Pelos Olhos de uma Maga

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Na manhã gelada, após ver minha irmã sair para fazer seu trabalho diário, resolvi ir à creche visitar as crianças da vila, que me receberiam com sorrisos e abraços. Conhecimento é algo que valorizo bastante, o utensílio mais básico para a formação de um ser vivo. Ao chegar, as crianças à minha volta pediam, uma por cimas das outras, para que eu demonstrasse o que havia aprendido ultimamente. Eu, com todo o carinho, demonstrei da seguinte maneira: agachando, pondo o livro no chão, abrindo-o e lendo-o. Conseguia sentir seus olhares curiosos sobre meus ombros.

Um sorriso abriu-se em meu rosto, a fome dos infantos por conhecimento era a mesma que a minha, a fome de querer saber mais sobre um mundo que, para nós, era totalmente negado pelos anciãos. Levantei-me e bati a palma contra a outra uma vez, olhando em volta as caras de ansiedade e surpresa que me observavam atentamente. " Prontos? " , perguntei, seguido de um mar de cabeças sinalizando sim. Inspirei fundo e pronunciei do melhor jeito que podia as palavras do feitiço:

" Asir, igol " , disse em voz alta, lentamente, separando minhas mãos, uma chama acendeu entre ambas as palmas e um 'uau' em uníssono ecoou pela grande sala. Com a mão esquerda  dominei a chama, mantendo-a flutuando. A chama, apesar de quente e muito perto de minha pele, não queimava. Era como a sensação agradável de estar perto de uma lareira em um dia frio, aconchegante.

" Tsefinam.", disse. Com isso, o fogo ficou mais volumoso, alongando-se de tal modo que parecesse uma cobra, voando no ar. A chama voava pela sala, passando pelas crianças, enquanto tomava a forma de um dragão. A besta voava astutamente dentre as pessoas, desviando de qualquer obstáculo sem o menor problema até voar na direção do teto e explodir transformando-se em faíscas.

Outra vez, fui abordada por um mar de crianças animadas, perguntando sobre como eu fazia tais coisas e se eu sabia outras magias, mas, antes mesmo de poder respondê-las, uma mulher magra, com feição séria e olhos mortíferos entrou no hall. " Miriel! ", exclamou ela, calando as crianças, que abriram um corredor entre nós. " O que eu já falei sobre praticar esse tipo de... de...", disse a mulher, tentando achar a palavra. " Magia...? ", completei-a, o que só acarretou em mais fúria vinda da senhora. " Você sabe muito bem que este tipo de prática é banida. Isso não é magia, é um conto de fadas que apodrece a cabeça das crianças aqui! Saia! Não quero mais saber de você praticando isso nesta vila, entendeu bem?! ", como resposta, a única coisa que pude fazer foi assentir, pois fiquei envergonhada pela lição de moral que levei da dona da creche. Me preparei para sair dali, quando uma garota ergueu meu livro para me devolver, dando um sorriso e agradecendo pela apresentação. Sorri de volta para a menina e saí do local, andando pela vila com o livro sob meu braço.

Passeava pela vila, dando oi para todos. A vila, não sendo tão grande, todos se conheciam, sabiam de suas famílias, geralmente, eram muito amigos uns dos outros.

" Olá, Miriel. Como vai? ", ouvi um dos lenhadores me chamar. " Vou bem senhor, e você? ", respondi-o ainda andando de costas, olhando para ele para que não parecesse rude. " Você e sua irmã podem passar um tempo lá em casa com minha esposa e as crianças, não acha? Parece um pouco mais... Seguro para vocês duas. ", ele disse com um tom apreensivo, dando um pequeno sorriso sem graça para mim. "Não se preocupe... Vamos ficar bem...", disse rapidamente e voltei a andar normalmente, dando um tchau apressado para o homem.

Poucos minutos depois cheguei em casa, nenhum sinal de Calime. O que era estranho, já que a menina nunca demorava tanto para achar uma boa caça. Após passar pela sala e ir para meu quarto ouvi um pisar pesado, de uma pessoa que parecia ser grande. Virei-me lentamente para ver meu pai, sentado em uma cadeira de madeira, um cantil que, pelo cheiro que infestava a casa, estava cheio de alguns litros de álcool.

" Garota... Onde está sua irmã? ", perguntou meu pai, com uma voz alterada. Ainda era de manhã e o mesmo já estava bêbado. " Foi caçar papai, deve voltar já, já. ", disse, tentando sair de sua visão o mais rápido que podia, parando de andar quando o homem se levantou, desajeitadamente, andou em minha direção. "Vocês duas odeiam esta casa não é mesmo? Não... odeiam minha presença. ", disse ele, enquanto  barricava a entrada para meu quarto com seu corpo. " Vocês me odeiam... ", disse com uma voz que emanava tristeza e remorso, era difícil de engolir. " Não, papai, nós não te odi-", falei, quando vi seus olhos passaram de melancolia para raiva, assim que tentei contradize-lo. " Não minta para mim, garota! Sei bem quais são seus sentimentos! Sei bem seu profundo ódio por mim. ", disse meu pai, com sua voz de raiva, me contrai, ficando a mais cerrada possível.

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⏰ Última atualização: Apr 20, 2020 ⏰

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