Capítulo Único

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Angustiada Maria, depressa passou montada em sua bicicleta, como sempre atrasada, mas muito bem arrumada.
Com seu sorriso encantador no rosto, espalhando alegria por onde ia.
Ela sempre foi assim, feliz, nada parecia lhe abalar.

Morava sozinha em seu minúsculo apartamento, trabalhava durante o dia numa pequena cafeteria local e a noite fazia bicos como arrumadeira em hotéis.
Mas apesar de ter um semblante de cansada ela se mantia forte, se mantia intacta com seu sorriso sincero.

Mas talvez não fosse tão sincero assim.

Depois de mais um longo dia exaustivo de trabalho, se jogou no sofá de seu humilde aconchego. Ligou a TV alta o suficiente para ninguém lhe escutar e então se pôs a chorar.

Doce Maria, tão sorridente mas escondia atrás daqueles sorrisos toda a sua dor.

Por fora contente, mas do lado de dentro um completo escuro, misto de angústia com decepção.

Chorou como se estivesse de luto, e talvez realmente estivesse. De luto por si, de luto por sua esperança que a tempos não tinha mais, de luto por ter desistido de tentar, de luto por ter se deixado acostumar com uma vida tão medíocre, tão corriqueira, de luto por sua alma, de luto por seu coração que já havia parado de dançar fazia anos. Seu coração já não batia mais como antes, ele apenas fazia o necessário que era mantê-la viva, mas ele não tinha mais aquela alegria, aquela vontade de viver, de experimentar coisas novas, de sonhar, de se apaixonar, de se permitir sentir.

Era como se o seu coração estivesse em coma, respirando pelos aparelhos, não sentia nada além de dor e não fazia nada além de continuar batendo.

Triste e solitária Maria, lutou pra continuar viva, mas infelizmente foi morrendo aos poucos, morrendo por dentro, deixando de sentir.

Até que um dia suas lágrimas cessaram.
Ela voltou a viver?
Não, ela apenas morreu de vez.
Deixando de sentir quaisquer sentimentos possíveis.
Era como um robô, programado pra sorrir ao sair pela porta de sua casa.
Era de extrema importância para si não deixar que ninguém percebesse que já havia morrido.

Um completo cadáver ambulante.

O pior não era ter morrido, o pior de tudo isso era que não sentia mais a vontade de mudar, não ligava mais se iria sair desse estado ou se ficaria assim para sempre. Não se importava porque não sentia.

Forte Maria, pena que só era forte ao ver do povo.
Dentro de seu apartamento se transformava em quem era de verdade de novo.

Pobre Maria, precisava voltar a ser quem um dia foi.
Aquela menina inocente que amava a vida, que sonhava em ser uma grande escritora, que imaginava um dia viajar o mundo todo e conhecer novas pessoas, a menina que sentiu borboletas em seu estômago em seu primeiro beijo, a garota que acreditou que venceria na vida, que seria uma pessoa brilhante, que iria longe. A menina que imaginou sua casa cor de rosa, com a grama muito bem aparada, com seu cercadinho de madeira e lindas rosas plantadas.

Ah, Maria, quando foi que deixou de acreditar que tudo era possível?
Quando foi que decidiu realmente deixar pra lá e que não valia a pena tentar?

Talvez tenha sido a três anos atrás quando uma editora rejeitou seu livro e por isso decidiu não escrever mais, mal sabia que se continuasse tentando iria conseguir, era só questão de insistir.
Ou talvez tenha sido quando viu seu primeiro amor trocá-la por outra, mal sabia que aquele era apenas o primeiro e que um dia iria encontrar alguém que a amasse de verdade e que só tivesse olhos apenas para ela, mas infelizmente desistiu e se fechou para o amor, não deixou que mais ninguém se aproximasse e então lá se foi o que seria o amor da sua vida pela porta da cafeteria com um "não, não quero tomar um café com você".
Vai ver foi quando não conseguiu arranjar um emprego que lhe pagasse bem e acabou se contentando com o famoso "qualquer coisa", consequentemente não tendo como ter a tua tão sonhada casa e muito menos suas viagens.

Deveria ter insistido um pouco mais Querida Maria, deveria ter acredito mais em si mesma, deveria ter tido um pouco mais de fé e esperança.
Uma hora iria conseguir, subiria de pouco em pouco os degraus do sucesso, mas paraste no primeiro degrau quando recebeste um "não".
Acreditastes nas palavras daqueles que diziam que não irias conseguir. Mal sabia que tudo isso era apenas inveja do sucesso que poderia alcançar se prosseguisse.

Por que, Maria?
Por que desististe tão facilmente?

Terias um futuro brilhante pela frente.
Mas deixou as dificuldades te atrapalharem.

Se tivesse tentando um pouco mais, não seria hoje este robô, antes sonhadora, mas agora sem esperanças... Maria.

Prisioneira de si mesma.
Sem poder voar.

Prisioneira De MimOnde histórias criam vida. Descubra agora