Dei uma cambaleada para trás. Eu não podia ter escutado direito. Um zumbido forte ecoou em meus ouvidos, e fiquei tonta e sem rumo. Descobri que tinha um amante, e agora estava sabendo que meu amante poderia ser bem mais que um simples caso.
-Agatha? – Renata chamava aflita do outro lado da linha. – Você ainda está aí.
Respirei fundo e procurei minha voz para dizer – Estou! Estou aqui sim, Renata. Olha, eu perdi minha memória, eu não consigo assimilar tudo que está acontecendo. Acredito que esse não é o momento e nem a maneira de conversarmos.
-Eu sei amiga, mas senti sua falta de verdade. –sua voz tinha pesar. – Não quero que suma de novo. Me desesperei tanto desde o seu acidente e os meses que se seguiram e você em coma...
-Eu sinto muito, de verdade. Vamos fazer o seguinte. Vou anotar seu telefone e aí marcamos algo, você me conta tudo que sabe de mim e esqueci. – Ela passou rapidamente o seu telefone e anotei em um bloquinho que estava ali na sala. – Ótimo! Anotado. Rodrigo daqui dois dias tem um ensaio para uma campanha, gostaria de te encontrar sem que ele soubesse, ele é meio protetor.
-Eu super apoio você não está presente com ele. Se cuida amiga e qualquer coisa, qualquer coisa mesmo que precisar, me liga. Beijos.
-Beijos!
Quanto mais eu achava que minha vida não poderia estar mais complicada, mais eu me enganava. Coloquei o celular sobre a mesa e voltei para o quarto, encontrando um Rodrigo de olhos abertos e relaxado.
- Acordei e você não estava aqui do meu lado. – Lançou aquele sorriso bobo para mim que era capaz de me transformar na boba. –Deita aqui amor.
Eu fui em passos lentos. Ainda com os pensamentos em tudo que a Renata havia me revelado. Eu não podia acreditar na versão da outra Agatha que parecia outro eu, em outro universo. Não sou especialista em neurologia, tão pouco tinha pretensão, ou me aprofundado em temas relacionados a isso, claro pelo pouco que me conhecia, mas sabia que o cérebro funcionava em divisões de áreas, que certas partes comandavam determinadas funções em nosso organismo. Sendo assim, eu acreditava, que a parte afetada da minha memória não afetaria a parte responsável pelo meu caráter.
Eu sabia que faltava peças que não se encaixavam nessa minha louca história de vida. Principalmente na parte do Rodrigo e eu. E eu iria até o fim para descobrir. Mas por hora me permitir somente aproveitar a companhia do meu marido, o resto eu lidaria depois.
[...]
E como assim programado, Rodrigo teve um compromisso logo cedo dentre dois dias da ligação de Renata. Sabia que demoraria quando tinha esse tipo de trabalho. Ele estava receoso em deixar-me naquela manhã, parecia que sabia que eu iria "aprontar", ou talvez estivesse acostumado a lidar com novidades ou surpresas sempre que me deixava algum tempo sozinha, ele conhecia meu gênio, a esposa que ele tinha.
Doía-me fazer certos atos sem informa-lhe, parecia que de certa forma eu estava revivendo o meu outro eu, antes de desmemoriar. Contudo eu sabia que era preciso, eu tinha que chegar ao fundo, para seguir minha vida em paz.
Pegando um táxi, parei em frente a um prédio, numa rua pouco movimentada. Uma moça morena de óculos escuros estava recostada em seu carro vermelho reluzente, e deduzi ser minha nova aquisição de amiga do último ano. Assim que desci do automóvel a figura elegante veio me cumprimentar. Ela era bem bonita, suas roupas eram sexy, muito sofisticadas e nada vulgares. Senti-me até uma menininha usando jeans, camiseta e tênis.
-Agatha! Amiga não sabe quanta falta eu senti de você. – me deu um longo e forte abraço. – Eu soube de sua perda de memória. Faz tempo que queria me comunicar com você.
-Oi, tudo bem? Renata, eu queria muito te dizer as mesmas coisas, mas como sabe eu não me lembro de você. – Fui sincera, até porque minha cara deveria explicar muito que eu não estava confortável com a situação.
-Percebo que não lembra de mim, um ponto importante. – Ela parece ter soltado isso sem querer. E algo me soou bem estranho nessa frase. Parecia que ela tinha algum contato direto comigo. – Mas vamos entrar! – Desconversou.
-Que lugar é esse? Seu apartamento? – Perguntei curiosa.
-Não bobinha, esse é seu apartamento. Você mantinha ele, era seu refúgio. – Ela disse com um sorriso.
Eu subi calada, tentando absorver isso. Eu tinha outra casa. Um lugar só meu. Então realmente as coisas com o Rodrigo eram game over. Não sei o motivo, mas bateu uma tristeza em mim pensar assim.
Entramos no apartamento que ficava no segundo andar de um prédio de seis pavimentos. Era bem claro, as paredes brancas, e pude perceber nele traços de decoração que tinha na minha casa com o meu marido. Aquele lugar não poderia ser mais eu.
-Ele é lindo! Porque me trouxe aqui? Era aqui que me encontrava com meu amante?
-Agatha... Me desculpe. Aquele lance do amante, vamos dizer que eu menti. Seu lance com outros não era uma coisa séria. – Como assim outroS e como assim ela mentiu?
- Você...Você MENTIU?
- Eu realmente sinto muito, eu precisava que você viesse ao meu encontro. E só com uma notícia assim você toparia isso sem comentar com o Rodrigo. Ele não pode saber e nem sonhar que estamos juntas, que sei tudo isso de você. –Ela parecia aflita para que eu acreditasse nela.
- Minha vida é um monte de mentiras desde que acordei. Eu quero verdades, mas parece que ninguém quer me dá isso. Será que você é realmente minha amiga?
- Agatha! Não duvide disso. Como eu teria a chave desse apartamento se não fosse sua amiga? Eu quero te ajudar a saber das coisas, mas tem que ser assim, você não pode comentar nada com ninguém sobre mim. Vamos, quero te mostrar uma coisa.
Por hora resolvi seguir ela. Era minha única opção. E me parecia a primeira pessoa sinceramente a querer me ajudar no meu passado.
Entramos em um quarto que supôs ser meu. Estava arrumado, tinha o cheiro do meu perfume. Renata foi até o armário guarda-roupas e trouxe um baú, me entregou e disse pra eu olhar. Que me esperava lá fora.
Assim que fiquei sozinha, tive coragem de olhar o que tinha dentro. Era roupinhas de criança. Fotos de minha gravidez. Minha com o Rodrigo, com minha família, brinquedos, ultrassom. E não pude deixar de evitar que as lágrimas rolassem sobre meus olhos.
Fiquei vários minutos observando tudo, até encontrar uma foto que me causou surpresa. Era a Renata redondamente grávida, com a Ana e o Rodrigo de cada lado dela.
Eles se conheciam...