Eu e Você.

míseravelândia.

MÚSICA DO CAPÍTULO — Sonic Youth - Teenage Riot. 

Encostadas no balcão do Tricks, eu e Georgie observávamos os carros que passavam pela estrada. Desde que eu havia começado a trabalhar lá, nós fazíamos isso, sonhando pelo dia que iriamos pegar aquela mesma estrada e nunca mais voltar para a míseravelândia. 

— Com tantos lugares no mundo, por que alguém viria justo para cá?

Perguntei vendo um grupo de idosos adentrar a porta da lanchonete, eles se encaminharam para a última mesa. Caminhando lentamente.

— Bom, pelo menos eles estão de passagem, pior é quem vem e simplesmente fica. — Georgie completou.

Revirei os olhos pensando no meu novo vizinho que era um idiota e que acabara por ver o meu sutiã esportivo no nosso segundo contato visual.

— Por falar em ficar, o garoto novo que você falou, ele é meu vizinho. — resmunguei pegando o cardápio plastificado atrás de mim.

Georgie soltou um grito animado cujo ignorei. O menu do Tricks era básico, ovos com bacon, x-salada, cachorro quente, café — que ninguém nunca pedia porque era horrível. — um pedaço de bolo decentemente bom — milkshake de chocolate feito pela Maggie que era o auge da cidade e batatas fritas salgadas demais. Entreguei na mesa dos senhores que sorriram de forma simpática.

— Podem me chamar quando quiserem pedir. — um senhor assentiu com a cabeça.

Novamente, a campainha tocou e eu dali, caminharam as duas piores pessoas da cidade. Laurie Henderson e Jake McCall. Eles eram o tipo de pessoas que o mundo começava e terminava ali, naquelas pequenas terras sem muito que florescer. Eles se sentaram um pouco depois da porta e Georgie gesticulou com a boca um "pegue-gorjeta-deles". 

Respirei fundo, e me aproximei calmamente. Eles são clientes, os clientes estão sempre certos, pensei comigo.

— Boa tarde, o que vocês gostariam? — perguntei olhando para Laurie que sorriu maliciosa.

— Adorei o cabelo. — ela disse irônica. — É bem alternativo.

— Alternativo de que? — perguntei no mesmo tom. Ela me ignorou e voltou a olhar o cardápio, enquanto isso, Jake se virou para mim com o seu meio cérebro de amendoim.

— Eu quero aquele lanche gigante que você ganha um prêmio no final. — ele disse com sua voz abobalhada.

O Tricks era "famoso" pelos seus desafios. Toda semana um lanche era dobrado de tamanho e quem vencesse, ganhava mais um sem pagar nenhum dois dois. Era o festival do colesterol.

— Okay. — anotei e me virei, havia sobrevivido.

Caminhei até Georgie que me olhava curiosa.

— Não acredito que você já dividiu a cama com aquele garoto. 

— Você faz soar tão erótico, nós tínhamos doze anos e era a única cama que restava.

Jake McCall e eu tivemos um pequeno incidente em uma festa do pijama na casa de um garoto que a muito tempo já havia zarpado para longe de Lexiton. Nós tívemos que dormir na mesma cama, que acabou por ser a coisa mais tramática de toda a minha vida já que aquele dia a mãe do aniversariante havia decidido fazer uma noite mexicana. Você consegue imaginar dormir com alguém que emitia gases com cheiro de jalapeño e chilli? Mas naquela época, Jake era mais legal. Ele tinha dez quilos a mais e meia duzia de espinhas na cara.

Um barulho alto de motor e música surgiu da estrada e parou em frente a lanchonete. O carro era conhecido, Danny Zuko de 5º categoria. Todos da lanchonete pararam para observa-lo. Não estava sozinho, um garoto e duas garotas saíram do carro. Eles eram completamente diferentes de todo mundo. Uma das garotas tinha mexas rosas e dois coques em cima da sua cabeça, com palitos espetados. Usava uma blusa do Sonic Youth e meias arrastão. A outra, era um pouco mais alta, camiseta listrada, uma calça que mostrava quase o seu útero e um par de all stars vermelhos. Logo atrás, veio um dos garotos, seu cabelo brilhava tanto e eu acreditava que era de sujeira, ele era ruivo, usava camiseta três números maior que o seu corpo, calça de moletom e tenis preto. Por último, veio ele, de suéter preto e branco, uma calça preta não muito justa e dessa vez, seu cabelo estava jogado para o lado a lá Van McCann.