Capítulo 2

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Na manhã do outro dia o sonho veio quase como uma "visão" que eu costumava ter.

Foi bastante real, mas não azulado e não me pareceu uma mensagem. Era apenas um sonho com a minha irmã, estávamos em outra época, eu com 10 anos e ela com 6. Estávamos brincando no jardim da casa da minha avó, onde crescemos. Pegávamos insetos e estudávamos suas anatomias, encantadas. O sol estava forte, mas foi tapado de repente por uma sombra muito conhecida: minha avó. Congelei na hora, levantei lentamente os olhos para ela e notei que haviam mais pessoas nos observando. Laura segurou com força a minha mão, mas eles conseguiram me levar para os fundos do terreno, perto do bosque. Eu, resignada com o meu destino, apenas me deixei ser arrastada. Mas Laura não aceitava, ela gritava e chorava, tentando me puxar de volta. Acordei no momento que comecei a sentir minha pele ceder como se eu fosse uma corda podre em uma brincadeira de cabo de guerra.

Já fora do sonho, na minha cama, eu suo frio e Atena me olha preocupada. É óbvio que o sonho não tinha sido manifestação do meu "dom", eu não sinto resquícios desde que deixei minha reabilitação de lado. Não foi exatamente uma lembrança, mas parte sim. Realmente minha avó me chamava quando seus convidados chegavam em casa. E Laura não costumava participar, porque nela os dons nunca se manifestaram de maneira significativa. Não são coisas que eu gostaria de lembrar ou sonhar, por isso levanto, bebo um gole de algo forte e amargo e tomo um banho frio, tentando tirar a sensação pegajosa que um sonho muito real deixa em seu cérebro.

Mas ver o rosto de Laura choroso e desesperado não sai da minha mente nem quando abro a livraria. Dei bom dia para Cristine no automático e fiquei parte da manhã lembrado da minha infância com Laura. Como eu sentia que deveria a proteger por ela ser mais nova, mas na verdade quem sempre precisou de proteção fui eu.

O telefone toca e novamente é a vizinha dizendo que ainda tem alguém na casa e parece que é uma moça loira. Então as coisas se encaixam. Ligo no celular de Laura e ela não me atende.

-Cristine. - Chamo-a nos fundos da livraria. - Você se sente à vontade para ficar sozinha aqui? Preciso resolver uma coisa fora. Posso fechar se preferir.

-Eu estou aqui a quase 6 meses Luna. Sei me virar.

Agradeço, pego as chaves do meu carro e saio da livraria. Eu não deveria dirigir, mas prefiro que seja eu, para que eu posso ir bem lentamente para a casa da minha avó.

***

A casa da minha avó, fica a pouco mais de 1 hora da livraria, então tenho bastante tempo para pensar.

É uma casinha pequena de quatro cômodos, uma espécie de chácara no interior com uma edícula no fundo onde minha avó costumava receber suas amigas e clientes. Era onde ela me arrastava para que eu mostrasse os meus dons, recebendo espíritos no meu corpo, prevendo o futuro e tendo visões no geral. Muitos chegavam céticos e saiam impressionados quando eu contava coisas específicas de suas vidas. Outros saíam apavorados.

As amigas da minha avó, eu fui descobrir depois, que eram parte de um coven de bruxas. Nada absurdo, grande parte delas eram como curandeiras que entendiam de cristais, ervas e limpeza espiritual. Até elas ficavam impressionadas com as manifestações dos meus dons. Eu gostava de impressioná-las no começo, não sentia tanto medo, e elas sempre foram legais comigo.

Mas minha avó e mais cinco amigas, começaram a se envolver com coisas mais ocultas. Comecei a participar de rituais assustadores, com sacrifício de animais e adoração a um demônio. Ou uma bruxa... Nunca entendi muito bem o que era aquilo. Foram nesses rituais que meus dons começaram a ficar mais fortes e incontroláveis. Em um deles eu manifestei força sobre humana e em outro consegui mover uma das amigas da minha avó com a força da mente. Tudo mentalizando o seu sangue e como que eu queria que ele sumisse de seu corpo, escapasse dos seus olhos e nariz. Ela não sofreu grandes danos, na verdade as três ficaram bem impressionadas.

Dom de Fogo e SangueOnde histórias criam vida. Descubra agora