Capítulo 17

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Na segunda-feira, Henrique chegou ao escritório antes das nove.

Tinha um encontro importante com um importador e precisava estudar a

proposta que ele lhe fizera.

Sua secretária colocara algumas cartas abertas sobre a mesa, incluindo

uma que, por ser pessoal, ela não abrira. Henrique apanhou o envelope

manuscrito e, não reconhecendo a letra, olhou o remetente e estremeceu:

PIERRE LEGRAND

O carimbo era de uma prisão em Lyon. Revirou a carta entre os dedos,

pensativo. A carta fora enviada de uma prisão. Pierre estaria preso? Por que

lhe escreveria?

Curioso, rasgou o envelope, apanhou a folha de papel dobrada, abriu-a

e começou a ler. À medida que lia, seu rosto foi enrubescendo e seu cenho

foi se fechando. Quando terminou, estava pálido.

Então era isso? Maria Eugênia chegara a apaixonar-se por aquele

patife? Entregara-se a ele, traindo sua confiança?

Talvez Pierre estivesse mentindo. Mas como duvidar, se ele sabia que

Maria Eugênia não estava grávida? Só podia ter descoberto isso se tivesse

mesmo tido intimidade com ela.

Henrique passou a mão trêmula nos cabelos, como para afastar

aqueles pensamentos dolorosos que o deixavam arrasado.

Maria Eugênia mudara muito depois do nascimento de Dionísio. Mas

essa história escabrosa ocorrera antes, quando ela se mostrara insensível,

fútil, revoltada.


Algumas lágrimas corriam pelo rosto de Henrique, e ele não se

importava em enxugá-las. Ele fora um marido fiel. Aceitara relacionar-se

com Marina para ajudar Adele e também, por que não dizer, pela

possibilidade de poder ser pai, o que de outra forma seria impossível.

Maria Eugênia teria feito isso para vingar-se dele? Quando em Paris,

ela deixara transparecer sua revolta por ele haver aceitado a proposta de

Adele. Mas Pierre dizia que ela estava apaixonada; que, quando ele estivera

no Brasil tentando reconquistá-la, ela só não foi com ele para não deixar

Dionísio.

Henrique reconhecia que ela, de fato, apegara-se muito ao menino.

Essa justificativa era perfeitamente provável. Nesse caso, ela não o amava

mais. Preferia o amor daquele patife desclassificado ao dele, que sempre

fora um marido dedicado e honesto.

Pierre estava preso, dizendo-se inocente, mas Henrique não acreditava

nisso. Além do mais, ameaçava-o, pretendendo contar essa história infeliz

aos jornais de Paris, cidade onde eles tinham uma filial da empresa, eram

conhecidos e respeitados.

Uma raiva surda tomou conta de Henrique. Se naquele momento

Pierre aparecesse em sua frente, certamente não responderia pela sua vida.

NADA É POR ACASO  - ZÍBIA GASPARETTOOnde histórias criam vida. Descubra agora