Elena e a Síndrome do Clichê Natalino

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Eu estava a ponto de procurar no Google sobre os voos disponíveis de Pickering para São Paulo, quando Sean me interrompeu, trazendo um pequeno embrulho vermelho em suas mãos .

"Feliz Natal adiantado, Lena!"

As lágrimas de insegurança se misturaram as de felicidade, e não consegui mais contê-las em meus olhos. Mais cedo do que eu gostaria, elas estavam apostando corrida em minha bochecha.

"Ah, não, Lena! É para ficar feliz, não chorar! O que houve? É só emoção do presente mesmo?"

Esse filho da mãe me conhecia tão bem, que às vezes dava até raiva.

Tentei mentir, dizendo que era choro de felicidade, mas da minha boca só saíram algumas palavras em forma de gaguejo e eu parecia cada vez mais uma criança que havia perdido a soneca da tarde e agora estava com muito sono para se manter acordada sem fazer birra.

Optei por abaixar a cabeça e começar a abrir meu pacote, enquanto segurava as fungadas com todas as forças do meu ser.

"Não, guarde o presente para mais tarde. Agora, quero que você me conte o que está acontecendo, por favor."

"Sean, eu não acho que foi a coisa certa vir até aqui. Sua família não gostou de mim, eu os ouvi comentando sobre Abigail combinar mais com você. E quero dizer, eles estão certos! Você já olhou para aquela garota? Se não olhou, por favor continue sem olhar. Não quero que você concorde com eles agora, pelo menos não até eu ir embora e..."

"Lena, devagar! Você sabe que eu ainda não entendo português tão bem assim. E como assim, ir embora? Isso é tudo que eu consegui compreender no meio desse seu discurso acelerado."

Enquanto eu enchia meu pulmão de ar para recomeçar a falar, o pai de Sean, Edward, apareceu para nos conduzir até a sala. Aparentemente, alguns familiares não passariam o dia de Natal conosco, então trocaríamos presentes nessa noite.

Mais uma coisa que eu não sabia. Se ainda estivéssemos sozinhos, eu esganaria Sean por não me avisar sobre nada disso. Odiava parecer tão despreparada assim.

Torci para que não notassem meus olhos vermelhos pelo choro e abri o maior sorriso que conseguia naquele momento. Eu já sabia o que algumas pessoas pensavam sobre nosso relacionamento, mas não queria parecer infeliz e prejudicar a festa dos Hill.

"Elena?" Ouvi uma voz me chamar baixinho enquanto estávamos em pé, reunidos próximos a lareira.  "Aqui, sou eu, Abigail."

Olhei para trás e notei Abigail acenando de maneira simpática e discreta para mim. Por mais que eu quisesse jogar um tamanco na cara dela no momento, não era culpa da garota se a família de Sean achava que eles formavam um casal mais bonito que nós dois. Então, me aproximei, me esforçando ao máximo para parecer simpática.

"Vem, vamos no banheiro comigo. Eu trouxe um pouco de maquiagem. Não sei o que aconteceu, mas tenho certeza que você não vai querer todos perguntando se está tudo bem. Quando isso acontece comigo, só tenho ainda mais vontade de chorar." A garota acrescentou, enquanto me guiava para o cômodo mais próximo.

Abigail me colocou sentada em um banquinho e tirou um pequeno arsenal de produtos de dentro da bolsa. Se essa era a noção de pouca maquiagem que ela tinha, eu não queria nem ver como eram as gavetas de sua casa.

"Não se preocupe com a troca de presentes, eles vão demorar uma eternidade reunindo todos na sala até que finalmente comece. E, além disso, não é muito uma troca de presente. A vovó Hill distribui algumas coisas como cachecol e suéter, que ela passou o ano todo fazendo, mas, mesmo com tanto tempo de antecedência, eles ainda aparentam inacabados e bregas. E ela também não tem nenhuma noção de tamanho, faz o mesmo modelo para todo mundo, o que cabe em você, provavelmente cabe em Sean também. Eu ouvi Nora escolhendo entre entregar uma peça para mim ou para Sean, para você ter uma noção de quão personalizado o suéter é."

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