesmo do que para a figura que se mostrava imponente agora entre ele e a saída.
Não conseguia mais raciocinar direito nem saber se era algo de sua cabeça ou se era uma criatura de fato.
O demônio parecia ter algo em sua grande mão o oferecendo, ao olhar direito viu que se tratava de um velho pergaminho em uma das mãos, na outra uma pena de escrita e em sua face uma largo e bizarro sorriso.
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Sombras no rochedo
De TodoVultos, sons, sensações... Como acreditar no que sentiu quando se acha que não há o que sentir?