Eu tinha chorado a noite inteira. Estava confusa, triste e algo faltava em mim. Rodrigo tentara me explicar, pediu para me acalmar. Mas não conseguia me concentrar em nada. Fiquei agarrada a ele, recebendo muito carinho. Mas sou humana e logo no começo da manhã eu adormeci. Mas ao invés de calmaria eu me encontrei em tormenta devido a um sonho um tanto quanto real.
Eu estava em uma cama de hospital, toda machucada e enfaixada. Olhava para a janela com um olhar perdido. Nesse momento o meu marido entra no quarto. Não tinha nenhum hematoma, mas a sua expressão demostrava dor.
-Agatha? – Rodrigo me chamou.
Eu virei para ele, dei um meio sorriso.
-Você está bem? – Perguntou-me preocupado. – Sinto muito pelo nosso bebê, amor. Eu...- Não conseguiu terminar de falar e se debulhou em lágrimas. Eu me limitei a sorrir.
- Foi bom sabe? – Ele me olhou sem entender. – Eu perder essa criança. Melhor para eu concentrar na minha carreira e você na sua, não é? Esse lance de ficar em casa cuidando de filho não é comigo. Acho até que esse acidente foi um presente.
-Agatha não fala assim – Rodrigo me pedia
-Por que? Estou mentindo? – eu sorri novamente. – Está tudo certo Rodrigo. O bebê já está morto.
Acordei assustada e percebi que estava sozinha na cama. O sonho foi tão real. Mas foi tão cruel o modo como eu falei. Eu só esperava que fosse apenas um pesadelo, e não parte de uma memória minha. Eu não podia ser esse monstro que pouco se importava com a morte do filho.
Eu não conseguiria voltar a dormir de qualquer maneira, então resolvi ir em busca do meu marido. O encontrei na cozinha, preparava uma bandeja de comidas. Acho que iria fazer uma surpresa para mim. Ele estava de costas e sem camisa, o que era de praxe, cantarolava uma música qualquer e involuntariamente os músculos da minha face se repuxaram em um sorriso, ainda que triste.
Mas devo ter feito algum barulho, pois ele se virou. Foi em minha direção, beijando-me até tirar o folego, para logo depois encostar sua testa na minha.
- Você dormiu quase nada. Estava preparando um lanchinho para gente. – Disse enquanto arrumava uma mexa do meu cabelo
-Eu...eu acho que me lembrei de algo. Sonhei com algo. – Os olhos do Rod se iluminaram. Acho que não ficaria tão feliz se soubesse o que.
-Vem aqui, vamos sentar. – Me puxou para duas banquetas que ficavam na cozinha e sentou-se de frente para mim. – Me conta meu amor. Eu estava nessa sua lembrança?
-Estava...Mas não sei se foi uma lembrança ou se foi um sonho.- comecei devagar.
-Agatha me conte que eu te respondo. – Hesitei um pouco. – Vamos, meu amor, pode me contar.
- E se você mentir? Eu realmente prefiro perguntar para outra pessoa, quem sabe sua mãe...
-Ora Agatha, eu omiti coisas de você. Não vou mentir. Eu prometo. Agora me conte. – Bingo, ele tinha dito o que eu precisava ouvir.
-Eu sonhei conosco – ele sorriu – No hospital, logo após eu descobri que perdi o bebê.- Seu sorriso se foi e sua expressão começou a ficar séria. – Rodrigo, eu dizia coisas horríveis, falava que foi um presente, que foi bom eu perder o nosso filho...isso é verdade?
Olhei bem para os seus olhos. Ele desviou e não me respondeu. Levantou-se e passou as mãos pelo cabelo. Eu não precisava de mais nada. Aquilo já me confirmava. E eu chorei. Eu não queria ser a pessoa que eu fui. Eu pensei que tivesse em uma fase ruim, após perder minha criança. Mas eu nem sequer a quis.
Rodrigo ao perceber meu estado veio me abraçar.
-Não fica assim, as coisas são complicadas. Você tinha acabado de perder um filho, estava abalada.
-Para. Por favor para. Você sempre justifica meus erros. Mas e eu ter amantes? As saídas e bebedeiras? Por que eu fazia isso? - Eu perguntei em meio as lágrimas – E você? Sempre do meu lado, não desistia de mim. Eu te magoei muito não foi?
-Não pensa nisso agora. Você está se forçando muito com o passado desde ontem.
-Mas...- ele colocou o dedo indicador sobre os meus lábios.
- Nada de mas, hoje tirei o dia para ficar com você. – Eu continuava com o semblante triste. – Agatha, olha para mim. – Puxou meu queixo levemente para que eu o encarasse – Você é uma mulher incrível, parece estranho você ver agora o passado, mas eu te garanto, o quanto você é uma mulher especial, maravilhosa. Quando...quando recuperar a memória vai se lembrar disso.
- Tenho medo do que vou lembrar... – Falei o abraçando.
- Xiiii...não vamos mais falar disso. – Comecei a protestar. – Pelo menos hoje? Hum? Vamos curtir um pouco? Fiz uma bandeja tão linda de comida para gente aproveitar na cama. Podemos assistir um filme, jogar vídeo game. Seu marido também está com o corpinho aqui para você abusar. – Soltei um riso. E ele parou sério me olhando. – Te amo.
E assim me beijou, aquecendo meu corpo e coração todinhos.
[...]
A gente passou o dia na cama, comendo, assistindo TV, nos amando. Rodrigo era tão carinhoso, e cheio de energia. Eu realmente estava me apaixonando. E era muito estranho pensar que ele era meu amigo. Eu tinha que perguntar para ele como surgiu esse interesse, era surreal pensar na gente tão íntimos assim.
Eu observava o homenzarrão dormindo ao meu lado, parecia uma criança. Fiquei pensando em um bebê assim igual ele, seria perfeito. Mas tão logo divaguei ouvi um barulho ao fundo, um toque. Fui a procura de onde vinha e notei que era da Bermuda do Rodrigo largada no chão do quarto.
Um celular. Sai do ambiente e fui para sala e meio sem jeito atendi.
- Alô?
- Agatha!? – falou uma voz feminina. – Graças a Deus é você. Não sabe o quão desesperada estou. Tive que radicalizar e ligar para o Rodrigo.
-Desculpe-me, mas quem fala?
- Ah! O lance da falta de memória é real né? Não lembra de mim? Bom... Sou uma amiga que você conheceu nesse último ano. Meu nome é Renata.
- Nossa, me desculpa. Eu realmente estou adaptando, tudo é tão novo para mim.
-Tudo bem querida. Onde você está? Na casa da sua mãe?
- Ah não... Estou na minha casa mesmo.
- Que casa Agatha? – Ela disse dando uma risada.
- Minha casa com o Rodrigo.
-Meu Deus! O que ele fez? Está te tratando bem? – Perguntou aflita.
- Rodrigo é maravilhoso – não pude deixar de sorrir. – Renata? Esse seu nome né? Não precisa se preocupar, estou bem.
- Bem? Agatha, você estava se separando...
-Eu sei é que as coisas mudaram um pouco pelo acidente...
- E o seu amante? O que vai dizer para ele? Deve estar te esperando.
-Como assim? – perguntei tremula.
- Rodrigo não te contou né? – deu uma risada sarcástica – Você estava se separando, indo viajar com seu amante. Já tinha as passagens compradas e tudo. Acho que o seu marido esqueceu de te contar isso.
O que estava acontecendo com a minha vida?