Continuei encarando a serva, quase desejando vê-la se desfazer em lágrimas diante do meu olhar cortante. Era óbvio que, se eu não me detivesse, ela teria um colapso mental em poucos segundos. Bufei mais uma vez, impaciente por uma justificativa. Não era a primeira vez que alertava Marlle ou Jennete sobre não ousarem entrar nos meus aposentos sem permissão, e parecia que não seria a última. Estava prestes a explodir em mais um acesso de fúria quando ouvi uma batida na porta, interrompendo meu ímpeto. Céus, meu dia estava péssimo, uma sucessão de eventos detestáveis do começo ao fim. Lancei um olhar de desdém para a serva e apontei despreocupadamente para a porta, indicando que a abrisse, enquanto me acomodava em uma poltrona.
— Jovem senhorita, seu pai está solicitando sua presença. — Linna entrou no quarto com uma expressão de leve espanto ao perceber quem havia aberto a porta, baixando a cabeça em respeito.
— Meu quarto estava imundo esta tarde, infestado de moscas. — Franzi o rosto, desviando meu olhar entre Linna e a serva, cujo nome ela sequer se dignava a saber. — Resolva isso, e saibam que, se acontecer novamente, ensinarei pessoalmente como me livro de pragas indesejadas.
— P-Peço desculpas, senhorita, não irá acontecer novamente! Peça desculpas, Briar!
— Sinto muito, senhorita! Garanto que não vai se repetir, tenha minha palavra de honra! — Briar proferiu em um fôlego só, claramente nervosa, mas não me importei. Levantei-me da poltrona e me dirigiu à porta. — N- Não me demita, por favor, sou a única que trabalha em minha casa!
— Pessoas como você não têm honra suficiente para oferecer suas palavras de juramento... E mesmo que eu decidisse demiti-la, seu discurso melodramático não me impediria. — Coloquei a mão na maçaneta, lançando um último olhar de desprezo para ambas. — Linna, retire-a de meus aposentos e saia junto. Espero não encontrar nenhum vestígio da presença de vocês quando voltar.
Enquanto caminhava pelo corredor sombrio em direção ao escritório de meu pai, a atmosfera opressiva da casa parecia pesar ainda mais sobre meus ombros. Cada passo era como um mergulho mais profundo em um mar de lembranças dolorosas que eu preferiria esquecer. A batida na porta e a interrupção de meu momento de fúria com a serva foram um alívio momentâneo, mas eu sabia que enfrentaria desafios ainda maiores adiante.
Ao chegar engoli em seco, sentindo um frio percorrer minha espinha. Desviei o olhar do maior retrato na parede, uma pintura imponente que sempre parecia seguir meus passos com olhos acusadores. A sensação de ser observada era sufocante, como se os próprios corredores sussurrassem as lembranças que eu desesperadamente tentava enterrar. Aquele corredor era um cemitério de memórias que evitava a todo custo. Toda a casa, exceto o quarto para o qual me mudei aos quatorze anos, exalava essa opressão constante. Os corredores vazios, a cozinha sem o caos alegre da farinha espalhada, a sala desprovida de risadas, e o jardim, agora um campo estéril, não havia mais qualquer vestígio da alegria que um dia habitara o ducado.
Diante da porta com uma maçaneta de ouro brilhante, parei por um momento, tentando acalmar o turbilhão em meu peito. Respirei fundo e girei a maçaneta, a porta se abrindo com um ranger irritante que parecia zombar da minha tentativa de manter a compostura.
Entrei com o rosto franzido, meus olhos imediatamente encontrando os de Papai. Ele me olhou com um interesse frio, quase clínico. Nossa relação de pai e filha havia se deteriorado ao longo dos anos, uma lenta corrosão que nos deixou em um estado de coexistência forçada. Eu não podia afirmar que tínhamos a pior relação, mas certamente não era boa. Vivíamos uma dinâmica estranha de "Você é tudo que posso chamar de família agora, mesmo que tenha sido um incompetente em todos os outros anos da minha vida." Pelo menos era isso que eu pensava. E ele? Bom, ele nunca fez questão de me dizer o que pensava, nunca fez questão de ficar, mesmo que estivesse fisicamente presente.
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Espalhando flores pela cidade
RomanceDariela, uma herdeira de uma família ducal proeminente em Aren, aparentemente está lutando contra os traumas de seu passado. Em um mundo de casamentos arranjados e rigidez nobre, ela parece ser apenas mais uma jovem aprisionada pelas expectativas fa...